Seria um bom tema para programas humorísticos. O caso do concurso para garis realizado no município paranaense de Cambé ilustra como nunca o velho bordão de que a vida imita a arte.
Organizada pela UTFPR (Universidade Tecnológica Federal do Paraná), a prova, destinada a avaliar conhecimentos gerais dos candidatos a um emprego de varredor de rua, esmerou-se em questões de indiscutível irrelevância.
Seria preciso saber, por exemplo, que frase tornou famosa a personagem Valéria, do programa de TV "Zorra Total". "Ai, como eu sou bandida!" era a resposta correta.
Os responsáveis pela elaboração do concurso provavelmente não saberiam responder uma pergunta mais importante: por que razão um gari deveria ter conhecimento de quinquilharias desse tipo?
Em nota oficial, a universidade, subordinada ao Ministério da Educação, tentou explicar-se. Afirmou que as informações exigidas constavam de uma revista de circulação nacional.
Sem especular muito, pode-se dizer que no episódio se aliaram duas características marcantes da cultura nacional: o gosto pela burocracia e a presença inarredável do preconceito.
Trata-se de puro vezo burocrático, com efeito, a convocação de técnicos de uma universidade para elaborar um teste destinado à seleção de profissionais na varrição pública. A menos que o cargo oferecido viesse simplesmente a servir como pretexto para alguma ação de empreguismo com cartas marcadas, nenhum gari será melhor ou pior se conhecer ou não os personagens de "Zorra Total".
E aqui intervém, sem dúvida, o preconceito. Já que a burocracia requer uma prova de conhecimentos gerais para o cargo, faça-se uma prova supostamente adequada ao nível educacional dos candidatos. Seria absurdo que tivessem de responder sobre Winston Churchill ou Carlos Magno; mas que respondam sobre Valéria não é menos absurdo.
Eis que programas humorísticos da TV se tornam, assim, objeto de uma prova, quando o contrário seria mais adequado: a prova bem que poderia ser objeto de um programa humorístico. Nela, um técnico universitário, um burocrata municipal e uma autoridade do Ministério da Educação tentariam se desvencilhar das pegadinhas de um concurso público, enquanto a única personagem de bom-senso, o gari, recolheria ao final da cena a imensa quantidade de papéis inúteis produzidos pelos três.
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