A vida é uma festa: Wassef e Ana Cristina, agora ex-mulher, andando de moto aquática no lago Paranoá, em Brasília. A empresa da ex tem contratos com o governo que chegam a R$ 250 milhões. Ela já foi condenada por improbidade e responde a processo por corrupção ativaImagem: Reprodução
Frederick Wassef, íntimo de Jair Bolsonaro e oportuno ex-advogado de Flávio — só foi destituído da função neste domingo — pode ter adquirido uma imprudência muito típica dos que pertencem ao círculo de influência dos poderosos, mas não é burro. Ele sabe que que mal nenhum lhe advirá por ter acoitado Fabrício Queiroz em uma propriedade sua em Atibaia. De fato, não havia ordem nenhuma de prisão contra o amigão dos Bolsonaros e das milícias. Ele não era um foragido. Nem réu é ainda. Não há crime nenhum em abrigá-lo. O problema não está aí, mas no que parece ser um círculo de amizades que pode ser chamado de explosivo. O UOL chegou primeiro ao que pode ser o paiol de pólvora da turma.
Reportagem publicada no domingo informa que Maria Cristina Boner Leo, ex-mulher de Wassef, sua amiga ainda hoje — os dois são sócios em outro empreendimento —, é dona de uma empresa que já faturou, neste ano e meio de governo Bolsonaro, em contratos com a administração federal e com estatais, a bolada de R$ 41,6 milhões. A Global Outsourcing trabalha há tempos com o governo federal. Na gestão anterior, Dilma-Temer, levou quatro anos para atingir valor parecido: R$ 42 milhões.
Segundo a apuração do Ministério Público de Contas, o valor pago na gestão Bolsonaro é, na verdade, maior: R$ 26.085.973,18 no exercício de 2019 e R$ 20.014.583,61 em 2020, totalizando R$ 46.100.556,79.
O total dos contratos chega a R$ 250 milhões. A desculpa de que as relações são antigas não cola. Contratos foram renovados no governo Bolsonaro com aditivos que somam R$ 165 milhões. E outros novos foram celebrados no valor de R$ 53 milhões. Um espetáculo!
Dado notável: a Global Outsourcing não está mais em nome de Maria Cristina. Quem responde agora pela empresa é Bruna Boner Leo Silva, sua filha, junto com sócios da empresária em outros empreendimentos. Ela já foi condenada por improbidade administrativa em primeira instância, mas recorreu da decisão.
Também é ré por corrupção ativa em processo que corre na 7ª Vara Criminal do Tribunal de Justiça do Distrito Federal relativo ao chamado mensalão do DEM — o escândalo que derrubou José Roberto Arruda, ex-governador do Distrito Federal. O MPF a acusa de 168 atos de corrupção e pede pena de 15 anos e dez meses de prisão, além de ressarcimento de R$ 43 milhões aos cofres públicos.
Maria Cristina e Wassef estão oficialmente separados, mas são muito próximos. No dia da prisão de Fabrício, por exemplo, o advogado estava em sua casa. A Global Outsourcing, claro!, repudia qualquer insinuação de privilégio.
AFINIDADES ELETIVAS
Já escrevi aqui sobre as afinidades eletivas da turma. Em 2015, o então deputado Jair Bolsonaro comprou uma Land Rover preta, blindada, modelo 2010, por anunciados R$ 50 mil, embora o valor de mercado, à época, fosse de R$ 77 mil. Quem vendeu? Uma empresa chamada a Compusoftware, que pertencia a Maria Cristina. O veículo foi posto à venda em abril do ano passado.
Bruna, a filha, tem o mesmo sangue empreendedor da mãe. É dona de uma outra empresa, a Dinamo Networks, que também conseguiu faturar um contrato com um órgão público — no caso, o Banco Central — no valor de R$ 1 milhão.
O enredo das afinidades não para por aí. Paulo Emílio Catta Preta, ex-advogado do miliciano Adriano Magalhães e que agora tem Fabrício em sua carteira de clientes, é amigo de Maria Cristina e a representa em dois de seus processos.
Lembra aquele poema de Carlos Drummond chamado Quadrilha: "João amava Teresa que amava Raimundo que amava Maria que amava Joaquim que amava Lili..."
No caso, o enredo é mais complexo: Bolsonaro comprou um carro de Maria Cristina, que era mulher de Wassef, que era advogado de Flávio, que empregava Fabrício, que contratou Catta Preta, que advogava para o miliciano Adriano, que tinha mãe e mulher lotadas no gabinete de Flávio, que tinha como advogado Wassef, que abrigava Fabrício, que é amigo de Bolsonaro.
Para continuar com Drummond, agora apareceu no meio do caminho dessa quadrilha junina uma montanha de dinheiro: R$ 46,1 milhões já desembolsados pelo governo e por estatais e um montante em contratos fabuloso: um quarto de bilhão de reais. Que se faça o levantamento: poucas empresas, creio, sozinhas, mantêm vínculos tão profícuos com o governo federal.
O subprocurador geral Lucas Rocha Furtado, do Ministério Público de Contas, entrou com uma representação junto ao Tribunal de Contas da União pedindo que se apure se Wassef teve alguma interferência na relação entre a Global Outsourcing e o governo. Na representação, ele discrimina a penca de contratos em vigência.
No "Quadrilha" de Drummond, um elemento chega de fora e desestrutura a cadeia de relações. Vamos ver nesse caso.
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