Prudentes ou combatentes?
VINÍCIUS TORRES FREIRE
FOLHA DE SP - 10/07/11
Fazenda fala em medidas para desvalorizar real, mas BC baixa decisão que só reduz riscos no câmbioO GOVERNO quer mexer no câmbio (no preço do dólar) ou quer evitar desastres devidos ao endividamento externo irresponsável? A dúvida poderia voltar ao debate depois da noite de sexta-feira, quando o Banco Central tentou outra vez encarecer o custo dos bancos de manter passivo em moeda estrangeira.
Os bancos terão de deixar mais dinheiro parado, sem remuneração, no BC caso seu passivo em dólares ("posição vendida") passar de um certo teto, agora baixado pelo BC (de US$ 3 bilhões para US$ 1 bilhão). Para não serem "punidos" pelo excesso de passivos em moeda estrangeira, vão reduzir suas posições vendidas. Terão de comprar dólares.
Pegar dinheiro no exterior está fácil e, graças ao BC, é seguro. É rentável (paga-se juro de mundo rico, ganha-se juro brasileiro), seguro (o BC negocia dólares com o mercado de modo a evitar variações excessivas da taxa de câmbio) e os ventos inflam o valor do real. Isso tudo incentiva bancos a se endividar em dólar (para ganhar com a diferença de juros internos e externos).
Grosso modo, o BC pretende reduzir um dos canais desse endividamento e especulação, o que já tentara fazer com medida semelhante, então inédita, baixada em janeiro (que entrou em vigor apenas em abril, dando tempo para que houvesse um ajuste suave nos bancos).
Agora, o ajuste deve ocorrer em prazo mais curto. Os bancos terão de comprar dólares em alguns dias. Deve ocorrer certa desvalorização do real e alguma confusão no mercado na próxima semana. Tudo mais constante, a confusão e a desvalorização serão temporárias, até os bancos reduzirem seus passivos ("ajustarem suas posições").
No mais, como efeito adicional e decorrente da medida, o Banco Central terá de comprar menos, acumular menos reservas).
Na semana que passou, o BC alertou mais uma vez a praça sobre uma obviedade dos riscos do câmbio flutuante: assim como o real se valoriza, também pode tomar tombos. Foi o que o presidente do BC, Alexandre Tombini, disse no Congresso a respeito dos riscos de fazer muita e desprotegida dívida externa. Grandes empresas brasileiras quebraram em 2008 quando o real se desvalorizou, no estouro da crise.
O Ministério da Fazenda, por sua vez, disse também na semana passada estar preocupado com o efeito da entrada excessiva de dólares sobre as empresas brasileiras, pois o real se valoriza e encarece nossos produtos. Avisou que o governo cozinhava medidas cambiais. Até agora, saiu apenas essa medida do BC.
Medidas "prudenciais", como a de sexta-feira, podem ter duplo objetivo ou efeito. Taxar a entrada de capital, como o governo tem feito desde 2009, evita tanto o excesso de crédito como pode conter valorização adicional do real. Medidas que limitam a oferta de crédito às famílias evitam tanto o aumento do calote e riscos para os bancos como pode desaquecer a economia e conter a inflação.
Obviedades.
Mas, na prática, com a medida de sexta-feira o BC pretende evitar que uma súbita desvalorização do real seja intensificada em curtíssimo prazo pela necessidade dos bancos de ajustar suas posições e exposições em moeda estrangeira, que o BC ora julga exageradas. De quebra, a autoridade monetária reduz em mais um tico o dinheiro disponível para crédito nos bancos.
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