terça-feira, janeiro 24, 2012
Os trabalhos de Lula - DENISE ROTHENBURG
Correio Braziliense - 24/01/12
Lula abraçando Haddad dentro do Planalto é imagem para figurar no horário eleitoral. Só isso, associado à popularidade de Dilma, é uma largada para ninguém botar defeito na missão do ex-presidente: expulsar os tucanos de São Paulo
Engana-se quem pensa que o ex-presidente Lula está em casa, apenas lendo os livros que recebeu de presente no Natal ou mesmo fazendo as contas de quantas sessões do tratamento de câncer ainda terá pela frente. Lula se sente na obrigação de servir ao PT hoje como o herói da mitologia grega, Héracles (Hércules), serviu ao rei Euristeu na Antiguidade, o que resultou nos 12 trabalhos de Hércules.
Lula até agora fez quatro trabalhos para o PT: ajudou o partido a crescer, elegeu-se presidente por duas vezes. Em ambas as oportunidades, não descuidou do eleitorado. Governou de forma a manter um público fiel. Estava sempre nos palanques. Seu quarto objetivo foi atingido em outubro passado, quando elegeu a presidente Dilma, uma novata na questão política, contra o experiente ex-governador de São Paulo José Serra, que já foi tudo o que um político pode ser no maior colégio eleitoral do Brasil, deputado, prefeito, governador e senador.
O ex-presidente está agora no quinto trabalho partidário que, aliás, faz lembrar o do herói filho de Zeus. A quinta missão de Hércules foi expulsar as aves do lago Estinfale, na Arcádia. Lula também recebeu do PT a missão de ajudar a expulsar os tucanos e seus aliados de São Paulo. Começou a executar essa missão quando escolheu um nome novo, talvez o petista com mais cara de tucano e com uma história de vida parecida com a de muitos outros paulistanos que começaram a vida adulta cedo trabalhando para ajudar a família.
Atualmente, Lula está tão focado nisso que fez questão de vir hoje a Brasília prestigiar o pré-candidato Fernando Haddad. A presença de Lula na posse hoje — se é que ele vem mesmo, porque, embora confirmada, tinha gente querendo estragar a festa — será uma deferência que nenhum outro candidato a prefeito paulistano obteve. Será a segunda vez que Lula pisa no Palácio do Planalto depois que deixou o cargo. A primeira foi no velório do seu parceiro político por oito anos, o ex-vice-presidente José Alencar. Voltar agora apenas para prestigiar Haddad é um sinal importante. Talvez até maior do que a marca da solenidade de um milhão de bolsas do Prouni, ontem no Palácio.
A imagem de Lula abraçando Haddad dentro do Palácio do Planalto é imagem para figurar no horário eleitoral para prefeito paulistano. Só isso, associado à popularidade de Dilma Rousseff, é uma largada política para ninguém botar defeito dentro da atual missão do ex-presidente: expulsar os tucanos da capital paulista.
Por falar em São Paulo...
Aloizio Mercadante, futuro ministro, também sairá da mesma solenidade hoje com um abraço de Lula sob encomenda para seus projetos futuros de governar São Paulo. Mas Lula ainda tem dúvidas se Mercadante é o melhor nome. Afinal, como já dissemos aqui, o ministro da Saúde, Alexandre Padilha, também está na área e com um trabalho de formiguinha pelo interior de São Paulo. Mas, até chegar lá, Lula tem outras tarefas. Uma delas é evitar que o PMDB conquiste as presidências da Câmara e do Senado. O ex-presidente, por sinal, já disse aos petistas que trabalhem de forma a não deixar que isso aconteça. Aliás, isso influenciou na época para que Michel Temer fosse escolhido candidato a vice para compor a chapa com Dilma Rousseff. Lula não quer ver Dilma tão refém do PMDB como ele foi. Por isso, colocará essa missão entre os trabalhos necessários para ajudar o PT a limpar um pouco o caminho das pressões sobre 2014.
Por falar em 2014...
O sétimo trabalho do Hércules da mitologia grega foi capturar o touro selvagem do rei dos cretenses, Minos. Transferindo a nossa história para a política brasileira, trocamos aqui apenas a vogal, em vez de Minos, Minas. Lula começa a estudar devagar e pacientemente os movimentos do senador Aécio Neves, tido como o nome da oposição para concorrer com Dilma Rousseff daqui a dois anos e meio.
Aécio, que parece imóvel ao grande público, como alguém alheio à política, tem se movimentado bastante nos bastidores. E são essas manobras, quase que imperceptíveis a olho nu, que Lula hoje tenta mapear de forma a segurar os aliados em torno do PT. Assim como Hércules capturou o touro selvagem do rei Minos, o herói petista deseja tirar o poder do astuto político que vem de Minas e, assim, cumprir mais uma tarefinha em favor do PT que já lhe deu tanto. Entre os petistas, há quem diga que Lula só vai parar quando ver a bandeirinha do partido tremulando em São Paulo e Minas Gerais. Mas, enquanto 2014 não chega, Lula se prepara para tirar as aves da maior cidade do país. Hoje, ele espera dar mais um passo rumo a esse objetivo. Se conseguir cumprir tudo o que deseja, certamente ganhará o apelido de Hércules da política brasileira. Vamos observar.
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