sexta-feira, março 09, 2012

Presente de grego - DENISE ROTHENBURG


Correio Braziliense - 09/03/12


A votação do Senado foi a estreia de um novo ciclo de guerra interna no PMDB. A liderança de Renan Calheiros está em xeque. Não por acaso, Dilma pretende ampliar sua interlocução dentro do partido e ver como desviar seu governo das balas perdidas


A presidente Dilma Rousseff acordou de cabeça quente ontem, Dia Internacional da Mulher, tratando de mapear os erros que levaram à derrubada do nome de Bernardo Figueiredo da Agência Nacional de Transportes Terrestres (ANTT). O primeiro deles se refere à redoma em que vivem os comandantes meio avessos a ouvir os políticos. Ninguém lhes diz sem rodeios que o caos está instalado. Os líderes geralmente ficam no cerca-lourenço, "olha, tem um probleminha, mas nada grave" e por aí. Há vários dias, o Planalto recebe uma série de avisos de que nada vai bem no PMDB e nos partidos aliados. Não faltaram alertas sobre mais dia, menos dia, o governo ser surpreendido no plenário. Mas Dilma estava na Alemanha e, antes disso, tão requisitada a ajudar o PT a resolver São Paulo, esqueceu de verificar cuidadosamente o que ocorria entre os senadores.

O segundo problema era o PMDB. E, nessa seara, os entraves não dizem respeito apenas à relação de Dilma com o partido. Há tempos o partido vive uma guerra fria entre líderes e liderados. Os novos senadores, em sua maioria ex-governadores, desejam ter mais voz ativa. E os atuais comandantes, o líder da bancada, Renan Calheiros (AL), e o presidente do Senado, José Sarney (PMDB-AP), não querem perder o poder.

Ocorre que nenhum deles tem hoje um controle direto sobre a bancada como na Legislatura anterior. Entre aqueles que têm um ano de mandato e alguns mais antigos, há uma sensação generalizada de que os líderes do partido na Casa só trabalham para si mesmos. E parte do grupo dos novatos achava que uma derrota de Dilma, poderia ajudar a desestabilizar a liderança de Renan ao ponto de levar o Planalto a ouvir os outros senadores, em vez de ficar restrito à cúpula partidária.

Por falar em cúpula...
Dentro da própria ala que hoje comanda o PMDB também havia o sentimento de "dar um susto" em Dilma. Antes da votação, Romero Jucá (PMDB-RR), líder do governo no Senado, comentou com alguns colegas sua expectativa de levar o governo à vitória por um único voto. E, numa votação secreta, seu plano era perfeito: um placar apertado daria a Jucá e Renan o momento ideal para dizer ao Planalto que havia uma necessidade de dividir mais o jogo com eles. E, assim, esses líderes não perderiam a capacidade de comando. Como o resultado foi além do esperado, eles perderam o tom e Dilma passou a achar que nem Renan nem Jucá controlam o PMDB.

Essa não foi a primeira vez que os comandantes do PMDB tentaram usar de artifícios regimentais para dar um susto na presidente Dilma. Na votação da regulamentação da Emenda nº 29, aquela que amplia a aplicação de recursos na área de saúde, o governo não caiu na armadilha por muito pouco. Os peemedebistas tentaram convencer o Planalto de que era preciso manter a urgência. A derrota na votação era certa e os senadores terminariam aprovando a obrigatoriedade de o governo federal aplicar 10%. Alertado por outros senadores, o Planalto recuou e retirou a urgência da proposta. E, com um pouco mais de tempo para negociar, o governo saiu vitorioso.

A sensação que ficou entre alguns senadores ontem é a de que o Planalto foi induzido ao erro ao não apostar no adiamento da votação do nome de Bernardo para a ANTT. Se adiasse e organizasse melhor o jogo, o governo poderia ter vencido. Agora, entretanto, não adianta mais reclamar e sim evitar que isso se repita. Não por acaso, a presidente chamará outros senadores para conversar sobre a votação, a fim de ouvir o que pode ser feito e tentar decifrar o que pode fazer para que a guerra nas coxias peemedebistas não afete seu governo.

Por falar em coxias...
Da parte dos caciques, a ordem é tentar reorganizar o PMDB jogando o PT na roda: Renan, Sarney e Jucá não se esquecem de repetir que o PMDB só terá força se mantiver a unidade. Ocorre que esse discurso funcionou até o ano passado. Agora, não cola mais. Tudo indica que estamos diante de um novo ciclo de desavenças dentro do PMDB. E, quando isso acontece, sempre quem paga o pato é o governo federal.

Foi assim com Fernando Henrique Cardoso, foi assim com Lula, e, agora, chegou a vez de Dilma. Por coincidência, no Dia Internacional da Mulher, sobrou para Dilma uma corbélia de problemas. E, se pensarmos bem, leitor, no mundo dos homens em que ela vive, até a palavra flores representa encrenca. Basta ver a queda de braço entre o presidente do Banco do Brasil, Aldemir Bendime, e o presidente da Previ, Ricardo Flores. Mas essa é outra história.

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