Filosofando
Manoel Carlos
REVISTA VEJA
Quem me acompanha por aqui talvez se lembre deste nome: Edgar. Eu o mencionei algumas vezes nesta última página de VEJA RIO. Trata-se de um conhecido meu, de São Paulo, que vez ou outra eu encontro no Rio, mas que nunca chegou a ser meu amigo. O que faz o Edgar? Pensa e conversa. E agora — pelo que me contou — também escreve.
Com 56 anos, solteirão profissional, com dois ou três filhos que reconheceu, mas com os quais jamais conviveu, Edgar passa a vida a namorar e a viajar. Neste momento está em Nova York, onde o encontramos — minha mulher e eu — na costumeira visita que fazemos à Catedral de Saint Patrick sempre que estamos por lá. Como a Bety acha o Edgar um tanto pretensioso e cansativo, ela tratou logo de entrar numa loja próxima, ficando de voltar em meia hora ao café, onde eu e ele ocupamos uma mesa e pedimos um cappuccino.
E foi aí então que Edgar me contou estar terminando um livro de reflexões que vem fazendo no correr da vida. E foi ele mesmo que afirmou:
— Gosto de filosofar. Reflito sobre o que vejo, ouço e sinto. E vou anotando aqui.
E me mostrou um pequeno caderno com as páginas quadriculadas, de capa escura, em que se lia, em letras de fôrma, caprichadas, o título da obra: Filosofando.
— São todas reflexões baseadas nas minhas observações sobre as mulheres — concluiu ele.
Por mais que eu quisesse, por gentileza, demonstrar interesse, não pedi para ler o que ali estava escrito, e o caderno ficou na mesa do café, ao lado de alguns livros que eu comprara na Barnes & Noble. Menos de meia hora depois, Edgar olhou o relógio e levantou-se apressado para ir a um encontro. Conferimos nossos números de celular, marcamos um jantar para o fim de semana, e lá se foi ele, 5ª Avenida acima. Quase que imediatamente, a Bety voltou e só então eu vi, ao lado dos meus livros, o caderno do Edgar sobre a mesa, ali esquecido.
— Vai dar pela falta e vai ligar — ponderou minha mulher.
— Marquei um jantar para sexta-feira. Aí devolvo.
— Tenho mesmo de ir?
— Faça o sacrifício. Ele quer nos apresentar a nova namorada e falar sobre esse livro que está escrevendo.
E voltamos para casa.
À noite, já deitado, abri o caderno e li alto, para a Bety, algumas reflexões do Edgar, entre as mais de 500 que aparecem escritas. Reflexões, como ele mesmo disse, feitas com a experiência que a vida lhe deu no trato com as mulheres. Passo aos leitores algumas delas, entre as publicáveis, já que muitas não poderiam estar numa revista respeitável como esta. Leiam:
- Mulher feia é mais asseada do que mulher bonita.
- Prefira as loiras. Não por serem mais burras, mas por serem menos exigentes do que as morenas.
- As gordas são mais sinceras no amor.
- Uma mulher só está madura quando assume suas estrias.
- Nem plástica, nem dieta. O que mais rejuvenesce uma mulher é a viuvez.
- Uma mulher de vestido é mais sensual. Só perde para uma que, além de vestido, use óculos.
- Uma mulher que fale num outro idioma é sempre mais atraente.
- As mulheres italianas são as mais criativas nas relações amorosas.
- Melhor do que casar por dinheiro é casar por dinheiro e por amor. Mas raramente esses dois interesses aparecem juntos.
- A única maneira segura de não se cansar de uma mulher é não viver com ela.
Paro por aqui, assim como minha mulher me fez parar de ler para ela.
— Nunca ouvi nada tão idiota — disse ela. — Eu, se fosse você, jogaria esse caderno no lixo e diria não ter encontrado nada na mesa do café.
Mas não segui sua sugestão. No dia seguinte, Edgar me ligou, nós nos encontramos e eu lhe devolvi o caderno.
— Leu?
— Não tive tempo. Vou esperar para ler quando sair o livro.
— E a Bety?
— Passou os olhos — menti eu.
— E...?
Falei a verdade:
— Cancelou o nosso jantar.
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