O GLOBO - 02/03
Programa em curso, elaborado nos anos 90, ainda tem resultados débeis. Meta de recuperação para 2016 precisa conter a dinâmica que alimenta a degradação
A despoluição da Baía de Guanabara não é tema recente na agenda do poder público fluminense. Sua degradação, que remonta a décadas, tem razões bem conhecidas. É fruto de uma conjunção de fatores naturais (por exemplo, rios que carreiam para a água do mar toda sorte de detritos recolhidos em seus leitos), degradação ambiental (esgoto despejado in natura a partir de municípios por ele banhados, imensas quantidades de lixo que ali se acumulam), leniência dos órgãos responsáveis e falta de educação da população. Mas, se a demanda é antiga, projetos efetivos para recuperar seu espelho d’água são ações mais recentes — e, ao menos até onde a vista alcança, sem resultados estimulantes.
Elaborado no início dos anos 90, ainda não logrou alcançar suas metas o programa de Despoluição da Baía de Guanabara (PDBG), a mais abrangente — e ainda em curso — tentativa de enfrentar essa demanda, através de um pool de órgãos públicos de distintas instâncias da administração. Os avanços obtidos em ações de controle dos altos índices de poluição são tímidos se confrontados com, primeiro, as renitentes imagens de bolsões de lixo e, segundo, com o que nelas já foi injetado em recursos públicos, algo em torno de R$ 1,7 bilhão até maio do ano passado, segundo balanço da Cedae. Muito dinheiro para resultados débeis diante da dimensão do problema.
À parte as seguidas iniciativas de despoluição que, ao longo dos últimos vinte anos, naufragaram ou se revelaram inconsistentes, um problema que se reflete no dia a dia dos municípios margeantes, a sujeira da Baía tornou-se também um engasgo para os Jogos Olímpicos de 2016. O cartão postal, onde serão realizadas as competições de vela, precisa alcançar um índice de pelo menos 80% de despoluição nos próximos dois anos. Porém, a julgar pelas imagens mais comuns do espelho d’água, é meta difícil de alcançar. Em áreas da orla de municípios da Baixada Fluminense, e mesmo da Zona Norte do Rio, o nível de poluição e assoreamento é crítico. Mesmo na orla da Zona Sul, onde os cuidados supostamente são maiores, as evidências de contaminação estão à mostra, como mostrou reportagem do GLOBO de domingo retrasado: na amurada da Urca, por exemplo, saídas de esgotos desembocam diretamente no mar. Juntam-se, portanto, um programa que em vinte anos andou vagarosamente — senão para acabar com o problema da poluição, ao menos reduzi-la a níveis palatáveis — e uma meta pontual, com vistas a um compromisso do Rio com um evento internacional. Deveria ser uma estimulante confluência de intenções, mas, diante do quadro ainda crítico, a prudência recomenda que, tanto os órgãos envolvidos no programa de despoluição, quanto a sociedade, em seu papel de fiscalizar e cobrar, não abaixem a guarda. Primeiro, porque a Baía precisa ser salva. Segundo, para evitar que o Rio passe pela humilhação de promover, com os Jogos, a exibição de cenas humilhantes de descaso com seu cartão postal.
Nenhum comentário:
Postar um comentário