O GLOBO - 17/08
Nossa posição já não é tão forte. E pior: vem se deteriorando com certa rapidez
Faço parte de uma geração de economistas brasileiros que viveram durante décadas atormentados por crises relacionadas ao desequilíbrio externo da economia. Éramos devedores renitentes, eternamente sujeitos à instabilidade econômica e às humilhações inerentes à situação de quem depende de outros para pagar suas contas. Em vários momentos, e mais recentemente no governo FHC, ficamos reduzidos à condição de pedintes internacionais, passando o chapéu no exterior para fechar o balanço de pagamentos do país.
Passou. A posição brasileira se transformou de maneira impressionante. Chegamos a viver anos de glória. Viramos até credores do FMI: emprestamos US$ 14 bilhões durante o governo Lula – e estão nos pedindo mais US$ 10 bilhões.
A euforia passou também. Estamos ainda longe das condições que nos levaram a crises cambiais, instabilidade e recessão. Mas a nossa posição já não é tão forte. E pior: vem se deteriorando com certa rapidez.
O superávit comercial veio caindo desde 2008 e virou déficit neste ano. O balanço de pagamentos em conta corrente, que era superavitário em meados da década passada, também passou a registrar déficit expressivo e crescente. Não só a balança comercial, mas as contas relacionadas a turismo, transporte, remessas de lucros, entre outras, vêm registrando desequilíbrios maiores. Para 2013, o Banco Central projeta um déficit em conta corrente de US$ 75 bilhões.
A posição externa brasileira ainda apresenta alguns aspectos fortes. A flutuação cambial é mais eficaz do que o câmbio fixo ou semi-fixo que tivemos em décadas anteriores. No regime de flutuação, a depreciação funciona, dentro de certos limites, como um mecanismo automático de correção do desequilíbrio externo.
Além disso, a elevada entrada de investimentos diretos estrangeiros, uma forma relativamente estável de capital externo, ainda cobre a maior parte do déficit corrente. E mais importante: o nível de reservas internacionais do Brasil é bem mais alto do que o que tivemos no passado. Nos últimos dez anos, as reservas subiram de cerca de US$ 50 bilhões para US$ 370 bilhões. Esse estoque de ativos líquidos em moeda estrangeira constitui poderoso instrumento de autoproteção e preservação da autonomia nacional.
Mesmo assim, preocupa a deterioração recente das contas externas. Os nossos pontos fortes não representam garantia completa. A depreciação cambial afeta a inflação e pode se tornar desestabilizadora. As reservas podem sofrer queda acentuada se houver rápida conversão em moeda estrangeira de ativos financeiros líquidos em reais.
O quadro mundial é instável e não podemos baixar a guarda. A última coisa que um economista da minha geração gostaria de reviver é a volta do país a uma situação de fragilidade externa.
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