FOLHA DE SP - 13/07
Alguém consegue explicar a má vontade dos médicos tapuias em relação aos Alcoólicos Anônimos?
A COLUNA do Contardo Calligaris de ontem, que menciona seu amigo alcoólatra estimulado a voltar a beber pela mulher foi um clássico. Um clássico equívoco a ser evitado.
Costumo ler o Contardo de joelhos. Mas não ontem. Ali ele trivializou um assunto que não só conheço bem, como sou testemunha diária dos efeitos devastadores que produz, inclusive pela negligência com que é tratado. Não dá para entender a má vontade dos profissionais do país com os Alcoólicos Anônimos, uma irmandade reconhecida no mundo todo pelos excelentes serviços que presta.
O texto de Calligaris me remeteu ao hepatologista de Tarso de Castro, que chegou ao cúmulo de liberar o jornalista, dependente, para tomar uma taça de vinho ao dia.
Não sou especialista, apenas alguém que padece de uma doença que a Organização Mundial da Saúde define como "incurável, progressiva e mortal". E posso atestar que o texto serviu de luva para reafirmar o propósito de que problemas relativos ao álcool devem ser tratados dentro da sala dos Alcoólicos Anônimos, bem longe do divã do psicanalista.
Veja. Quem conhece minimamente os 12 Passos dos AA sabe que o programa não oferece garantias. Mas, a dada altura, por negligência ou mero infortúnio, Contardo diz o seguinte: "O homem frequentou os AA e deu certo". Ora, para nós, membros dos AA, ao contrário, o programa funciona, se muito, "só por hoje", nunca "dá certo", inexiste esse conceito. Eu posso voltar à ativa daqui a 20 minutos, corro esse risco, é da natureza da doença.
Um dos maiores predicados dos AA, inclusive, é esse. O de me colocar o tempo todo no presente para que eu consiga reduzir a angústia que a lembrança do passado me traz e diminuir a ansiedade que o peso do futuro pode vir a me causar.
Mas de que importa a filosofia dos AA? Bom mesmo é teorizar, não é para isso que serve psiquiatra? Calligaris menciona ainda que, aconselhado pelo seu grupo, o sujeito passou por uma "internação de um ano". De onde tirou um absurdo desses, só Deus sabe. Internação longa nos AA? Em 20 anos de Alcoólicos Anônimos nunca vi essa picaretagem. Aliás, é cada vez mais comum no país a prática criminosa da internação longa que isola o dependente da família e coloca o médico como intermediário todo-poderoso, sem que ninguém fiscalize.
Adoro ler o Contardo, ele me explica muitas coisas. Mas não me explica tudo. A psicanálise é aleijada da dimensão espiritual, um caminho muito indicado, senão imprescindível, para alguém como eu, que produz pouca endorfina, dopamina e outros opiatos naturais por conta dos anos que passei mamando destilados. Jung já advertia sobre isso a Bill e Bob, os dois sujeitos que fundaram os Alcoólicos Anônimos. Está documentado.
Fico me perguntando a quem Calligaris refere os casos mais graves de dependência. Não gosto nem de pensar na resposta. Em todo caso, uma atividade não interfere na outra, não é mesmo? O colunista é um, o médico é outro. Vamos deixar assim.
E deixar também um convite para que o amigo Contardo venha assistir a qualquer próxima edição que eu for dar da palestra "Do Fundo da Garrafa ao Domínio da Minha Vida", em que conto um pouco sobre meu trágico envolvimento com o álcool e como consegui sair desse inferno. Quem sabe ele não se anima a vir conhecer uma sala dos AA por dentro? Só por hoje. Funciona.
Costumo ler o Contardo de joelhos. Mas não ontem. Ali ele trivializou um assunto que não só conheço bem, como sou testemunha diária dos efeitos devastadores que produz, inclusive pela negligência com que é tratado. Não dá para entender a má vontade dos profissionais do país com os Alcoólicos Anônimos, uma irmandade reconhecida no mundo todo pelos excelentes serviços que presta.
O texto de Calligaris me remeteu ao hepatologista de Tarso de Castro, que chegou ao cúmulo de liberar o jornalista, dependente, para tomar uma taça de vinho ao dia.
Não sou especialista, apenas alguém que padece de uma doença que a Organização Mundial da Saúde define como "incurável, progressiva e mortal". E posso atestar que o texto serviu de luva para reafirmar o propósito de que problemas relativos ao álcool devem ser tratados dentro da sala dos Alcoólicos Anônimos, bem longe do divã do psicanalista.
Veja. Quem conhece minimamente os 12 Passos dos AA sabe que o programa não oferece garantias. Mas, a dada altura, por negligência ou mero infortúnio, Contardo diz o seguinte: "O homem frequentou os AA e deu certo". Ora, para nós, membros dos AA, ao contrário, o programa funciona, se muito, "só por hoje", nunca "dá certo", inexiste esse conceito. Eu posso voltar à ativa daqui a 20 minutos, corro esse risco, é da natureza da doença.
Um dos maiores predicados dos AA, inclusive, é esse. O de me colocar o tempo todo no presente para que eu consiga reduzir a angústia que a lembrança do passado me traz e diminuir a ansiedade que o peso do futuro pode vir a me causar.
Mas de que importa a filosofia dos AA? Bom mesmo é teorizar, não é para isso que serve psiquiatra? Calligaris menciona ainda que, aconselhado pelo seu grupo, o sujeito passou por uma "internação de um ano". De onde tirou um absurdo desses, só Deus sabe. Internação longa nos AA? Em 20 anos de Alcoólicos Anônimos nunca vi essa picaretagem. Aliás, é cada vez mais comum no país a prática criminosa da internação longa que isola o dependente da família e coloca o médico como intermediário todo-poderoso, sem que ninguém fiscalize.
Adoro ler o Contardo, ele me explica muitas coisas. Mas não me explica tudo. A psicanálise é aleijada da dimensão espiritual, um caminho muito indicado, senão imprescindível, para alguém como eu, que produz pouca endorfina, dopamina e outros opiatos naturais por conta dos anos que passei mamando destilados. Jung já advertia sobre isso a Bill e Bob, os dois sujeitos que fundaram os Alcoólicos Anônimos. Está documentado.
Fico me perguntando a quem Calligaris refere os casos mais graves de dependência. Não gosto nem de pensar na resposta. Em todo caso, uma atividade não interfere na outra, não é mesmo? O colunista é um, o médico é outro. Vamos deixar assim.
E deixar também um convite para que o amigo Contardo venha assistir a qualquer próxima edição que eu for dar da palestra "Do Fundo da Garrafa ao Domínio da Minha Vida", em que conto um pouco sobre meu trágico envolvimento com o álcool e como consegui sair desse inferno. Quem sabe ele não se anima a vir conhecer uma sala dos AA por dentro? Só por hoje. Funciona.
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