terça-feira, março 22, 2011

JANIO DE FREITAS

Muito simples
JANIO DE FREITAS

FOLHA DE SÃO PAULO - 22/03/11

UM MOMENTINHO. Para ler o bilhete, curto, muito claro. OK, desculpe.
Tudo na vida podia ser simples assim. Uma consulta vinda de Paris, da reunião que decidia o destino daquele país árabe, lá na África. Tomou só o momentinho que não chegou a interromper a conversa de Obama e Dilma. Hillary não sabia que os dois conversavam naquele momento. E, cá entre nós, se soubesse, não faria diferença, a conversa deles era o de menos. Sem uma palavrinha pessoal de Obama, a frota não poderia lançar foguetes no tal país, e Sarkozy e Cameron já estavam com seus aviões franceses e ingleses prontos para o ataque.
A conversa com Dilma não seria longa, mesmo. Para não passar de referências superficiais nos temas incômodos. Só pegar o fone da ligação aberta com Paris, tudo OK aí?, Não entramos nos voos, OK?, mandamos só foguetes, então OK, vamos começar. Bye.
Tudo na vida podia ser simples assim. Depois de Dilma, meia hora de conversa com assessores, todos ligados no mesmo telefonema, em um sala reservada do palácio. Ah, sim, o comunicado do próprio presidente a seu país. O mandato da ONU. A teimosia de Gaddafi. A democracia. Essas coisas.
E logo o encontro social no Itamaraty. Piadas forçadas, gargalhadas fáceis, risos e sorrisos, carn avol, um momentinho, outro bilhete curto, o bombardeio começou.
É uma e tal da tarde. O bombardeio é "para proteger o povo líbio". Os aviões de França e Inglaterra atacam a tropa de Gaddafi que se aproxima de Benghazi, no extremo leste. Os foguetes dirigem-se a Trípoli, a capital, no extremo oeste. Onde não há rebeldes. Há quartéis, por certo. E população civil.
Nenhum problema: o comando americano informa que não há mortos civis causados pelos 101 foguetes lançados sobre a cidade. É simples: os militares, e mais que todos os americanos, têm sempre esse cuidado.
Os duros ataques a Obama por viajar durante a crise Líbia, feitos pelos jornais e TVs americanos, aprenderam que o seu presidente, mesmo no exterior, é uma pessoa simples. Para tudo. E a parcela do povo que ouviu seu comunicado há de ter-se tranquilizado com este trecho: "Quero que o povo americano saiba que o uso da força não é nossa primeira escolha, nem uma decisão que tomei sem pesá-la". Direto e simples.
Tudo na vida podia ser simples como começar uma guerra.

NÃO FAZ MAL

Partículas radiativas, provenientes do Japão, estão constatadas na costa americana do Pacífico. Cientistas traquilizam: "A radiatividade dessas partículas não causa dano à saúde".
Tradução leiga: a ciência não sabe qual é o efeito nos humanos da radiatividade no nível constatado. É, portanto, inofensiva como foi o fumo por tantas décadas, a cocaína no século 19, as emissões industriais por 200 anos, e chega de exemplos do grande saber.

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