Tristeza
FOLHA DE SÃO PAULO - 11/04/10
O Rio, uma cidade alegre, barulhenta e em tecnicolor, de repente ficou em preto e branco, deserta
COMO TERIA DITO Rubem Braga, ai de ti Rio de Janeiro, e mais: ai de ti, Estado do Rio. Foi horrível. A chuva castigou, e aconteceram momentos surreais: a lagoa ficou marrom e transbordou, alguns gaiatos foram vistos andando nos pedalinhos em forma de cisne nas ruas alagadas em volta da lagoa, e em um clube no mesmo local uma TV flagrou vários peixes nadando.
Detalhe: dentro de uma sala, entre mesas e cadeiras. O Rio, uma cidade escandalosamente alegre, barulhenta e em tecnicolor, de repente ficou em preto e branco, deserta, silenciosa e triste, uma desolação. O comércio quase todo fechou, restaurantes e cafés também, quem não tinha comida em casa não comeu. Além de toda essa desgraça, ainda tivemos outra: ver na TV, entre os noticiários, chamadas para um programa onde o entrevistado seria o general Newton Cruz, pior que um filme de terror classe C. O que é aquilo?
O Estado não tem tido sorte com seus governantes. Por duas vezes tivemos Brizola, que sempre foi melhor político do que administrador, e a partir daí, foi a tragédia total: Moreira Franco, Marcelo Alencar, Garotinho, Benedita e Rosinha. E de quem é a culpa? As opiniões divergem: uns dizem que ninguém pode adivinhar que vai chover muito, portanto, ninguém é culpado. Já outros acham que a culpa é do governo, que não se preveniu. Aliás, que governo?
Estadual ou municipal? Alguns culpam a população, que joga o lixo nas ruas, e o lixo entope os boeiros. Já, já vai aparecer uma campanha de publicidade caríssima, para ensinar o povo a não sujar a cidade. Já houve uma, em que o personagem se chamava Sigismundo, alguém lembra? E daí? Daí, nada.
A ausência mais notada foi a do governador Sergio Cabral, que se comportou exatamente como na tragédia de Angra, na passagem do ano: sumiu. Numa entrevista, disse que quem mais sofre são os pobres, que moram em áreas de risco, e que as autoridades devem ter firmeza de agir e não permitir que isso aconteça; se esqueceu de que a "autoridade" é ele, que teve um mandato quase inteiro para resolver esses problemas e não fez rigorosamente nada.
Já o prefeito Eduardo Paes -de jaqueta cáqui, seguindo a moda do seu líder, Cesar Maia- aproveitou para marcar presença no vácuo deixado pelo governador e pediu R$ 390 milhões ao governo federal para obras. Como é que se faz essa conta?
O presidente Lula, que chegou ao Rio no dia da chuva para inaugurar uma obra do PAC, não inaugurou, mas assegurou que o Rio está perfeitamente preparado para receber a Copa e a Olimpíada, "com muita tranquilidade". Em uma cerimônia, pediu um minuto de silêncio pelos mortos na tragédia, e levou um minuto olhando para o relógio, contando o tempo. Dilma Rousseff também esteve no Rio no mesmo dia, para encontrar Garotinho; Dilma, coitada, não sabe nem o que faz nem o que diz. Depois de ter tirado fotos no Carnaval com o filho de Madonna no colo, foi fotografada com Garotinho, isso depois de depositar flores no túmulo de Tancredo Neves.
Se oriente, d. Dilma. Em compensação, o morro Dona Marta está se colorindo, com algumas casas já pintadas; quem passa jura que é uma cidade cenográfica. Uma boa medida para que os mais favorecidos possam pensar -mesmo sabendo que não é verdade- que a felicidade é viver numa favela.
Esses é que deveriam pagar pela pintura das casas, cuja visão alivia seu sentimento de culpa em relação aos mais pobres. Que coisa trágica é a política.
Detalhe: dentro de uma sala, entre mesas e cadeiras. O Rio, uma cidade escandalosamente alegre, barulhenta e em tecnicolor, de repente ficou em preto e branco, deserta, silenciosa e triste, uma desolação. O comércio quase todo fechou, restaurantes e cafés também, quem não tinha comida em casa não comeu. Além de toda essa desgraça, ainda tivemos outra: ver na TV, entre os noticiários, chamadas para um programa onde o entrevistado seria o general Newton Cruz, pior que um filme de terror classe C. O que é aquilo?
O Estado não tem tido sorte com seus governantes. Por duas vezes tivemos Brizola, que sempre foi melhor político do que administrador, e a partir daí, foi a tragédia total: Moreira Franco, Marcelo Alencar, Garotinho, Benedita e Rosinha. E de quem é a culpa? As opiniões divergem: uns dizem que ninguém pode adivinhar que vai chover muito, portanto, ninguém é culpado. Já outros acham que a culpa é do governo, que não se preveniu. Aliás, que governo?
Estadual ou municipal? Alguns culpam a população, que joga o lixo nas ruas, e o lixo entope os boeiros. Já, já vai aparecer uma campanha de publicidade caríssima, para ensinar o povo a não sujar a cidade. Já houve uma, em que o personagem se chamava Sigismundo, alguém lembra? E daí? Daí, nada.
A ausência mais notada foi a do governador Sergio Cabral, que se comportou exatamente como na tragédia de Angra, na passagem do ano: sumiu. Numa entrevista, disse que quem mais sofre são os pobres, que moram em áreas de risco, e que as autoridades devem ter firmeza de agir e não permitir que isso aconteça; se esqueceu de que a "autoridade" é ele, que teve um mandato quase inteiro para resolver esses problemas e não fez rigorosamente nada.
Já o prefeito Eduardo Paes -de jaqueta cáqui, seguindo a moda do seu líder, Cesar Maia- aproveitou para marcar presença no vácuo deixado pelo governador e pediu R$ 390 milhões ao governo federal para obras. Como é que se faz essa conta?
O presidente Lula, que chegou ao Rio no dia da chuva para inaugurar uma obra do PAC, não inaugurou, mas assegurou que o Rio está perfeitamente preparado para receber a Copa e a Olimpíada, "com muita tranquilidade". Em uma cerimônia, pediu um minuto de silêncio pelos mortos na tragédia, e levou um minuto olhando para o relógio, contando o tempo. Dilma Rousseff também esteve no Rio no mesmo dia, para encontrar Garotinho; Dilma, coitada, não sabe nem o que faz nem o que diz. Depois de ter tirado fotos no Carnaval com o filho de Madonna no colo, foi fotografada com Garotinho, isso depois de depositar flores no túmulo de Tancredo Neves.
Se oriente, d. Dilma. Em compensação, o morro Dona Marta está se colorindo, com algumas casas já pintadas; quem passa jura que é uma cidade cenográfica. Uma boa medida para que os mais favorecidos possam pensar -mesmo sabendo que não é verdade- que a felicidade é viver numa favela.
Esses é que deveriam pagar pela pintura das casas, cuja visão alivia seu sentimento de culpa em relação aos mais pobres. Que coisa trágica é a política.
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