FOLHA DE SP - 12/12/12
Não devolver o dinheiro se a viagem foi cancelada, ou cancelá-la três dias antes da data, é um desrespeito
Cancelamento de viagem provocado pelas cinzas do vulcão chileno Puyehue já seria um episódio desagradável, mas nada podemos fazer com relação a fenômenos naturais, exceto lamentar e evitar riscos desnecessários. Não receber o estorno do pagamento da passagem após mais de quatro meses é um absurdo, um abuso e um desrespeito.
Foi o que aconteceu com Ricardo Caputo, que comprou sua passagem no site Decolar.com. Ele pagou com o cartão -logo, o reembolso deveria ocorrer até a próxima fatura. Passados mais de cem dias, ele ainda não havia recuperado o que pagou. Além disso, a empresa se negou a fornecer a gravação eletrônica, sob a alegação de que seria usada para avaliar o atendimento.
A regulamentação do Serviço de Atendimento ao Consumidor (parágrafo 3º do artigo 15 do decreto nº 6.523/2008) diz que "é obrigatória a manutenção da gravação das chamadas efetuadas para o SAC, pelo prazo mínimo de 90 dias, durante o qual o consumidor poderá requerer acesso ao seu conteúdo". O parágrafo 4º diz que "o registro eletrônico do atendimento será mantido à disposição do consumidor e do órgão ou entidade fiscalizadora por um período mínimo de dois anos após a solução da demanda".
Não foi um caso isolado, nem falha exclusiva daquele site.
A agência de viagens CVC, em suas condições gerais para aquisição de viagens, tem uma 'pérola' de desrespeito ao consumidor: "Quando a execução dos serviços adquiridos depender de um número mínimo de participantes e, não sendo esse número atingido, reserva-se a contratada o direito de cancelar a viagem, comunicando o contratante com a antecedência mínima de 72 horas".
Ou seja, três dias antes de viajar o consumidor poderá receber a informação de que a viagem foi cancelada. É uma cláusula nitidamente abusiva, em contraposição aos direitos do consumidor.
O direito de arrependimento
-uma semana nas compras on-line- é ignorado pelas agências e sites que vendem passagens aéreas. Às vezes, pela subtração de taxas e multas contratuais do valor do reembolso. Outras usam argumentos "criativos" para devolver menos do que foi desembolsado.
O artigo 49 da lei nº 8.078/90 (Código de Defesa do Consumidor) é cristalino: "O consumidor pode desistir do contrato, no prazo de sete dias a contar de sua assinatura ou do ato de recebimento do produto ou serviço, sempre que a contratação de fornecimento de produtos e serviços ocorrer fora do estabelecimento comercial, especialmente por telefone ou a domicílio".
O parágrafo único desse artigo diz que "se o consumidor exercitar o direito de arrependimento, os valores eventualmente pagos, a qualquer título, durante o prazo de reflexão, serão devolvidos, de imediato, monetariamente atualizados".
E há artimanhas, por exemplo, que as companhias usam para incluir o seguro viagem no preço total da passagem, sem que as pessoas percebam (a compra já vem selecionada, tendo de ser desmarcada com um clique). Isso é venda "casada", proibida pelo CDC. A Agência Nacional de Aviação Civil (Anac) vetou esse expediente, mas as reclamações continuam.
Citei somente alguns dos problemas que mais irritam os viajantes, mas há outros, como extravio de bagagens, longas filas, atrasos e cancelamento de voos.
A propósito, a Anac regulamentou a possibilidade de uso compartilhado das áreas de processamento de passageiros e de bagagens (check-in), sob a alegação de que isso ajudaria a reduzir filas. Acho que a agência deve, efetivamente, procurar soluções para o problema.
Não sei, contudo, se essa partilha não provocará confusões e desconforto para o consumidor, inclusive em relação ao despacho de malas e de outros pertences. Considero que faltam mais fiscalização e sanções às companhias aéreas, sempre que não atenderem adequadamente seus clientes.
Filas ocorrem por falta de espaço, de infraestrutura e de investimentos nos aeroportos. Então, mais do que criatividade, precisamos de melhores aeroportos e de que a Anac cobre das companhias aéreas que respeitem o CDC. Somente isso.
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