O climão geral lembra a versão inglesa de O sole mio, na voz do falecido Elvis Presley: Tomorrow will be too late, it?s now or never, my love won?t wait (amanhã será tarde demais, é agora ou nunca, meu amor não irá esperar). Parece tudo tão premente e inadiável a ponto de sugerir que bastará um comunicado algo desamarrado, como tantos que têm sido armados pelos senhores do mundo, para ser interpretado como senha para nova temporada de pânico nos mercados.
Mas quem acompanhou as manifestações ao longo dos preparativos desta reunião de chefes de Estado do Grupo dos 20 (G-20), que se realiza hoje em Londres, não pode esperar por sucesso absoluto pela simples razão de que cada canto do mundo quer uma coisa.
Não falta densidade para o G-20. Ele corresponde a 90% do PIB e 80% do comércio global. Mas as diferenças começam pelas divergências de foco.
Os americanos, por exemplo, entendem que não é hora de reconstruir a casa em ruínas, mas de continuar a apagar o incêndio. É por isso que advertem que, neste momento, os governos têm de despejar dinheiro para suprir a trombose do crédito.
Os europeus acham que já há dinheiro demais nas praças e que agora os esforços terão de se concentrar na regulamentação do mercado financeiro para que o desastre não se repita. Mas, nesse pleito, enfiam projetos que nada têm a ver com a crise, como a desativação dos paraísos fiscais ou o corte do salário dos executivos dos bancos.
Se não for por aí, disse há dois dias o presidente da França, Nicolas Sarkozy, melhor nem ir a Londres. Mas o fato é que ele vai beijar a cruz que lhe for apresentada. E alguns países emergentes querem mais recursos para o Fundo Monetário Internacional, desde que não venham acompanhados das exigências de praxe.
Também proliferam ataques de última hora a toda sorte de protecionismos. É o tipo do trololó oportunista que vai na contramão do "buy American", que viceja sob os auspícios do governo Obama, ou do "British jobs for British workers", que o primeiro-ministro inglês, Gordon Brown, não faz questão de desestimular.
Também pouco sincera é a indignação contra o protecionismo financeiro que se espalha pela Europa e pretende impedir que bancos locais emprestem recursos para outros países ou empresas estrangeiras, especialmente se forem do Leste Europeu.
O principal comentarista econômico do mundo, Martin Wolf, do Financial Times, há semanas vem anunciando o fracasso desta reunião de cúpula. Para ele, o essencial não está sendo atacado e o essencial é o desequilíbrio estrutural do sistema global, que produz as bolhas financeiras e seu estouro. Trata-se do mesmo desequilíbrio que gerou a simbiose econômica ou a mútua dependência entre Estados Unidos e China, um como gastador de bens e importador de poupança; o outro como fornecedor de bens e exportador de poupança. Mas, convenhamos, conserto para esse nível de problema não poderá provir de um encontro de algumas horas entre chefes de Estado. É coisa que requer longa maturação.
A acolhida mais provável para o evento de hoje é uma saraivada de críticas. Mas daí a concluir que o efeito imediato inevitável será nova onda de pânico é ir longe demais. Até o amor pode esperar um pouco mais.
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