domingo, setembro 05, 2010

VERISSIMO

A paradinha
VERISSIMO

O GLOBO - 05/09/10

Um dos grandes mistérios do Universo é a sua simples existência. De acordo com a física, ele não poderia existir. Quando matéria e anti-matéria se chocam, como aconteceu no grande pum que começou tudo, uma teria que aniquilar a outra. Mas isto não aconteceu, para grande perplexidade dos físicos. A explosão inaugural criou a mesma quantidade de matéria e de anti-matéria mas a matéria prevaleceu, venceu a maioria dos seus embates com a anti-matéria e formou o Universo como nós o conhecemos. Paradoxo: a prova de que a teoria dos físicos sobre a inevitável aniquilação mútua das partículas e das anti-partículas estava certa seria a não-existência do Universo, mas sem o Universo como os físicos iriam abrir champanhe e comemorar?
Agora parece que o pessoal descobriu uma explicação para essa assimetria até agora inexplicável, mas sem diminuir o mistério. Se entendi bem – o que eu duvido – no choque entre matéria e anti-matéria a matéria leva uma vantagem, que tanto pode ser uma partícula ainda por descobrir para a qual a anti-matéria não tem equivalente e que garante a sua sobrevida, quanto um milissegundo de tempo a mais para se estabelecer enquanto a anti-matéria desaparece, ou vai formar um anti-Universo paralelo e nunca mais é vista. Quer dizer, depois do choque há uma paradinha que favorece a matéria. Como se esta tivesse um juiz ao seu lado que lhe permitisse jogar com doze ou não apitasse o fim do jogo antes dela fazer seu gol da vitória. Pense nisso: você, sua tia Gigi e as montanhas do Himalaia podem dever sua existência a uma hesitação.
A metáfora do juiz a favor pode sugerir divagações filosóficas e, inevitavelmente, religiosas. O que ou quem é esse juiz que decide pela existência do Universo em vez do nada? Se é para haver uma intervenção divina então este é o momento para ela se manifestar. Pode-se imaginar Deus coçando a barba diante da escolha: matéria (um Universo com todas as suas chateações, a exigir a sua interferência constante) ou a paz do vazio? E pensando: se eu não queria confusão, por que, para começar, provoquei a grande explosão? E decidindo: que vença a matéria, e que ela forme mundos, e vamos ver no que vai dar.

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