O GLOBO - 01/01/14
No país onde se dizia que ricos e poderosos não iam para a cadeia houve a prisão de importantes políticos, empresários e banqueiros condenados por corrupção
Num ano como o de 2013, em que se repetiram tantas coisas ruins, mazelas crônicas como as propinas no serviço público, houve pelo menos um consenso em relação a dois personagens extraordinários: um saindo de cena, Nelson Mandela, e o outro chegando, o Papa Francisco. O primeiro, que teve vida exemplar, foi original até ao partir. Sua morte provocou uma comoção planetária que se manifestou não tanto por choros e velas, mas por meio de uma impressionante celebração. Acho que nunca se dançou e cantou tanto durante um velório. Mais do que uma triste cerimônia de adeus, foi uma alegre festa de gratidão a um herói na hora de ele entrar para a História. Quanto ao Papa Francisco, foi a “personalidade do ano” em vários países. Ainda é cedo para santificá-lo, mas as mudanças que introduziu nos ritos e na tradição — em vez dos trajes alegóricos, a batina branca; o crucifixo de prata e não de ouro; o sapato preto em lugar do chamativo vermelho — permitem falar numa “revolução da simplicidade”, que vai além das aparências. Não foi pouco o que fez em relação a certos dogmas, como o da questão gay, privilegiando a tolerância em lugar da condenação. Também não deixou de ser um milagre ter conseguido ser amado pelos brasileiros, sendo argentino.
O que de mais inesperado entre nós, porém, aconteceu em junho. O povo foi para as ruas, levado por uma geração aparentemente sem projeto. Ninguém desconfiava que esses jovens tidos pelos estereótipos como alienados seriam justamente os que iriam “acordar o gigante adormecido” e devolver ao país o ânimo de poder mudá-lo. E isso sem a máquina do Estado, sem a cobertura dos sindicatos nem dos partidos. Apenas com a internet. O movimento acabou desvirtuado pela infiltração dos vândalos, mas durou o suficiente para sacudir o governo e assustar os políticos. Espera-se que em 2014 retome a proposta inicial.
O 2013 foi especial para três Fernandas — a Montenegro, a Torres e a Lima. O Emmy de melhor atriz da TV para Fenandona por “Doce de mãe” foi mais do que esperado. Devia ter vindo na forma de Oscar pelo filme “Central do Brasil”, de Walter Salles. Coube à TV a reparação da injustiça. Já sua filha Nanda surpreendeu não mais como atriz, mas como grande escritora, brilhando com seu primeiro romance, “Fim”. A terceira delas, a Lima, obteve sucesso ao apresentar com o marido o sorteio da Copa. As modelos nos acostumaram a acreditar no equívoco de que elegância era andar trocando as pernas nas passarelas. Fernanda, com seus passos firmes e retos, ensinou ao mundo o que é ser elegante.
Mas foi quase no final, em novembro, no país onde se dizia que ricos e poderosos não iam para a cadeia, que houve o mais inédito dos episódios: a prisão de importantes políticos, empresários e banqueiros condenados por corrupção. Era uma possibilidade tão improvável que um dos envolvidos, tranquilo, previu no começo que o destino do mensalão era virar “piada de salão”. Não virou, e isso fez grande diferença em 2013, talvez a maior.
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