No terreno da galhofa
Nada menos educativo e mais impreciso que a comparação de nefastos conchavos políticos a rodadas festivas de fatias de pizza. Dizer que isso ou aquilo “acaba em pizza”, além de lugar comum de significado gasto e péssimo gosto, não faz jus à dimensão da questão em si: a impunidade com ares de celebração da esperteza e de suposta tradução da alma brasileira.
Daí o valor pedagógico da reação das entidades que representam os pizzaiolos profissionais, pela primeira vez na longa trajetória de consolidação da medonha metáfora, contra o paralelo entre a atividade deles e o exercício da desfaçatez, principalmente por parte de agentes públicos.
E que não se atribua ao presidente Luiz Inácio da Silva agora essa culpa. Ele apenas seguiu o padrão do desafio proposto: “Vai haver pizza temperada com pré-sal no Senado?” Sem parar para pensar, como é de seu hábito, o presidente como todo mundo assistiu ao último conchavo que deu a Renan Calheiros o direito de continuar no Senado e ainda voltar a comandar uma tropa de fiéis soldados e não teve dúvida: confirmou a possibilidade e lembrou que os senadores são “bons pizzaiolos”.
Suas excelências reagiram no mesmo diapasão e, indignadas, responderam em uníssono que pode ser resumido a algo como “pizzaiolo é quem me diz”. E a partir daí estava a República a discutir onde se produz a melhor pizza na capital federal: no Planalto ou no Congresso. Com direito a pedido oficial de voto de censura ao presidente da República que passa a fazer companhia a outras solicitações semelhantes, tal como o repúdio a Hugo Chávez por ter chamado o Senado brasileiro de “papagaio” de George W. Bush.
Pois precisou a Confederação Nacional dos Trabalhadores em Turismo e Hospitalidade e o Sindicato dos Trabalhadores de Hotéis, Bares, Restaurantes e Similares protocolarem um pedido oficial de desculpas do presidente Lula e do senador Cristovam Buarque, para que se expusesse o ridículo da coisa.
Cristovam discursou “profundamente ofendido” de ser chamado de pizzaiolo e os pizzaiolos ficaram ainda mais indignados por terem sido comparados aos senadores. Segundo a nota da entidade, os dois, o presidente e o senador, “cometeram um grave erro” que, se não for reparado, será motivo de convocação de uma assembleia da categoria para discutir “as medidas a serem tomadas”.
Afinal, pontua o ofício, “nós temos obrigação moral e constitucional de defender a nossa classe”. Até a noite de sexta-feira, Lula e Cristovam ainda não haviam tomado uma posição a respeito e o presidente do sindicato esperava pedido público de escusas antes de decidir o “próximo passo”. Uma comédia, não fosse uma tragédia.
Vai ou racha
O apelo à “conciliação” entre as forças políticas, feito pelo presidente da Câmara, Michel Temer, como forma de resolver a crise do Senado, apazigua, mas não soluciona. A crise nas proporções atuais é resultado exatamente do longo período de vigência do excesso da complacência coletiva e da vocação apaziguadora do Congresso.
Sem ruptura radical com o passado, ainda que com regras de transição negociadas, o Parlamento continuará a andar em descompasso com a sociedade. Fecha um capítulo agora, mas não dá um desfecho para a história.
Tortuosas
Quando o deputado Ciro Gomes diz que se Aécio Neves for candidato do PSDB isso “descomprime gravemente a necessidade estratégica” de ele disputar a Presidência da República, entende-se que Ciro entraria no embate com a função de bater em José Serra.
Sendo um aliado do presidente Lula, a “necessidade estratégica” atenderia aos ditames do campo governista. Logo, depreende-se que, com Aécio candidato, o governo não veria necessidade de contar com um combatente tão aguerrido. Ou Ciro estaria querendo dizer que, no caso, seria um aliado do candidato da oposição?
Ou, por outra, estaria afirmando que há chance de aceitar a sugestão do presidente Lula e disputar o governo de São Paulo com Serra, que, desistindo da Presidência, concorreria à reeleição? Se para Ciro Gomes a batalha presidencial já seria complicada concorrendo com o PT e o PSDB, a disputa com Serra no terreno do adversário que além de tudo é governador seria – para efeito de análise de possibilidades – uma guerra perdida.
Contas
De olho comprido na vaga de vice na chapa da ministra Dilma Rousseff, a cúpula do PMDB torce para Ciro Gomes concorrer ao governo de São Paulo e faz contas otimistas. Diz que ele sozinho teria algo em torno de 12% dos votos. Com mais outros tantos na casa dos dois dígitos garantidos pelo eleitorado fiel ao PT, já seria garantia certa de segundo turno.
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