A hora dos silêncios
JANIO DE FREITAS
FOLHA DE SÃO PAULO - 25/01/11
Saída de Pedro Abramovay vem informar a integrantes do governo que não cabe gratuidade no que digamQUALQUER QUE SEJA a versão, dentre as várias em oferta, para a exoneração de Pedro Abramovay com menos de duas semanas na Secretaria Nacional de Políticas Antidrogas, é um fato, além de raro, com uma força de advertência capaz de efeitos inovadores pelo governo afora.
Se exonerado por determinação da própria presidente; ou por decisão do ministro da Justiça, José Eduardo Cardozo, com a concordância dela; ou por conclusão comum a ambos, o que continua a importar é o motivo do afastamento abrupto do jovem e bem conceituado Abramovay. Foi a extensa entrevista a "O Globo" em que lançou conceituações e propostas, como o fim da prisão para "pequenos traficantes", não adotadas, ou nem sequer discutidas, em instância decisória do governo.
É improvável que em algum outro país os participantes de governo falem tanto e com tanta frequência aos meios de comunicação, haja ou não um mínimo de motivo real para fazê-lo. Ministros e ocupantes de cargos relevantes são, muitos deles, presenças diárias. Não só em jornais diferentes, mas nos mesmos, as mesmas caras com a mesma legenda idenfiticadora, como se ninguém soubesse de quem se trata; e nas mesmas emissoras, com as mesmas "notícias" que deixaram de sê-lo porque já dadas na abertura do programa e já repetidas pelo locutor antes de aparecer o ministro, ou outro. O leitor e o espectador são seres muito bondosos (você, chegado até aqui, que o diga).
A enxurrada de falastrões não torna o leitor/espectador informado, de fato. Antes de tudo, porque o tanto falar tem pouco a ver, e quase sempre nada a ver, com o que possa existir de relevante no assunto.
A motivação está na convergência do desejo de falar aos meios de comunicação e da busca do que publicar. Além disso, pela tendência generalizada que fez, por exemplo, com que só agora os leitores/espectadores soubessem que um sistema de prevenção de intempéries não se implantou porque o Ministério do Planejamento negou-lhe a liberação de R$ 115 milhões.
Informar sobre a recusa, na época, nem convinha a alguém do ministério em uma de suas tantas falas, nem convinha aos que hoje a denunciam e não quiseram, na ocasião apropriada, desagradar aos superiores. Ou seja, é o que uma sinceridade distraída resumiu, certa vez, ao custo do seu posto de ministro, na fórmula "o que é bom a gente divulga, o que é ruim a gente esconde".
A falastronice é inversamente proporcional à prática hoje mágica que leva o nome de transparência. Não há, por exemplo, implicação alguma para a segurança nacional e as relações internacionais no custo de um novo estaleiro militar, como na compra de tanques para o Exército, inclusive porque as Forças Armadas dos demais países têm outros acessos aos custos militares.
Em outro exemplo, as concorrências de obras públicas são antecedidas de incontáveis pronunciamentos procedentes dos governos, mas os editais da licitação são escondidos sob preços altos e com venda, muitas vezes, restrita a empresas do ramo em questão -e nos editais é que estaria a razão da transparência necessária. Depois se dá o mesmo com os reajustes que são a regra principal da engenharia civil brasileira, milagres da multiplicação produzidos em série. Os valores implícitos nesses exemplos simples não estão, jamais, no tanto que falam, e com tanta frequência, os participantes dos governos. A opacidade prevalece sobre a transparência.
Dilma Rousseff já advertira que confrontos de opinião devem manifestar-se no interior do governo, e não pelos meios de comunicação. A saída de Pedro Abramovay vem informar aos integrantes do governo que, dado falarem em razão dos cargos que tenham, o que digam deve guardar correspondência com conceituações, estudos e propósitos do governo, não cabendo gratuidade alguma.
Ninguém disse, mas é certo que, em todos no governo, o espanto com a exoneração de Pedro Abramovay já se traduziu em preocupação com cuidados para o que, o como e o quando falar aos gravadores e microfones tão atraentes e receptivos. Para os mais espertos, lição ainda maior, realçada pelo episódio Abramovay, é o pouco falar da própria presidente.
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