segunda-feira, fevereiro 09, 2009

E AGORA, TARSO?


REVISTA ISTO É

Novo candidato a refugiado

Pierluigi Bragaglia, italiano, acusado de assassinato e outros crimes políticos, luta contra extradição. Só que ele era neofascista. E agora, Tarso?

Alan Rodrigues

Nos próximos dias, o Supremo Tribunal Federal (STF) decidirá sobre uma solicitação da Corte de Roma que pede pela extradição de outro cidadão italiano que nos anos 1980 pegou em armas e tomou de assalto as ruas do seu país bradando por mudanças políticas. Trata-se de Pierluigi Bragaglia, 49 anos, um exterrorista que fugiu da Itália, em 1982, condenado a 12 anos de prisão por subversão, assalto, roubo a bancos e associação a grupo armado. Procurado há mais de duas décadas pela Interpol pelos quatro cantos do planeta, Bragaglia foi encontrado pela Polícia Federal (PF) em julho do ano passado vivendo em Ilhabela, litoral paulista, distante 210 quilômetros da capital. Casado, pai de dois filhos, o ex-militante vivia com a identidade falsa e ganhava a vida como proprietário de uma pousada e uma distribuidora de bebidas na cidade. Há sete meses no cárcere, Bragaglia terá seu futuro definido pelo ministro do STF Cezar Peluso, o mesmo togado que decidirá o caso de Cesare Battisti.

A justificativa italiana para o pedido de extradição de Bragaglia fundamenta-se nas mesmas argumentações do caso Battisti, ou seja, ele é um ex-terrorista e como criminoso político, julgado e condenado em seu país, deverá voltar para pagar sua pena. O caso de Bragaglia, que poderá chegar às mãos do ministro da Justiça, Tarso Genro, tem ingredientes que poderão elevar a temperatura dos debates no Brasil e no Exterior por um único detalhe: ao contrário de seu conterrâneo esquerdista, Bragaglia foi um árduo integrante da direita italiana; um neofascista de verdade. Ex-militante do NAR (Núcleo Armado Revolucionário), o mais radical grupo da extrema direita italiana que atuou entre 1977 e 1981, Bragaglia e seu agrupamento inspiravam- se no criador do fascismo, Benito Mussollini (1883-1945). A organização em quatro anos foi responsável por ações que resultaram em 128 mortes. Em depoimento de mais de quatro horas à PF, ele confirma a participação em diversos crimes políticos, mas nega o envolvimento com qualquer “crime de sangue”. Assustado, Bragaglia tem medo de que a repercussão do caso Battisti reflita negativamente em seu julgamento.

Nascido rico em Roma, em 1960, ele abraçou a militância política ainda muito jovem rebelando-se contra a ordem econômica e social e o Estado. O ex-militante neofascista admitiu no interrogatório que lutou pela reconstituição do partido fascista na Itália, disse que participou dos assaltos ao Banco di Roma – ação que rendeu aos cofres da organização clandestina 56 milhões de liras – e à Embaixada da Arábia Saudita, operação na qual seu grupo roubou armas e munições para o arsenal guerrilheiro. Bragaglia nega que esteve presente à ação que matou dois “carabinieri” em Roma, em 1981, conforme acusação da Interpol. Ele nega também que seja um terrorista. “Apenas participei de um grupo de extrema direita”, disse. Mas admitiu aos policiais brasileiros que, de fato, aos 17 anos, empunhava armas em assaltos para arrecadar fundos para a organização. “Cometi os crimes por causa das circunstâncias políticas da época, motivado por razões ideológicas”, disse. Nos quatro anos de atuação do NAR, a organização foi responsável por ações que resultaram em 33 mortos, sem contar o atentado contra a estação de trem de Bologna, em 1980, que deixou 85 mortos e mais de 200 feridos. O NAR tinha estreitas ligações com diversas organizações criminosas. Em maio de 1985, um tribunal condenou 53 integrantes do grupo por atividades terroristas.

Em 1982, diante do cerco montado pela polícia na caça aos terroristas, Bragaglia, segundo ele mesmo, “com medo de morrer”, fugiu da Itália para a Venezuela. De pois de dois anos, descobriu que estava sendo monitorado pelo serviço secreto italiano, fugiu para o Brasil com documentos falsos e desembarcou em São Paulo como o venezuelano Paolo Luigi Rossini Lugo. Alternando a vida clan destina entre a capital e o litoral paulista, em 1986, o italiano fixou-se definitivamente no litoral como recepcionista de um camping. Logo depois, Bragaglia se casou com a paulista Salete e reiniciou a vida clandestina como um pequeno empresário do turismo. Pacato cidadão, tido na ilha como um bom vizinho, Bragaglia não resistiu à prisão no dia 3 de julho, quando almoçava em uma padaria.

Durante três meses, os policiais italianos monitoraram os telefones da mãe de Bragaglia, Lílian Kosmac, e conseguiram localizá-lo. “Não foi fácil encontrá-lo, pois a única foto dele existente tinha mais de 25 anos”, conta um dos policiais que participaram da operação e pede anonimato. Na prisão, Bragaglia tem dito a amigos que está muito preocupado com seu futuro, diante da proporção que tomou o caso Battisti. “Quero que meu caso seja analisado tecnicamente pela Justiça”, diz aos interlocutores na cadeia. A estratégia de seus advogados é provar que os crimes estão todos prescritos. “Há crimes que ele cometeu quando ainda era menor de 18 anos e que a lei brasileira não permite punição”, argumenta seu advogado, Roberto Barroso. Como o ministro da Justiça, Tarso Genro, afirmou que concedeu asilo a Battisti por questões técnicas, os advogados de Bragaglia esperam o mesmo tratamento, caso entrem com pedido de asilo político para seu cliente. E agora, Tarso?

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