terça-feira, abril 12, 2011

JOSÉ PASTORE - A desoneração da folha... na China



A desoneração da folha... na China
JOSÉ PASTORE
O Estado de S. Paulo - 12/04/2011

A presidente Dilma deve estar sendo bombardeada com milhares de informações sobre os vários aspectos da economia chinesa. No campo do trabalho, as notícias devem ser sobre o aumento meteórico dos salários que, no setor industrial, foi de 9% em média em 2010. Em muitas cidades, ultrapassou a casa dos 20%, por força de uma grave falta de mão de obra. Os sindicatos estão flexionando seus músculos. Quando os aumentos não saem por bem, saem por greve.

O que isso tem que ver com o nosso país? Muita coisa. O aumento de salários e do poder de compra dos chineses é bom para o Brasil poder vender mais para eles. Mas para vender, é claro, é preciso ter preço e qualidade.

O esforço da missão brasileira à China é de expandir não apenas a atual pauta de exportação, mas, sobretudo, ampliar a venda de produtos manufaturados. É aqui que o carro pega. São inúmeros os fatores que afetam a competitividade da nossa indústria. O salário médio da indústria brasileira é sete vezes maior do que o da chinesa. É uma distância fenomenal. E mais: em estudo recente, o Bureau of Labor Statistics (BLS) mostrou que o Brasil é o país que tem os mais altos encargos sociais do mundo (International comparisons of hourly compensation costs in manufacturing in 2009, BLS, Washington: News Release, 8/3/2011).

Quando se vive uma escalada salarial como a que ocorre no Brasil atual, é bom lembrar que quando os salários sobem, os encargos sociais (da ordem de 100%) sobem junto. Bem diferente é o caso da China. Mesmo nos casos em que os salários subiram 20% (depois das greves de 2010), as despesas com o fator trabalho se limitam praticamente aos salários e benefícios acertados entre empresas e empregados.

A China não dispõe ainda de uma Previdência privada generalizada. São poucos os grupos que as têm. As férias são limitadas a 8-10 dias por ano e as jornadas de trabalho, na prática, são muito mais longas do que as brasileiras.

Mais importante, a insegurança jurídica é mínima, comparada à do Brasil. Entre nós, o cipoal de leis e de jurisprudência é colossal e quase sempre obscuro, o que dá margem aos 2 milhões de ações trabalhistas por ano. Isso pesa muito no custo do trabalho. Pesam também as despesas com treinamento. Pesquisa da Confederação Nacional da Indústria (CNI) indica que 74% das nossas indústrias têm de treinar a mão de obra, em muitos casos sem sucesso, por causa das graves carências dos trabalhadores nos fundamentos da educação elementar - o que na China já foi vencido para a maior parte da força de trabalho. Isso compromete o desempenho dos empregados. Pelo estudo do BLS acima citado, conclui-se que a diferença no custo do trabalho é muito maior do que a expressa pelos salários. Ela aumenta de forma expressiva quando se levam em conta o diferencial de produtividade e as despesas com encargos sociais.

É claro que eu jamais defenderei para o Brasil a adoção das condições desumanas da maioria dos trabalhadores chineses. Mas nós, brasileiros, podemos ter condições até melhores do que as atuais, se removermos os problemas que tanto encarecem o trabalho na indústria. A desoneração da folha é o primeiro passo. Mas, para uma solução realista, esse expediente requer profundas reformas nas áreas tributária e previdenciária, para não dizer na área do Poder Judiciário, para reduzir a insegurança jurídica que, em muitos casos, custa mais caro do que os próprios encargos sociais. Sim, porque estes, apesar de elevados, são conhecidos. Aquela explode de repente nos tribunais, ao revelar um passivo trabalhista que ninguém sabia.

Definitivamente, o ambiente de contratação do trabalho no Brasil não é favorável para enfrentar a concorrência da China, dos outros países da Ásia e os do Leste Europeu. Para corrigir esse desequilíbrio, não precisamos precarizar, mas, sim, modernizar as instituições do trabalho - a CLT, a Justiça do Trabalho e os sindicatos.

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