domingo, fevereiro 22, 2009

JOSIAS DE SOUZA

Inquérito da PF liga Sarney a ‘desvios’ da Gautama

FOLHA ONLINE

  Folha
Pendurada nas manchetes em maio de 2007, a “Operação Navalha” agora só aparece no noticiário de raro em raro.

 

Mas, em silêncio, a investigação prossegue. A Polícia Federal continua empilhando provas contra Zuleido Veras (foto), o dono da Gautama.

 

Zuleido, você deve se lembrar, comandava um esquema que fraudava obras públicas. O pedaço ainda inédito do inquérito reúne documentos de arrepiar.

 

Num trecho do processo, o sobrenome Sarney irrompe com incômoda fluidez.

 

Os detalhes foram trazidos à luz em reportagem de Otávio Cabral e Diego Escosteguy, de cujo trabalho as informações relatadas aqui foram extraídas.

 

Entre as obras esquadrinhadas pela PF está a ampliação do aeroporto de Macapá (AP). Foi licitada pela Infraero no final de 2004, depois de um pedido de José Sarney a Lula.

 

Eleito senador pelo Amapá, o maranhense Sarney tem em Macapá, a capital do Estado, seu principal reduto eleitoral.

 

Natural, portanto, que se empenhasse para dotar a cidade de um aeroporto mais bem aparelhado. O inusitado veio a seguir.

 

A Gautama, construtora de Zuleido, sagrou-se vitoriosa na licitação da Infraero. Um certame fraudado, a PF acusa.

 

O contrato embute, de acordo com a polícia, um superfaturamento de R$ 50 milhões. A PF colecionou provas que permitiram farejar o rateio do butim.

 

Há no inquérito, por exemplo: comprovantes de depósitos bancários, gravações de diálogos telefônicos e planilhas de pagamento de propina.

 

Numa das planilhas, recolhida em batida policial na casa de Zuleido, anotou-se a derrama de R$ 500 mil em campanhas eleitorais do Amapá.

 

A PF suspeita que o rateio tenha sido feito sob orientação de José Sarney, identificado na planilha de Zuleido com a sigla “PR” (presidente).

 

Há mais: a polícia informa que um personagem identificado como José Ricardo, lobista da Gautama, chegava mesmo a despachar no gabinete do senador Sarney.

 

Há pior: segundo a PF, um dos encarregados de cobrar os óbulos da Gautama era Ernane Sarney. Vem a ser irmão do atual presidente do Senado.

 

Ernane Sarney figura no inquérito como beneficiário de um depósito de R$ 30 mil de Zuleido. Não é só.

 

A voz do irmão do senador Sarney soa num dos diálogos captados por grampos telefônicos realizados pela PF.

 

A conversa é de abril de 2007. Ernane Sarney falava ao telefone com tesoureiro da Gautama. Ele pediu dinheiro:

 

“Vocês estão me enrolando. Já não estava tudo na mão? Eu tô com a corda no pescoço aqui, rapaz, o doutor também tá com a corda no pescoço", queixa-se o irmão de Sarney.

 

Há também nas páginas do inquérito comprovantes de depósitos para assessores de outros três senadores do PMDB:

 

Renan Calheiros (AL), líder da legenda; Valdir Raupp (RO), ex-líder; e Roseana Sarney (MA), líder de Lula no Congresso.

 

Há também, segundo a PF, anotações que açulam a suspeita de que Romero Jucá (PMDB-RR), líder de Lula no Senado, foi beneficiário de repasses monetários da Gautama.

 

A reportagem de Otávio Cabral e Diego Escosteguy chega nas pegadas da entrevista em que Jarbas Vasconcelos (PMDB-PE) dissera, há uma semana, coisas assim:

 

1. "Boa parte do PMDB quer mesmo é corrupção";

 

2. "A maioria de seus quadros se move por manipulação de licitações e contratações dirigidas";

 

3. O PMDB é "uma confederação de líderes regionais, cada um com seu interesse, sendo que mais de 90% deles praticam o clientelismo, de olho principalmente nos cargos";

 

4. José Sarney "vai transformar o Senado em um grande Maranhão";

 

5. Renan Calheiros "não tem nenhuma condição moral ou política para ser senador, quanto mais líder do partido".

 

Sacudido pelas palavras de Jarbas, a Executiva do PMDB soltou uma nota curiosa. No texto, o partido informa que não daria “maior atenção” à entrevista de Jarbas.

 

Classificou as declarações de um mero “desabafo”. Alegou que, “em razão da generalidade das alegações”, não havia o que fazer.

 

Querendo fazer algo, o PMDB pode recorrer à influência que exerce sobre o governo Lula para compulsar as páginas do inquérito da PF.

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