A entrevista de José Sérgio Gabrielli ao Estado ("PSDB teria vendido a Petrobrás", 25 de dezembro de 2009, página B1) marca a volta triunfante à cena política do presidente da Petrobrás depois do estrangulamento governista da CPI do Senado que deveria ter investigado a gestão do petista na companhia (http://www.estadao.com.br/estadaodehoje/20091225/not_imp486802,0.php).
Poupado de qualquer questionamento sobre as graves suspeitas de irregularidades que motivaram a instalação da CPI e de outras perguntas "inconvenientes", Gabrielli ficou à vontade para usar e abusar das meias-verdades e absolutas mentiras com que os petistas costumam fantasiar seus supostos êxitos e a "herança maldita" do governo anterior.
É preciso reconhecer, sem nenhum favor, que ele se superou nesse mister. O atestado de "idoneidade" que ganhou do próprio líder do governo, senador Romero Jucá, no relatório final da CPI, talvez tenha subido à cabeça do principal responsável direto pela transformação da maior empresa do Brasil em comitê político do PT e aliados. Se não fosse a intervenção providencial do presidente Lula - por intermédio de seu fiel escudeiro Gabrielli, subentende-se -, a Petrobrás "teria investimento e crescimento menores do que teve. Provavelmente teria menos preocupação com o controle nacional, portanto, teria menos impacto no estímulo da indústria brasileira."
Começando pelos resultados, que são o que interessa ao País: ao contrário do que sugere Gabrielli, a produção de petróleo da Petrobrás cresceu muito menos no governo Lula do que no governo FHC. Foram meros 3% ao ano, em média, desde 2003, ante 10% ao ano entre 1995 e 2002. O que cresceu mais no governo Lula foi o faturamento da empresa, por causa do boom dos preços internacionais do petróleo. Somente por isso. Foi esse aumento extraordinário da receita da companhia, provocado pelo aumento dos preços promovido pelos sheiks árabes, que encobriu os efeitos da péssima gestão petista.
A Petrobrás entrou na rota do crescimento acelerado a partir da vigência da Lei do Petróleo de 1997 e da reorganização interna que preparou a companhia para atuar num ambiente de competição. Isso sem que o Estado brasileiro tivesse de abrir mão do controle do ritmo de exploração das reservas de petróleo, das receitas respectivas, nem do fortalecimento dos outros elos da cadeia produtiva do petróleo com os instrumentos previstos na lei.
A Petrobrás que chegou ao pré-sal foi aquela que saiu das reformas de 1997. Sua profissionalização, não o seu aparelhamento político, a transformou numa multinacional brasileira bem-sucedida - uma das gigantes da indústria petrolífera, na vanguarda tecnológica de exploração de petróleo em águas profundas. Cabe reconhecer dois feitos espetaculares da gestão petista da Petrobrás: o quadro de pessoal saltou de 45 mil empregados efetivos e 100 mil terceirizados em 2002 para 85 mil efetivos e 300 mil terceirizados em 2008; e os negócios obscuros sangram o enorme caixa da companhia - números sobre produção e pessoal da Petrobrás citados por Luiz Paulo V. Lucas na reportagem PSDB busca agenda para oposição a Lula (Estado, 23/2/2009, http://www.estadao.com.br/estadaodehoje/20090223/not_imp328581,0.php).
Entregue a pressões e manipulações políticas de todo tipo, a Petrobrás petista conseguiu o prodígio de entrar em dificuldades financeiras com o preço do petróleo nas nuvens, em 2008. Dizem que o melhor negócio do mundo é uma empresa petrolífera bem administrada e o segundo melhor, uma empresa petrolífera mal administrada. A administração encabeçada por Gabrielli garantiu um lugar à parte nessa escala de (in)competência, ao colocar uma empresa do porte da Petrobrás na UTI das manobras tributárias e injeções de dinheiro de bancos oficiais. Algo nunca antes registrado na história deste país e, possivelmente, do mundo.
É de uma desfaçatez sem limite que Gabrielli, com essa folha de serviços, se arvore em defensor da Petrobrás contra o fantasma muito invocado e nunca materializado de uma suposta ameaça de privatização. Das ameaças reais ao caixa, à eficiência e à capacidade de expansão da empresa os atuais responsáveis, incluindo Gabrielli, livraram-se de prestar contas à CPI. Não deixarão de responder por isso ao Tribunal de Contas da União, que já apontou graves irregularidades em contratos da companhia com fornecedores, e ao Ministério Público Federal, ao qual o PSDB encaminhou 18 pedidos fundamentados de investigação.
Quem privatiza a Petrobrás por vias tortas, de forma desavergonhada, é o próprio Gabrielli e os apaniguados de seu partido. São eles que confundem uma empresa de economia mista com o fundo do quintal da sua organização político-negocial. São eles que usam as verbas de patrocínio da companhia como uma espécie de orçamento paralelo, livre do crivo do Congresso, no melhor estilo da estatal petrolífera venezuelana nas mãos de Hugo Chávez. Foram eles, aliás, que entregaram o patrimônio nacional a estrangeiros sem um gesto de defesa no vergonhoso episódio da expropriação da refinaria da Petrobrás na Bolívia. Tudo isso e muito mais sob os olhos cegos ou cúmplices da ministra Dilma Rousseff, presidente do conselho de administração da companhia.
Gabrielli falou como alguém que de fato é: um instrumento de um projeto de poder que pretende substituir a direção das estatais pelo partido, o comando dos fundos de pensão pelo partido, os Ministérios pelo partido, a sociedade pelo partido...
Os que, como nós, realmente valorizam a Petrobrás querem-na sob o controle do povo brasileiro, não sob o controle do partido que a explora.
A Petrobrás precisa ser reestatizada: precisa sair da esfera do controle privado petista para ser devolvida à Nação brasileira.
João Almeida, geólogo, é deputado federal (PSDB-BA), líder eleito da bancada do partido em 2010
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