Carlos Zarlenga, presidente da GM na América do Sul, afirma que situação da economia brasileira e do setor automotivo tende a piorar
Para o presidente da General Motors (GM) na América do Sul, Carlos Zarlenga, a situação da economia brasileira e do setor ficou ruim, mas tende a piorar.
“Em abril, foram emplacados apenas 55 mil carros, quando se esperavam 230 mil. E, ainda assim, esses números são enganosos. Uma vez consumada a compra pelo consumidor, o processo de emplacamento leva entre 10 e 15 dias. Isso significa que boa parte dos emplacamentos de abril correspondeu a compras de semanas anteriores. Feitas as contas, a uma média de preço de US$ 13 mil por veículo, foram US$ 3 bilhões que sumiram.”
Zarlenga avisa que o impacto negativo sobre o caixa das montadoras, num momento em que ainda tinham de pagar seus fornecedores, empurrou o passivo do setor junto à rede bancária interna, que era de R$ 50 bilhões de acordo com levantamentos da Anfavea, para cerca de R$ 90 bilhões.
Essa queda brusca da demanda não deve ser vista como simples adiamento das compras pelo consumidor. A procura, argumenta ele, não vai voltar ao que era, porque aumentou o desemprego, o consumidor perdeu renda e patrimônio e há as incertezas que vão levá-lo a desistir de comprar um zero-quilômetro. Muitas empresas que compõem toda a rede do setor não terão condições de sobreviver e a inadimplência tende a aumentar. Mesmo se a vacina contra o vírus vier a ficar disponível mais rapidamente do que os técnicos afirmam, os desdobramentos da crise durarão de três a cinco anos. Não se deve esperar recuperação em V, como alguns economistas têm projetado.
Os investimentos engatilhados pelo setor pararam abruptamente, afirma Zarlenga. O ciclo para início de produção de um produto é de quatro anos. Ninguém pode agora arcar com compras de máquinas para os próximos dois ou três anos. A hora é de pagar as dívidas primeiro. Os lançamentos de produtos que estavam prontos têm de seguir, assim como não vai parar o desenvolvimento de tecnologias novas, como as de obtenção de baterias mais eficientes e as do carro autônomo. Mas o resto fica para quando der.
Em crises assim, alguns analistas entendem que estão criadas condições para uma mudança de paradigma que, possivelmente, começa a ser identificada a partir de certa atitude dos jovens, que já não cobiçam carros como antes. Mas Zarlenga não vê assim. Antes do coronavírus, a demanda de veículos pelas novas gerações era forte. O que muda, diz ele, é a enorme queda do poder aquisitivo dos jovens. Mas ele não vê, a partir daí, tendência de mudanças relevantes no paradigma de consumo.
Ao atual quadro de incertezas produzido pelo coronavírus é preciso acrescentar outra. A forte redução dos preços do petróleo não deve ser revertida tão cedo.
O carro elétrico é bem mais caro para o consumidor, e rodar em veículos movidos a derivados de petróleo ficou mais em conta. Isso obrigará a indústria a reexaminar os cronogramas de substituição da frota movida a combustíveis fósseis por carros elétricos. Mas, a esta altura da crise, ninguém tem segurança de longo prazo.
Nessas horas, todos olham para os governos em busca de socorro. Mas não convém esperar demais, adverte ele. Por toda parte, os governos, sejam eles quais forem, emergirão dessa crise com uma situação fiscal muito pior e não haverá alívio para todos.
Outra área que levanta preocupação é a da garantia de fornecimento de peças e insumos. Bastou o alastramento de um vírus para desarticular as redes globais de suprimentos em que o setor está inserido. “A integração com a China não está funcionando. Em parte, essas conexões poderão se refazer, mas ficou o problema da falta de segurança. Como a indústria lidará com isso ainda está para ser avaliado”, afirma.
E ele conclui: “O Brasil ainda tem enorme vantagem em relação a outros países, que é o tamanho do seu mercado. Mas o momento é de manter o foco na sobrevivência e avaliar a destruição de riqueza. É cedo para o resto”.
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