Seria Dilma, seja a austera senhora de antes ou da vaidosa dama de agora, a idealizadora de um plano que fracassou? Será ela a capitã do navio petista rumo a um projeto fadado ao naufrágio?
Temos aí o caso da ministra Dilma Rousseff. Cortou e pintou os cabelos, renovou a pele do rosto, esticou as rugas, tirou os óculos. Diz-se que é o semblante da candidatura presidencial. Os especialistas em propaganda política, chamados a depor, divergiram quanto ao resultado. Mas o debate necessário é bem outro. Que terá o Brasil para exigir de uma mulher postulante ao mais alto cargo público disponível a mudança fundamental, transcendente e irresistível do primeiro olhar?
Respondo: nada tem o Brasil de errado. Como toda nação civilizada, o país dá sinais de estar pronto para se deixar governar por uma mulher. Pelo menos a candidatura da ministra é cozida sem dissabores, sabotagens ou pilhérias. Está no jogo e sua presença é reconhecida como legítima. Tenha ela a imagem da austera senhora de antes ou da vaidosa dama de agora.
O que há de errado, nobre senhor, bela senhora, são as muitas contradições que o PT e a própria Dilma carregam. Essas sim, são rugas cavadas pelo tempo como todas as outras, mas para as quais não existe plástica possível.
O partido já não esconde o espanto por ter se apequenado em relação a Luiz Inácio Lula da Silva. Uso o termo no sentido estrito, de que um tornou-se politicamente maior, mais relevante do que o outro. O presidente governa — de forma bem-sucedida, registre-se — com atos que retoricamente condenava quando militante partidário. Deve ser duro para ele. Mas pior ainda para o PT, ainda hoje defensor de ideias estapafúrdias, sobretudo quanto à política econômica.
Nessa seara, Dilma é uma espécie de prisioneira. É dela a tese de um grande plano de obras para impulsionar o crescimento econômico tanto no curto quanto no longo prazos, pedra-de-toque do segundo mandato petista. O pilar sobre o qual se ergue a ideia ruiu em outubro do ano passado — era, posto, a abundância de capitais pelo mundo, capaz de financiá-la com sobras até o estouro da represa financeira internacional.
A alicerçar-lhe, tanto a personagem quanto seu argumento, persiste a crença num Estado forte, interventor, potente. E lá se vão outros senões. A ação estatal prescinde de dinheiro. Quão maiores elas forem, mais lhe é custoso. Ora, o Estado se financia da população, cobrando-lhe impostos. Se ele deve ter a configuração imaginada pela candidata, tenha ela expressão jovial ou bigode japonês, maior precisa ser a carga de tributos apeada no lombo da nação. Que nem uma lágrima verteria se marchasse sobre o bálsamo do crescimento econômico. Só que também isso sumiu com a crise.
Além disso, é bom lembrar, foi da mão dela que partiu a primeira pedra atirada no então ministro da Fazenda, Antônio Palocci. E o alvo não era a moral do adversário, suas mentiras, farras nem o sigilo do caseiro. Mas a política de infalível rigidez fiscal que ministrava — a mesma que curiosamente produzia as bases do crescimento responsável pelas gordas taxas de aprovação do presidente da República.
A dama-de-ferro, mal comparando, talhou com o bisturi a de suas velhas ideias a bela face que se exibia orgulhosa na grande economia.
E na política… Seria Dilma, portanto, a idealizadora de um plano que fracassou? Será ela a capitã do navio petista rumo a um projeto fadado ao naufrágio, já que todo o cenário em que ele foi construído mudou radicalmente?
Não se pode dizer com certeza que sim. Afinal, se as perspectivas viraram tão rapidamente para um lado, é possível que o façam com a mesma velocidade no sentido contrário, o que traria tudo ao curso normal, digamos assim.
Mas uma coisa é certa: a mera existência da dúvida inflama a política, tanto dentro, quanto fora do PT.
Dilma é filiada ao partido, mas não se pode dizer que seja uma liderança partidária. Era, na verdade, do PDT. A transição é bem mais recente do que gostariam muitos dos petistas mais antigos. Daí nutrem-se os opositores de sua candidatura presidencial no âmbito interno.
Por outro lado, se a economia não estiver se locomovendo a plenos pulmões, como fez até setembro passado, a probabilidade de sucesso do candidato oficial será sensivelmente menor em 2010. Os partidos aliados sabem disso. E todo brasileiro, vivo ou morto, também sabe que é a expectativa de poder o agente aglutinador de 90% das alianças política no país. Portanto, a ministra estará sozinha se o PAC não puser o Brasil onde ela prometeu que estaria.
E no PAC, a exemplo das ideias da ministra, ainda não dá para fazer cirurgia plástica. |
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