Impasses do BC
MIRIAM LEITÃO
O GLOBO - 09/12/10
O Copom manteve os juros, apesar de a inflação estar subindo, e isso tem dois motivos. Primeiro, porque o Banco Central já anunciou medidas que em si elevam os juros ao consumidor; segundo, porque hoje será anunciado o PIB do terceiro trimestre, e ele será o mais fraco do ano. As previsões dos bancos e consultorias oscilam entre 0,3% e 0,8%.
A MB Associados acha que o PIB crescerá 0,5% na comparação com o segundo trimestre, o que representa 7% em relação a 2009. Isso é uma leve desaceleração em relação ao primeiro e segundo trimestres, que subiram, respectivamente, 2,7% e 1,2% na comparação com o trimestre anterior (veja no gráfico). Muda pouco no ano. A previsão do PIB de 2010 foi revisada na MB de 8% para 7,7%.
Não é um esfriamento generalizado, mas serve de argumento para o BC adiar a alta dos juros. A indústria está descolada do resto da economia, com desempenho mais fraco. Foi o setor que mais caiu logo após a crise de 2008. O varejo caiu menos e retomou mais rápido o ritmo por causa das medidas de expansão do crédito. A indústria ficou sempre num ritmo menor (veja no gráfico).
Há um debate hoje sobre a tese de desindustrialização. Por causa do dólar baixo, fica mais barato importar do que produzir aqui. A MB acha que isso é verdade para os setores mais sensíveis como calçados, têxteis e vestuário.
Essa é uma das várias sinucas de bico que o governo Dilma herdará. Controlar o câmbio não é possível. A inflação subindo talvez torne inevitável subir juros, que derrubam mais ainda o dólar e aprofundam esse risco.
Newton Rosa, da SulAmérica Investimentos, prevê um PIB de 0,6% em relação ao segundo trimestre. Em parte, o descompasso entre o crescimento mais fraco da indústria em relação ao resto é, segundo ele, resultado do fato de que o setor exportador de manufaturados, de todos os tipos, desde aviões, automóveis, suco de laranja, está perdendo participação no total das exportações. A indústria sente o efeito do real mais valorizado e da redução da demanda mundial. A produção de manufaturados representa 30% da indústria. Ao mesmo tempo, a indústria também enfrenta a competição dos importados. Está perdendo nos mercados externo e interno. Em 2006, a participação dos manufaturados na exportação brasileira era de 50%, hoje, é de 39%.
Mesmo assim, a tese de que o país está se desindustrializando tem mais adeptos nas associações que defendem a indústria do que entre economistas do mercado financeiro.
Rosa acha que a redução do ritmo da indústria é causada pela retirada dos estímulos fiscais de automóveis e eletrodomésticos. A importação está tendo efeito complementar na oferta de produtos dentro do Brasil. Sem o dólar baixo e a importação, a inflação estaria mais alta.
Segundo a MB, o IPCA deve fechar o ano em 5,8%. Para 2011, a projeção é de 5,3%. Por isso, há previsões no mercado de que a Selic chegará a 12,75% no ano que vem.
O saldo da balança comercial deve cair para meros US$3 bilhões no ano que vem. As importações crescem 32%, mas as exportações também vão crescer 22% em valor. O déficit em conta corrente deve bater US$70 bi este ano e US$76 bi em 2011, cerca de 3,7% do PIB. Outro resultado do dólar baixo.
A inflação foi causada pelo choque dos alimentos, provocado pelas quebras de safras mas também pela alta dos preços internacionais das commodities. Essa alta ajuda o Brasil no fechamento das contas externas.
Mas há outros fatores. No IPCA, em julho, 48,7% dos itens subiram, em outubro, a taxa foi para 64,8%. É o que eles chamam de índice de difusão, que mostra se a inflação está concentrada ou disseminada.
A inflação de serviços, acumulada em 12 meses, já está em 7,5%. Ela reflete principalmente a melhora da renda e das condições do mercado de trabalho. Quer dizer que uma manicure, um cabeleireiro, a empregada doméstica, enfim, todos que trabalham fornecendo um serviço, estão conseguindo aumentar o preço do seu trabalho porque a demanda está forte. Esse profissional percebe que os preços dos alimentos nos supermercados estão mais caros, que ele tem perda da renda, e para compensar isso aumenta o preço do seu serviço. Como as famílias estão com mais dinheiro, ele não perde clientes.
A inflação para 2011 já está ao redor de 5%, ou seja, pelas normas do regime de metas de inflação o Banco Central já deveria ter começado a subir juros. Mas ele preferiu apertar o crédito para que as vendas a prazo fiquem mais caras.
Alexandre Maia, da Gap Asset, prevê alta de 0,4% no PIB no terceiro trimestre, exatamente pelo ritmo menor da indústria, que está abaixo do nível de março. Mesmo assim, o uso da capacidade de produção, o NUCI, está num nível historicamente alto.
Para 2011, todos preveem um PIB menor, por volta de 4,5%. É o fim dos estímulos e a previsão de que o BC tentará segurar a inflação subindo juros e esfriando a economia.
A dúvida é sobre se essa alta será mesmo possível no governo Dilma. A inflação está subindo, mas os juros altos aprofundam algumas distorções da economia.
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