O que o bandido faria quando, revistando aqueles que emparedava, encontrasse a pistola da policial e, de repente, até mesmo seu distintivo? Não seja cínico na resposta
Não integra a equação reativa de uma policial treinada — ademais mãe — se o criminoso, que aponta arma de fogo contra uma dezena de pessoas (inclusive crianças, entre as quais sua filha), é negro, amarelo, branco, cinza ou verde. Ponto final. Antepor filtros político-engajados a um cálculo de defesa imediato é doença; uma das patologias de nosso tempo, essa em decorrência da qual, em espetacular inversão de valores, uma policial que age em perfeito, estrito, cumprimento de seu dever profissional pode ser tratada, achincalhada, como assassina, promotora de uma tal faxina social contra pobres. Oi?
É preciso lembrar, em nome da distribuição de responsabilidades, que armas de fogo não disparam sozinhas — e que muitas vezes, oh!, são disparadas para o melhor. Contra a mentira permanente, é necessário escrever que: na mão de policiais, a grande maioria dos quais agentes públicos honestos, os tiros geralmente são para o melhor, contra criminosos armados e em defesa da sociedade mais desguarnecida, sobretudo daquela sua parcela pobre, oprimida pelo tráfico de drogas e por toda sorte de atividade criminosa relativizada, quando não badalada, por intelectuais da maconha e do pó cujo único chão pisado é o dos automóveis blindados.
É preciso dizer-lhes, aos oportunistas da penúria, que existe um mundo que não o do faz de conta, um em que as coisas ocorrem com violência e de repente, e onde as pessoas, aquelas desprovidas de seguranças particulares, vivem; um em que às vezes é preciso atirar, ou atirar primeiro — um em que as pessoas não gostam de armas tanto quanto sabem que, em situações extremas (às quais se habituaram como normalidade), só uma pistola, na mão precisa e preciosa de uma policial como Katia da Silva Sastre, representa alguma chance de integridade, talvez de sobrevivência.
Problematizar o fato de um sujeito — ademais policial — reagir a ataque de outro é expressão do longo processo de apagamento da consciência individual promovido, com sucesso, por grupos de pressão influentes dedicados à engenharia social e, pois, a políticas de segurança pública que exploram a miséria e criminalizam a pobreza; essas patotas pensadoras, mui infiltradas no jornalismo, segundo as quais o bandido é um homem bom, de natureza virtuosa, a quem, no entanto, tendo sido negada a cidadania, só restaria o crime.
Se há quem goste de ver um indivíduo baleado: é exceção desprezível. Alguém que se alegre com a morte alheia: desprezível exceção. Ninguém fica feliz em assistir ao vídeo em que a policial alveja o bandido. Não é essa a sensação. As imagens não causam prazer, bem ao contrário; mas, desmontando a mistificação que criminalizou a polícia como instituição, a ninguém pode ser interditada a percepção de que segurança pública também se faz no mundo real, conforme a ação da cabo Sastre.
Sim, o bandido morreu. A humanidade o preferia vivo, recuperando-se no hospital, preso em seguida. Pergunte-se, porém, sobre o ato deflagrador da reação: não carregava ostensivamente um revólver, que apontava contra adultos e crianças, colocando-se ele próprio em posição de risco, quando baleado? Que espécie de gente perverte a realidade a ponto de criminalizar a ação impecável da policial que reagiu ao ataque e interrompeu a investida do criminoso, sem quaisquer outras vítimas? Que atitude esses engenheiros sociais esperavam da cabo Sastre? Que, no calor da hora, em vez de no tórax, mirasse nos braços ou nas pernas, reduzindo a superfície para acerto tanto quanto aumentando a possibilidade de troca de tiros e — aí, sim — de uma tragédia? Ou, claro, que deixasse o bandido agir, para que, armado, fizesse, na mais generosa projeção, sua expropriação? Pensemos, assim, na melhor hipótese de desfecho — a mais provável: que fosse apenas um assaltante, com a única disposição de roubar. O que ele faria quando, revistando aqueles que emparedava, encontrasse a pistola da policial e, de repente, até mesmo seu distintivo? Não seja cínico na resposta.
Ainda que à paisana, Katia era ali uma militar, condição que (como a de mãe) se impõe 24 horas por dia, em pleno cumprimento de sua função pública: não a de matar bandidos, efeito colateral do confronto; mas a de proteger a sociedade contra bandidos. Não é uma heroína, mas alguém muito mais importante, curto-circuito na mente revolucionária: uma mulher, policial, profissional exemplar, que honra seu dever — que tem senso de dever — numa sociedade em que as pessoas são viciadas em direitos e propensas ao vitimismo. A cabo Sastre educa.
