Razão e sensibilidade
O ESTADO DE SÃO PAULO - 07/01/10
Uma das coisas que se faz no Brasil à moda antiga é a política, quanto a isso há evidências de sobra. Independentemente das modernidades introduzidas pelo departamento de propaganda, especialmente em campanhas eleitorais, os meios e os modos são de uma obsolescência à prova de marqueteiros.
Uma dessas normas antiquadas é a crença de que, quanto mais distante de ocorrências negativas o político estiver, melhor para sua imagem. É sob essa regra que muitos governantes escolhem manter distância de certos infortúnios a fim de não se associar à adversidade.
É comum que presidentes da República evitem comentários a respeito de determinados assuntos ou acontecimentos desfavoráveis para não "levar a crise para dentro do palácio". Nada mais retrógrado e tolo, embora suas excelências considerem esse tipo de atitude a quintessência da esperteza.
E a esperteza, reza um dogma também do tempo do onça, quando é demais vira bicho e engole o dono.
O silêncio, portanto, nem sempre é de ouro, ainda mais nesses tempos de comunicação instantânea e cobrança ininterrupta por informações.
O presidente Luiz Inácio da Silva, quando candidato à reeleição, preferiu se ausentar do debate da TV Globo para não ser cobrado pelo adversário a respeito dos escândalos do primeiro mandato e do caso dos aloprados (compra de dossiê contra o candidato ao governo de São Paulo, José Serra) e pagou o preço do segundo turno.
Antes, na crise do caos aéreo, calou-se a maior parte do tempo e só falou, atrasado, diga-se, quando houve o acidente da TAM que não tinha ligação direta com a revolta dos controladores de voo, mas ficou irremediavelmente colado à crise.
A tentativa de blindagem de Dilma Rousseff no apagão do ano passado resultou na produção de 24 horas de performance desastrosa do ministro Edison Lobão. Quem pagou a conta, o PMDB? Dilma e o governo.
Em 1996, quando a polícia do Pará matou sem-terra em Eldorado de Carajás, o presidente Fernando Henrique Cardoso ficou em Brasília, seu ministro da Justiça, Nelson Jobim, só apareceu no cenário da tragédia dias depois porque o então governador paraense, o tucano Almir Gabriel, não queria "intervenção" em seu território.
Nacional e internacionalmente, o débito em forma de desgaste ficou com o governo federal.
Argumentava-se no governo que "não adiantava" FH aparecer, poderia denotar demagogia. Exatamente o mesmo argumento usado agora pelo governador Sérgio Cabral Filho para justificar sua ausência de Angra dos Reis, onde mais de 50 pessoas morreram por conta de desabamentos na virada do ano.
Já bater uma bola com o presidente da República em favelas, ciceronear Madonna para cima e para baixo, animar inaugurações de obras inexistentes não parecem ao governador do Rio - nem a qualquer outra autoridade - atitudes demagógicas.
É o conflito do uso da razão em proveito próprio e o abandono da sensibilidade quando em jogo está o próximo.
Exposição de motivos
A FAB explicou em 30 mil páginas de relatório as razões pelas quais dá preferência à compra dos caças suecos para a renovação de sua frota, deixando as propostas americana e francesa em segundo e terceiro lugar, respectivamente.
O presidente Lula, a quem cabe a palavra final, segundo o chanceler Celso Amorim, porque a decisão "é política", só disse até agora que "quer porque quer" os Rafale franceses.
Não tem tu
O batalhão avançado do PSDB nacional encarregado de convencer o deputado Fernando Gabeira a concorrer ao governo do Rio de Janeiro já informou ao governador José Serra que é melhor dizer adeus à esperança.
Sendo assim, o partido decidiu que no Rio não adianta disputar, embora seja preciso participar para garantir tempo de televisão. Há quatro nomes na parada: os deputados Marcelo Itagiba, Otávio Leite e Índio da Costa ou a vereadora Andréia Gouvêa Vieira.
Se houver mudança de planos, corre por fora a hipótese César Maia.
Como quem tem vários pré-candidatos na realidade não tem nenhum, em matéria de eleição estadual o PSDB está para o Rio como o PT está para São Paulo, onde há seis possibilidades de candidaturas.
Dique de contenção
O presidente Lula havia dito ao deputado Ciro Gomes que em fevereiro os dois conversariam para definir o destino de Ciro: candidato a presidente ou ao governo de São Paulo.
A data mudou. O campo governista prefere que o deputado segure seu lugar nas pesquisas nacionais até o último prazo legal possível, por achar que se ele se retirar José Serra pode ganhar pontos.
Ainda que sejam poucos, qualquer movimento ascendente do adversário pode ter um efeito decente sobre o ânimo dos potenciais partidos aliados. Notadamente o PMDB.
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