Cúpulas do Congresso querem ter 'pauta própria' e colaborar com 'parte do governo'
A cúpula do Congresso, Câmara e Senado vai trabalhar para que se aprove alguma reforma da Previdência, além de outros assuntos de grande consenso na elite econômica e de repercussão popular. Quanto ao mais, o governo que se vire.
No final da semana, esse parecia o saldo do arranca-rabo, explicitado em conversas com lideranças que se resignavam com o fato de Jair Bolsonaro ser mesmo o que sempre pareceu.
Não haveria patrocínio de tentativas de sabotagem do governo, que, no entanto, vai colher o que plantar caso provoque a massa parlamentar.
A reforma da Previdência será de certa forma um projeto do Parlamento, um roteiro adaptado, baseado na história original elaborada pelo Ministério da Economia. Será lipoaspirada. As dificuldades de aprová-la talvez sejam até maiores, mas o projeto não será largado pela cúpula do Congresso, como em 2017.
O plano, enfim, é governar com uma parte do governo (sic), em especial em economia e segurança pública. Seria uma espécie de parlamentarismo aéreo, um governo paralelo, quem sabe um castelo no ar.
Pode dar certo? No Brasil recente, viu-se coisa parecida no desastre de José Sarney (1985-1990) e no estágio terminal de Fernando Collor e Dilma Rousseff, que não foram sujeitos a governo paralelo, mas apenas neutralizados ou sabotados. A comparação não ensina grande coisa.
O MDB desde o início podou Sarney, presidente acidental, sempre um estranho no ninho do próprio governo. Não foi eleito, sua administração virou pó a partir de 1987; o MDB era majoritário na Câmara e um partido que liderou a transição transada para a democracia. Outro planeta.
Os casos de Collor e Dilma são de troca de fusível queimado, goste-se ou não dos motivos da interrupção do circuito. Incinerar Bolsonaro não interessa, antes de mais nada porque assim também viraria cinza a possibilidade de haver tão cedo um projeto de recuperação econômica.
De resto, por ora não se nota por aí nenhuma intenção, por nenhum motivo, de colocar fogo na casa.
Isto posto, a questão permanece. Como pode funcionar um sistema em que o governo não tem maioria ou coordenação, em que o Parlamento se propõe a ter um plano próprio de governo e uma massa de uns 250 parlamentares parece perdida na terra do nunca da desarticulação política?
Esses 250, por aí, são a metade do Câmara que não está na oposição, não é do PSL e que não faz parte dessa cúpula que se imagina capaz de criar uma “pauta própria” para o Parlamento.
Caso persista o padrão pendular de loucura do governo, até a Semana Santa haveria nova crise, mas o problema não para aí.
Como o bolsonarismo vai reagir ao Congresso com “pauta própria”, com seus projetos pegando poeira em alguma comissão inerte?
Sim, a liderança do Congresso, da Câmara em particular, vai tentar aprovar projetos também de interesse ou iniciativa do governo. Ainda não há guerra sem trégua. Pode ser até que o governo Bolsonaro nem mesmo consiga mandar muito mais coisa relevante para o Parlamento, com o que haveria um armistício por falta de bala.
Mas é preciso lembrar também que o núcleo puro do bolsonarismo tem crenças messiânicas, fantásticas, autoritárias e ignorantes, de que pode fazer uma revolução moral e contornar a política, com a força do grito da massa nas redes insociáveis, quem sabe nas ruas. Pode ser que essa ambição morra por pura incompetência. Ou não.
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