Carlos Andreazza é editor de livros
Não integra a equação reativa de uma policial treinada — ademais mãe — se o criminoso, que aponta arma de fogo contra uma dezena de pessoas (inclusive crianças, entre as quais sua filha), é negro, amarelo, branco, cinza ou verde. Ponto final. Antepor filtros político-engajados a um cálculo de defesa imediato é doença; uma das patologias de nosso tempo, essa em decorrência da qual, em espetacular inversão de valores, uma policial que age em perfeito, estrito, cumprimento de seu dever profissional pode ser tratada, achincalhada, como assassina, promotora de uma tal faxina social contra pobres. Oi?
É preciso lembrar, em nome da distribuição de responsabilidades, que armas de fogo não disparam sozinhas — e que muitas vezes, oh!, são disparadas para o melhor. Contra a mentira permanente, é necessário escrever que: na mão de policiais, a grande maioria dos quais agentes públicos honestos, os tiros geralmente são para o melhor, contra criminosos armados e em defesa da sociedade mais desguarnecida, sobretudo daquela sua parcela pobre, oprimida pelo tráfico de drogas e por toda sorte de atividade criminosa relativizada, quando não badalada, por intelectuais da maconha e do pó cujo único chão pisado é o dos automóveis blindados.
É preciso dizer-lhes, aos oportunistas da penúria, que existe um mundo que não o do faz de conta, um em que as coisas ocorrem com violência e de repente, e onde as pessoas, aquelas desprovidas de seguranças particulares, vivem; um em que às vezes é preciso atirar, ou atirar primeiro — um em que as pessoas não gostam de armas tanto quanto sabem que, em situações extremas (às quais se habituaram como normalidade), só uma pistola, na mão precisa e preciosa de uma policial como Katia da Silva Sastre, representa alguma chance de integridade, talvez de sobrevivência.
Problematizar o fato de um sujeito — ademais policial — reagir a ataque de outro é expressão do longo processo de apagamento da consciência individual promovido, com sucesso, por grupos de pressão influentes dedicados à engenharia social e, pois, a políticas de segurança pública que exploram a miséria e criminalizam a pobreza; essas patotas pensadoras, mui infiltradas no jornalismo, segundo as quais o bandido é um homem bom, de natureza virtuosa, a quem, no entanto, tendo sido negada a cidadania, só restaria o crime.
Se há quem goste de ver um indivíduo baleado: é exceção desprezível. Alguém que se alegre com a morte alheia: desprezível exceção. Ninguém fica feliz em assistir ao vídeo em que a policial alveja o bandido. Não é essa a sensação. As imagens não causam prazer, bem ao contrário; mas, desmontando a mistificação que criminalizou a polícia como instituição, a ninguém pode ser interditada a percepção de que segurança pública também se faz no mundo real, conforme a ação da cabo Sastre.
Sim, o bandido morreu. A humanidade o preferia vivo, recuperando-se no hospital, preso em seguida. Pergunte-se, porém, sobre o ato deflagrador da reação: não carregava ostensivamente um revólver, que apontava contra adultos e crianças, colocando-se ele próprio em posição de risco, quando baleado? Que espécie de gente perverte a realidade a ponto de criminalizar a ação impecável da policial que reagiu ao ataque e interrompeu a investida do criminoso, sem quaisquer outras vítimas? Que atitude esses engenheiros sociais esperavam da cabo Sastre? Que, no calor da hora, em vez de no tórax, mirasse nos braços ou nas pernas, reduzindo a superfície para acerto tanto quanto aumentando a possibilidade de troca de tiros e — aí, sim — de uma tragédia? Ou, claro, que deixasse o bandido agir, para que, armado, fizesse, na mais generosa projeção, sua expropriação? Pensemos, assim, na melhor hipótese de desfecho — a mais provável: que fosse apenas um assaltante, com a única disposição de roubar. O que ele faria quando, revistando aqueles que emparedava, encontrasse a pistola da policial e, de repente, até mesmo seu distintivo? Não seja cínico na resposta.
Ainda que à paisana, Katia era ali uma militar, condição que (como a de mãe) se impõe 24 horas por dia, em pleno cumprimento de sua função pública: não a de matar bandidos, efeito colateral do confronto; mas a de proteger a sociedade contra bandidos. Não é uma heroína, mas alguém muito mais importante, curto-circuito na mente revolucionária: uma mulher, policial, profissional exemplar, que honra seu dever — que tem senso de dever — numa sociedade em que as pessoas são viciadas em direitos e propensas ao vitimismo. A cabo Sastre educa.
Carlos Andreazza é editor de livros
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