sábado, abril 11, 2009

VILLAS-BÔAS CORRÊA

Ninguém se entende no Congresso

COISAS DA POLÍTICA

JORNAL DO BRASIL - 11/04/09

A impressão de quem acompanha, seja por dever profissional ou até por mera curiosidade, a atividade ou inatividade das duas Casas do Congresso é que um vendaval varreu o senso de responsabilidade dos parlamentares. E um clima de bagunça, de desrespeito, do vale-tudo não apenas ameaça a estabilidade do mais democrático dos poderes mas está levando o desapreço da população ao risco de uma rejeição nas eleições de 2010, com um recorde vexaminoso de votos em branco, já que a urna eletrônica não registra xingamentos.

Não é preciso castigar a memória para juntar o lixo de uma semana. A anunciada reforma dos apartamentos funcionais dos deputados, que acordou o súbito interesse da Mesa da Câmara com o patriótico empenho de economizar alguns reais da Viúva, caiu na vala da patuscada. Mas o alvissareiro anúncio de que o quarto-secretário, deputado Nelson Marquezelli (PTB-SP), decidira reformar todos os apartamentos nos próximos dois anos, muitos em estado deplorável, ao custo calculado de R$ 150 milhões, despertou a pulga atrás da orelha. Feitas as contas, a badalada economia não passaria dos R$ 3 mil mensais do chamado auxílio moradia, uma gorjeta no baile das mordomias, vantagens, verba indenizatória, passagens aéreas semanais, tudo o que arredonda um dos melhores empregos do mundo.

O entusiasmado quarto-secretário arredonda as contas. Parte dos apartamentos de quatro quartos seria dividida em dois de dois quartos, suficiente para uma família média, elevando de 432 para 528 o número dos disponíveis.

Por enquanto, a reforma continuará em estudo. Mas, como é difícil endireitar o pau que nasce torto, a croniqueta gaiata dos apartamentos dos parlamentares abandonados ao tempo começa com a mudança da capital para Brasília inacabada, um canteiro de obras, pela ambição do presidente Juscelino Kubitschek de bisar o mandato em 1965.

A compreensível resistência dos condenados a mudar com a família para o cerrado levou o governo a improvisar soluções as mais diversas para atender os reclamantes. Ministros ganharam mansões às margens do Lago Paranoá, parlamentares foram premiados com as passagens aéreas para o fim de semana nas suas bases eleitorais na inauguração simbólica do festival das mordomias, vantagens, verba indenizatória, assessores especiais e os demais enfeites.

Os apartamentos mobiliados não despertaram a paixão dos parlamentares pelos encantos da nova capital. E depois, com o auxílio moradia de R$ 3 mil mensais, o deputado sempre leva as suas vantagens. O auxílio moradia não é mordido pelo Imposto de Renda e, bem administrado, dá lucro. São duas ou três diárias de hotel de padrão médio por semana. Portanto, antes de fechar as contas, a reforma de R$ 76 milhões dos 432 apartamentos aguardará a sua vez na fila.

Outro escândalo de nível médio revelou novidades nos hábitos parlamentares. Desta vez, no Senado. O desatento senador Tião Viana (PT-AC) emprestou o seu celular – um mimo da Casa aos seus 81 senadores, que também pagam a conta do celular – à filha que viajou, em janeiro, ao México. A conta da saudade filial chegou a R$ 14.758, 07, paga pelo Senado. Com a denúncia pela imprensa, o senador Tião Viana prontificou-se a ressarcir o Senado.

Ficam sem resposta duas curiosidades: por que os senadores são premiados com telefones celulares pela Mesa do Senado? E, qual a justificativa para as contas pagas?

Ora, com tais antecedentes e suas atualizações, a surpreendente aprovação pela Comissão de Constituição e Justiça do Senado, do parecer do senador Pedro Simon (PMDB-RS) que pode inviabilizar a renovação de concessões de rádios e TV que tenham parlamentares entre os seus proprietários, deve morrer na praia. A Constituição proíbe que senadores e deputados sejam "proprietários, controladores ou diretores de empresa que goze de favor decorrente de contato com pessoa jurídica de direito público, ou nela exercer função remunerada".

O parecer do senador Pedro Simon proíbe a renovação das concessões de emissoras de rádio e TV que tenham parlamentares como proprietários. Cerca de 20 senadores e 50 deputados estariam incluídos na relação. Nenhum precisa perder um minuto de sono.

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