terça-feira, dezembro 09, 2008

LULA FALA DEMAIS


 Vinicius Torres Freire
Folha de S. Paulo - 09/12/2008
 

Lula faz política econômica no grito, arruma confusão inútil com o BC e não apresenta plano anticrise organizado

O PESSOAL do Banco Central está tenso. Já estava tenso com os relatos que ouviu de Henrique Meirelles a respeito de reuniões da cúpula do governo. Ficou ainda mais nervoso com os discursos de Lula, que dos palanques diz que as taxas de juros são inaceitáveis. Um diretor do BC chegou a dizer que ia embora. Outro ficou mais tiririca após ler coluna de Kennedy Alencar, colega da 
Folha, publicada domingo na Folha Online
O suco do que Alencar escreveu é o seguinte: "Lula estuda agora uma eventual interferência política pública e assumida para forçar uma queda da taxa básica de juros caso o BC insista em manter os juros no atual patamar ou não sinalize que vai baixar a taxa no ano que vem". 
O pessoal do Planalto, pois, está animado com a possibilidade de dar um xeque no BC. Mas faz seis anos que Lula recorre ao truque de se fazer de vítima desentendida do BC, repetido a cada semana prévia às reuniões do Copom. Mas a chorumela luliana não foi de todo sem conseqüências e, desta vez, está em tom acima do queixume habitual. 
No início de Lula 2, Meirelles, político esperto, aproveitou saídas voluntárias da diretoria do BC para formar equipe um pouco menos divergente das idéias da Fazenda. A atual direção do BC é mais discreta e menos carne de pescoço que a de Lula 1. Ainda assim, é o que a cúpula do PT chama de "último bastião da ortodoxia" no governo, opinião reiterada e trombeteada na reunião da tendência majoritária do partido, encerrada domingo. 
Nesta temporada pré-Copom, Lula fez mais pressão sobre bancos privados, via emissários, entre eles o próprio Meirelles. Coloca na parede os presidentes dos bancos estatais. Fez discursos cada vez mais irados contra juros. Sentiu o baque da crise próxima, os pátios cheios de carros, o tombo da indústria, as primeiras levas de demissões. Um assessor próximo diz que não via Lula tão irritado com a economia desde o tempo em que se frustrava o "espetáculo do crescimento". 
Mas Meirelles não pode torcer o pescoço de sua diretoria, com o que perderia credibilidade na praça. 
Lula daria um tiro no pé se pusesse Meirelles para fora, em meio a tal crise. Mas, segundo suas próprias idéias, o BC tem tantos motivos para cortar a Selic como na reunião do Copom de outubro: nenhum. O cenário econômico está muito turvado e incerto, inflação e expectativas não desandam mas não baixam, o dólar foi à estratosfera. 
Mas o ambiente mudou. A curva de juros de mercado levou um tombo de um mês para cá. Bancões dizem "aceitar" que a Selic caia em janeiro. Se o dólar não for da Lua a Marte, o ideal seria o BC não fazer nada agora e dar um talho significativo na Selic caso o PIB embique para baixo entre o fim de 2008 e o início de 2009. Agora, com a falação luliana, o caldo pode entornar. 
Lula poderia ter apresentado um plano coerente e organizado para o período de crise, encaixando o BC no programa e cobrando a fatura da Selic, mas atrás do pano. Poderia cumprir a promessa de palanque de cortar custeio, tomar medidas para dificultar a festa cambial do mercado, organizar com Estados o deslanche de obras mal paradas etc. Mas Lula gosta de falar.

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