O método Sandy
BARBARA GANCIA
FOLHA DE SP - 07/08/11
A vida inteira desconfiei de que tinha gato na tuba. De que esse negócio de autoestima é invenção de americano para vender livro de autoajuda. Agora vem uma psicóloga lá do Texas e escreve um livro de - adivinhe?- autoajuda para nos dizer que autoestima é um demônio capitalista comparável a dirigir com as partes expostas, como fez o jovem encontrado enrolando a língua dentro de um Camaro amassado em São Bernardo.
Kristin Neff, autora de "Self-Compassion", foi entrevistada pelo Equilíbrio, da Folha, e explicou que o narcisismo se tornou uma epidemia: "Para manter a autoestima em alta, precisamos nos sentir melhor do que somos e achar que os outros são piores do que são", diz. "Numa sociedade competitiva, crianças têm sido educadas com a ideia de que devem sempre se sentir especiais e ganhar prêmios."
Eu me amo e me odeio, me amo e me odeio... Essa gangorra emocional não pode dar certo. Onde eu me encaixo em uma sociedade que já não fala mais nem sequer em "segmentação"?
Vivemos a era da "customização". O mercado globalizado do luxo é um Bin Laden que opera debaixo de nossas fuças, sabotando todo mundo e nos fazendo crer que somos especiais quando todos podem ver que até os plantadores de ópio do Afeganistão agora possuem bolsas Louis Vuitton. Não basta mais ser hippie, punk ou Hell's Angels para ser único.
Agora eu tenho de ter algo a mais. E dá-lhe exclusividade e bacanice. Autoestima em alta eu reconheço à distância. Identificamos a falação no meio da aula da Casa do Saber, lugar frequentado para adquirir cultura porque, afinal de contas, modelos de bolsas já temos todos. Quando dona madame interrompe o Wisnik com a mesma tranquilidade com que cortaria a fala da camareira de casa é porque estamos com a autoestima em turbo. E tome viagem para a Índia ciceroneada pelo Deepak Chopra. Pensa que a subida do Everest está atulhada de lixo por quê? É a montanha pagando os pecados da nossa vulgaridade.
A mim sempre disseram: "Barbara, você deveria aprender a se gostar mais". E, a cada vez, cuspi de volta: "Puxa, mas justo agora que eu estava pensando em ir até dezembro sem tomar banho, escovar os dentes ou cortar as unhas dos pés?".
No meu tempo, um a cada três conviviva muito mal com o nariz; três a cada duas achavam que tinham cabelo ruim e cerca de 90% sofriam de inadequação com o seu pênis.
Hoje não. Tem lavadora e secadora numa máquina só e sobra tempo para pensar na vida. E o pessoal acaba elevando o problema da autoestima a patamares complexos. Pesquisas mostram que todo mundo se acha mais engraçado, mais coerente, mais confiável e melhor motorista do que o resto do mundo. E como fica na hora de renovar a autoestima? Ansiolíticos? Ou será que a Sandy, com suas infinitas sabedoria e versatilidade, não terá encontrado o caminho?
Isso mesmo, a Sandy. Tão pura, casada com aquele menino polido que conheci na sala de maquiagem da Band. Não posso crer que esteja querendo me manipular. Se ela diz que gosta de determinada prática, eu também gosto. Muito melhor fazer exercício do que ficar correndo atrás do impossível, né não? Pronto, resolvi. Vou aderir à técnica de relaxamento da Sandy. Vem comigo?
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