A sinfonia do poder
FERNANDO DE BARROS E SILVA
FOLHA DE SÃO PAULO - 23/02/11
Quando Dilma Rousseff terminou de discursar e desceu do palco, formou-se logo um burburinho na plateia "vip" da Sala São Paulo.
Diante das evidências de que a presidente iria deixar o local, um séquito de ministros, governadores, parlamentares e aspones se acotovelou para sair em disparada atrás dela. Foi como se alguém no teatro tivesse gritado:
"Fogo!".
O comportamento extravagante desses políticos foi a nota insólita da noite que celebrava os 90 anos da Folha. Com a plateia esvaziada, a Osesp, enfim, entrou no palco e executou o hino nacional. Veio a seguir a "Sinfonia nº 6" de Villa-Lobos, também sob a regência de Isaac Karabtchevsky.
Imagino o que passava pela cabeça dos músicos da orquestra mais prestigiosa da América Latina. FHC, Alckmin e Serra, entre outros muitos convidados, ficaram até o fim do concerto. O presidente da Câmara, Marco Maia (PT-RS), e o senador Eduardo Suplicy, quase.
A cerimônia, de fato, acabou sendo longa demais. Tempo suficiente para se perceber, disseminado entre os presentes, um certo clima de conchavaço tucano-petista. Com Dilma, parece haver um esforço de amaciamento nas relações com os tucanos, algo que não existia sob Lula. Guarde-se a imagem do tête-à-tête da presidente com FHC.
A festa também evidenciou que a sociedade civil, como era entendida nos anos 70/80 (um organismo "do contra", com voz e influência política), não existe mais. Em grande parte, ela foi substituída pela "sociedade dos banqueiros".
Outro sinal antipático dos novos tempos: a quantidade abusiva de seguranças e capangas reunida na Sala São Paulo. Talvez Muammar Gaddafi precisasse de tantos homens de preto com cara fechada, óculos escuros e ponto eletrônico na orelha. Mas Dilma? Seria a cracolândia ali ao lado uma terrível ameaça? A presidente não ouviu nem o hino nacional nem Villa-Lobos. Mas também não deve ter visto a lúgubre sinfonia do crack.
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