O presidente Jair Bolsonaro continua firme em sua campanha contra a realidade. O alvo da vez é o índice de desemprego medido pelo IBGE. Há uma semana, o IBGE informou que a taxa de desemprego no País havia subido para 12,4% no trimestre encerrado em fevereiro, atingindo 13,1 milhões de pessoas, um acréscimo de 892 mil em relação ao período anterior. A população fora da força de trabalho alcançou o recorde de 65,7 milhões de pessoas, e também bateu recorde a taxa de subutilização da força de trabalho, chegando a 24,6%. Há fatores sazonais, como o esfriamento dos negócios depois das festas de fim de ano. “A desocupação voltou a subir, mas não é a maior da série. Neste mesmo trimestre, a maior taxa foi de 13,2%, em 2017. Esperava-se que ela fosse subir, é um aumento que costuma acontecer no começo do ano”, comentou o coordenador de Trabalho e Rendimento do IBGE, Cimar Azeredo.
Essas ponderações, contudo, não foram levadas em conta por Bolsonaro, que demonstrou contrariedade com os dados do IBGE. Não à toa: noves fora os fatores sazonais, os números indicam que o desemprego continua muito alto, a despeito da crença bolsonarista de que o País está às portas de uma nova era de prosperidade.
“Com todo o respeito ao IBGE, essa metodologia, em que pese ser aplicada em outros países, não é a mais correta. (...) Tenho dito aqui, fui muito criticado, volto a repetir, não interessam as críticas. Tem de falar a verdade”, afirmou o presidente. Tentando demonstrar insuspeita familiaridade com a estatística, Bolsonaro seguiu adiante: “Como é feita hoje em dia a taxa? Leva-se em conta quem está procurando emprego. Quem não procura emprego não está desempregado. (...) Então, quando há uma pequena melhora (na economia), essas pessoas que não estavam procurando emprego passam a procurar, e quando procuram e não acham aumenta a taxa de desemprego”. Segundo o presidente, isso “não mede a realidade”. Não se sabe a que “realidade” ele estava se referindo, mas a única disponível no momento é a que indica uma projeção de crescimento do PIB inferior a 2% neste ano, mostrando uma recuperação bem abaixo das expectativas do governo, com previsível impacto negativo sobre o emprego.
Para Bolsonaro, contudo, se os números não refletem a melhora da economia decorrente de sua administração, então algo está errado – mas não com sua administração, e sim com os números. O presidente foi mais longe e lançou suspeitas sobre o próprio trabalho do IBGE, ao dizer que os indicadores de desemprego do instituto “parecem índices que são feitos para enganar a população”.
De uma só tacada, o presidente colocou em dúvida as estatísticas sobre o desemprego e a própria lisura do trabalho do IBGE, o órgão responsável pelas estatísticas oficiais sobre inflação, mercado de trabalho e demografia, entre outras. Afinal, ao dizer que os índices parecem “feitos para enganar a população”, Bolsonaro sugere que há uma conspiração no IBGE para prejudicar seu governo. Sendo assim, todos os outros números produzidos pelo IBGE seriam suspeitos, caso não agradem ao presidente.
Não é a primeira vez que Bolsonaro age assim. No ano passado, na condição de presidente eleito, ele chamou de “farsa” a estatística de desemprego que, segundo ele, considerava empregado quem estava desempregado – uma leitura obviamente equivocada da estatística. Seu objetivo era insinuar que o desemprego era maior do que o IBGE calculava. Ou seja, a depender do momento, a metodologia do IBGE, na opinião do presidente, erra para cima ou para baixo.
Nenhum presidente gosta de números oficiais que contrariam seu discurso. Há os que preferem simplesmente fechar os institutos responsáveis por coletar e interpretar os dados, como aconteceu na Argentina sob o governo dos Kirchners e na Venezuela sob a ditadura chavista. Espera-se que o presidente Bolsonaro, por mais aborrecido que esteja, se dedique a resolver os problemas apontados pelos indicadores, em vez de vituperar contra quem os produz.
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