Máquina do tempo
EDITORIAL
O Globo
19/8/2008
A identificação de áreas geologicamente promissoras nas camadas de pré-sal ao longo da costa paulista, fluminense e capixaba reacendeu a centelha do nacionalismo à moda da década de 50, sempre latente na esquerda brasileira. O brado de "o petróleo é nosso", lançado naquele tempo durante a campanha de criação da Petrobras, voltou a ser ouvido depois das descobertas. Repete-se o erro daquela época, quando o petróleo era "nosso", mas permaneceu durante quase uma geração debaixo da terra, até que o monopólio estatal fosse rompido, e capitais privados pudessem ajudar a Petrobras no esforço de exploração.
A medida deu tão certo que, além de o país se aproximar da auto-suficiência em petróleo - já comemorada pelo governo Lula, porém ainda não realizada na prática -, abriu-se essa nova fronteira de exploração. Em nome da qual alguns no governo querem fundar uma empresa 100% do Estado, sob o argumento falacioso de que, se a Petrobras for desbravar essa nova fronteira, "estrangeiros" acionistas da empresa se locupletarão.
Ora, qualquer acionista tem direito aos lucros gerados por um novo investimento rentável. É a regra do jogo nas economias de mercado. O acionista precisa ser remunerado pelo capital que empata na empresa. E é esse capital que ajuda a empresa a prosperar.
Se o problema é a União arrecadar para investir em educação - um ponto consensual na sociedade -, isso pode ser feito sem se alterar a Lei do Petróleo, apenas ampliando-se os royalties e as participações especiais previstas para campos de alta produção. Esta alternativa, a mais sensata, tem o mérito de não afugentar capitais privados, imprescindíveis para acelerar os trabalhos no pré-sal. Vende-se, ainda, a idéia tosca de que o povo brasileiro será surrupiado se não houver a tal empresa 100% estatal. Ora, é uma balela imaginar que estatais são "do povo". Na verdade, além de cabides de emprego à disposição da fisiologia política - o ministro peemedebista Edison Lobão é um dos defensores da estatal -, elas terminam nas mãos de corporações de funcionários, especialistas em usufruir dessas empresas benefícios generosos. Lembremo-nos de Roberto Campos, que, em artigos no GLOBO, provava que essas estatais "do povo" costumavam transferir mais dinheiro para seus fundos de pensão do que em dividendos para o Tesouro Nacional. Isso indica quem são os verdadeiros donos dessas organizações.
Se a idéia retrógrada vingar, o país voltará na máquina do tempo para a década de 50, decretando "nossa" uma riqueza que, por falta de meios para extraí-la, repousará longo tempo abaixo do Atlântico.
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