Lula perdeu o rumo na reta final
Vá lá que a sentença pessimista peque pelo exagero. Mas não tanto que invalide a especulação sobre as possíveis saídas do presidente para encontrar o caminho limpo e o apoio popular nos altos índices ascendentes das pesquisas, dos sucessos da política econômica com mais R$ 300 bilhões de dólares nas arcas do Tesouro, sob a sovina vigilância do presidente do Banco Central, Henrique Meirelles.
Na contramão, a bagunça na casa das mordomias, das mutretas do pior Congresso desde a queda do Estado Novo, viciado em levar vantagem na negociação do voto e que não dá segurança e tranqüilidade ao governo, mesmo com o alto preço da barganha de ministérios, autarquias, cargos de confiança, controle de obras de milhões de reais, desperdiçados na angústia da necessidade para adquirir o apoio e o voto das legendas que ornamentam o leviano bloco majoritário.
Por falta de experiência, de apreço pelo jogo parlamentar, Lula cometeu erros que passaram despercebidos no período de bonança e hoje mais atrapalham do que ajudam. Certamente, o presidente não precisaria espichar o atrito com o presidente do Senado, Garibaldi Alves, no final do mandato, com a teimosia de abusar das medidas provisórias para trancar a pauta das votações e disputar com o Supremo Tribunal Federal (STF) o controle dos votos e o direito de legislar atropelando o Legislativo. E era tal a segurança do presidente de que talvez não elegesse um poste, mas faria seu sucessor com uma candidatura feita em casa, que lançou numa seqüência de discursos, entrevistas e conversas com jornalistas a candidatura da chefe da Casa Civil, ministra Dilma Rousseff, com 8% na pesquisa divulgada no blog do prefeito Cesar Maia. Os resmungos dos frustrados do PT, que são muitos e com cacife, que sequer sustentam as pretensões a uma vereança municipal.
A ministra-candidata conquistou espaço no Palácio do Planalto e anexos. Um tanto sem jeito, procurou domar o seu temperamento, clarear com sorriso o rosto sempre sério e com a habilidade no manejo do esquema de publicidade oficial operou a mágica de, até agora, espaçar as pesquisas e manter o nome da candidata do presidente fora das listas de aspirantes. Alguns percentuais que furaram o cerco mereceram duas linhas de registros em colunas, e os sinos não bimbalharam. Um dígito não enche o bojo de um candidato a mandato majoritário, de prefeito a presidente.
Mas, sem concorrente em casa, com a oposição a brincar de pique entre as candidaturas do favorito, o governador José Serra, de São Paulo, e o obstinado Aécio Neves, governador de Minas, Lula decidiu apresentar a candidata ao eleitorado, incluindo-a em todas as suas viagens de um campeão de milhagens aéreas no Brasil e no exterior. Com o crachá de responsável pelo Projeto de Aceleração do Crescimento, o PAC de verbas milionárias e obras nas áreas carentes, alem de planos mais ambiciosos de recuperar a malha rodoviária em pandarecos, os portos abandonados nos seis anos dos dois mandatos.
Ora, tanto esforço, empenho, discursos, entrevistas, viagens pelo mundo foi de ladeira abaixo nas enxurradas que castigaram Santa Catarina, Espírito Santo e estado do Rio, com o horror de uma das maiores, senão a maior tragédia da nossa crônica de desleixo com a natureza, de omissão dos governos diante da ocupação de áreas de risco, com casas e favelas equilibradas em morros ou na beira dos rios que costumam inundar amplas áreas nos temporais de anos de enchentes, com mortos, desabrigados, casas destruídas e os milhares de famintos que tudo perderam, menos a vida e não sabem por onde recomeçar.
Lula não se omitiu, demorou a avaliar a dimensão da calamidade. De lá para cá, a corrente da solidariedade da população lota centenas de caminhões com a doação de roupa, calçado, cobertores e sacos de alimento, e complementa a gigantesca mobilização oficial de todo tipo de socorro. A sucessão saiu da primeira página dos jornais, da capa das revistas, do destaque dos noticiários das redes de TV. A ministra-candidata espera a hora de voltar ao palco. Seu lugar continua inabalável na cotação palaciana.
Mas, até que a água escoe, comece o mutirão para a construção de milhares de residências, se normalize o tráfego nas rodovias e na malha ferroviária e os portos retomem parte da rotina, a ministra-candidata terá que esperar.
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