O GLOBO - 30/11/09
Pouco importa o que venha a fazer o governador José Roberto Arruda (DEM), do Distrito Federal.
Pode ficar no cargo para evitar o risco de ser preso.
Pode pedir licença. Se renunciar ao mandato, tanto pior. Mas uma coisa é certa: o plano de se reeleger foi engolido pelo mensalão embolsado por ele e sua turma. Não tem pão? Vá comer panetone.
Esse, sim, é um mensalão digno de ser encarado como tal e tratado com deferência.
Perto do mensalão de Arruda, o do PT denunciado pelo ex-deputado Roberto Jefferson (PTB-RJ) não passou de um mensalinho. É razoável supor que o mensalão do PT movimentou mais grana.
Ocorre que ele era federal. O novo mensalão é distrital. De resto, vista de longe, Brasília se limita à Esplanada dos Ministérios.
É por isso que a maioria dos brasileiros não dá bola para o que se passa dentro das quatro linhas da política brasiliense. A imprensa de fora, só raramente — embora muitos dos seus jornalistas vivam aqui. Esqueça a imprensa local. O DNA dela é governista. No último sábado, por exemplo, os dois principais jornais da cidade operaram o prodígio de noticiar o mensalão de Arruda livrando a cara de... De quem mesmo? De Arruda.
A imagem inaugural do mensalão do PT foi aquela do funcionário da empresa Correios & Telégrafos recebendo uma gorjeta de R$ 3 mil. A do mensalão do DEM foi a do governador recebendo uma gorda quantia de dinheiro. A gorjeta foi paga por um ex-bicheiro interessado em fazer negócios com os Correios. O dinheiro foi entregue a Arruda pelo seu secretário de Relações Institucionais, Durval Barbosa.
Não há um único depoimento que incrimine Lula ou o vice-presidente José Alencar na denúncia aceita pelo Supremo Tribunal Federal (STF) contra os mensaleiros do PT. Fita de vídeo ou de áudio que flagre mensaleiros de alto coturno discutindo a partilha do "fazme rir"? Não existe. Mesmo contra o ex-ministro José Dirceu, apontado como chefe da "organização criminosa", há poucos indícios de fato consistentes.
Arruda também foi filmado conversando com Durval e com o chefe da Casa Civil do governo sobre a necessidade de unificar a forma de pagamento de propinas a secretários de estado e deputados distritais. E outra vez foi filmado ouvindo Durval explicar que 40% do dinheiro arrecadado junto a quatro empresas da área de informática caberiam a ele, Arruda, 30% ao vice-governador Paulo Octavio e o resto ao demais beneficiados.
Há pontos em comum entre os dois mensalões. Primeiro: o dinheiro serviu para facilitar a aprovação, na Câmara dos Deputados e na Câmara Legislativa do Distrito Federal, de projetos dos governos Lula e Arruda.
Segundo: os presidentes de ambas as Câmaras participaram do esquema.
Terceiro: Lula chamou seu mensalão de Caixa 2. Arruda chamou o dele de ação meritória para a compra de panetones destinados a saciar a fome dos pobres.
Sempre se poderá dizer que os mensaleiros do PT demonstraram mais esperteza.
Deixaram menos rastros capazes de mandá-los para a cadeia. Os mensaleiros distritais foram confiantes demais, relapsos demais e acreditaram em excesso que escapariam impunes.
Produziram o mais bem documentado escândalo da história política recente do país. Coisa de deixar Delúbio Soares, ex-tesoureiro do PT, de queixo caído.
Os mensaleiros do PT tentaram se apossar da máquina do Estado, segundo a denúncia acolhida pelo STF.
Os mensaleiros de Brasília, não — a máquina do estado é deles desde que Joaquim Roriz chegou ao poder pela primeira vez. Ele governou quatro vezes. Em 2006, ajudou seu ex-pupilo Arruda a se eleger. Arruda herdou de Roriz parte dos seus auxiliares.
Durval foi um. Afinal, por que mexer em time que estava ganhando? O calendário gregoriano nada tem a ver com o calendário político. A se levar em conta o primeiro, o governo Arruda acabaria no dia 31 de dezembro de 2010. Com base no segundo, o governo acabou na semana passada.
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