Cuidado justificado
GEORGE VIDOR
O GLOBO - 02/05/11
O crédito financia o correspondente à metade da economia brasileira. Há cinco anos, financiava menos de um terço do Produto Interno Bruto (PIB). Isso significa que os parâmetros de política monetária de alguns anos atrás não servem mais para a conjuntura atual. Ajustes de 0,25 ponto percentual na Taxa Selic têm hoje mais efeito sobre a economia que no passado recente.O Banco Central tem então toda a razão de tomar cuidado com o aperto monetário que está em andamento para esfriar a economia e evitar que a inflação e o câmbio abortem um ciclo virtuoso de investimentos que vem se formando no país.
Nesse sentido, é pouco provável que as taxas de juros básicos ultrapassem o patamar de 12,75% em 2011 (é claro que isso dependerá da resposta dos preços de bens e serviços às medidas já tomadas pelas autoridades monetárias).
Por quase dez anos "adiei" uma viagem de férias à Turquia pelo receio (não de todo injustificado) de acabar sendo pisoteado por hordas de turistas... Há quem diga que o animal mais próximo do ser humano não é o macaco, mas sim o turista... Este ano resolvi cumprir a promessa de conhecer a Turquia, e não me arrependi em qualquer momento.
Trinta milhões de pessoas visitam a Turquia anualmente, a negócios ou a lazer. Istambul, uma cidade com 11 milhões de habitantes, já é o sétimo destino mais visitado do planeta. É realmente um formigueiro humano, mas o transporte público funciona bem, a cidade é bem sinalizada e relativamente fácil transitá-la mesmo para alguém que não saiba uma palavra sequer em turco.
O turismo é o segmento mais importante da economia turca, mas a agricultura se mantém como principal atividade produtiva. Frutas, verduras, legumes, chás e as famosas especiarias (motivo de cobiça nos séculos XIV, XV e XVI) são produzidas em larga escala em vales férteis que margeiam os mares Egeu e Mediterrâneo. Nas áreas centrais, mais secas, os agricultores produzem cereais e algodão, e também criam ovelhas, cabras, vacas, fornecendo carne, leite, lã e couro para a indústria.
A proximidade com o mercado europeu ainda permite que a indústria têxtil turca consiga competir com a chinesa nessa região. Mas os bazares turcos já estão infestados de produtos "made in China" ou "made in India". Um comprador desatento pode levar um tapete chinês, confeccionado em máquina, no lugar de turcos artesanais autênticos - que são de uma beleza irresistível (por causa desse risco de levar gato por lebre, é mais seguro comprá-los na Capadócia do que em Istambul).
Fábricas de couro, joias e cerâmicas são tradicionais na Turquia, mas pouca gente sabe que cerca de 25% dos carros usados pelos europeus são montados lá, nas cercanias de Ismirna.
Brasil e Turquia têm poucas semelhanças históricas, culturais e geográficas. No entanto, as economias dos dois países passaram por momentos muito parecidos nas últimas décadas. Inflação descontrolada, endividamento excessivo, desequilíbrios nas contas externas e juros estratosféricos. Hoje, a Turquia vive uma relativa estabilidade monetária, cresce acima da média mundial e tal qual a economia brasileira ainda disputa as primeiras colocações no ranking dos juros altos.
Na política, a Turquia é vista como modelo para os países de Oriente Médio que anseiam por regimes democráticos. Desde que Ataturk derrubou a monarquia otomana em 1920 e instituiu um Estado laico, a república turca consegue separar a forte influência religiosa muçulmana dos assuntos de governo. Os militares intervieram algumas vezes na política, mas souberam se retirar nos devidos momentos e assim mantiveram seu prestígio no país.
Não é à toa que a Turquia atrai a atenção de tantos visitantes. Além de paisagens indescritíveis, como as da Capadócia, a História passa por lá. Os turcos foram os últimos a chegar na Anatólia, vindos da região do Mar Cáspio, no século XI. Antes disso, povos mesopotâmicos, hititas (os primeiros a usar o ferro em armas), frígios, gregos antigos, romanos e hebreus a ocuparam. Alexandre, o Grande, começou por ali, ao vencer os persas, a trajetória que o levou até o Rio Ganges. No estreito de Dardanelos, Leônidas e seus trezentos soldados enfrentaram Xerxes "lutando à sombra" por causa da saraivada de flechas capazes de apagar a luz do sol. Marco Antonio e Cleópatra desafiaram Julio Cesar quando estavam na Anatólia. Depois da queda de Roma pelas invasões bárbaras, o império bizantino sobreviveu por quase mil anos em Constantinopla (a cidade se chamava antes Bizâncio). E desse período subsiste um dos monumentos da humanidade, que é a antiga basílica de Santa Sofia, hoje museu. Com essa construção, no século VI, o imperador Justiniano esperava superar o templo de Salomão, e tudo indica que conseguiu. Os primeiros cristãos se refugiaram na Anatólia, e suas marcas são vistas nas cavernas escavadas no Vale do Goreme (Capadócia). São Paulo, escorado em sua cidadania romana, peregrinou e pregou pelas cidades do Mediterrâneo e seus caminhos fazem parte de um roteiro que um número crescente de grupos de católicos vem visitando. Próxima às ruínas da cidade grega/romana de Éfoso fica o local que seria o último refúgio de Santa Maria, mãe de Jesus. Os judeus também encontraram refúgio na Anatólia, após a diáspora e a inquisição espanhola.
Se esse acervo não bastasse, ainda há muito o que se ver de reminiscências do poderosíssimo império otomano, pois os palácios onde viveram os 36 sultões estão ainda firmes e fortes em Istambul (nome adotado depois da tomada de Constantinopla pelos turcos no ano de 1453). Em breve, vou postar no blog (www.oglobo.com.br/blogs) algumas sugestões para quem planeja visitar a Turquia.
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