A defesa do ex-presidente Lula caminha para mais uma derrota no recurso no Superior Tribunal de Justiça (STJ) ao basear sua tese na prescrição do crime de corrupção passiva, que já foi rejeitada tanto na primeira instância pelo juiz Sergio Moro quanto no TRF-4 pelo relator Gebran Neto, que foi seguido pelos outros dois desembargadores da Turma.
A alegação da defesa nos memoriais é de que “(...) se o benefício material — vantagem indevida — ocorreu em 2009, o crime de corrupção, em qualquer modalidade aventada, já teria se consumado naquele momento”. Com o prazo para prescrição de 6 anos, o crime estaria prescrito em outubro de 2015, 11 meses antes do recebimento da denúncia por Sergio Moro, em setembro de 2016. O ex-presidente da Câmara João Paulo Cunha, condenado no mensalão e hoje atuando como advogado no Supremo, defende a tese da prescrição.
No entanto, na sentença condenatória, que foi aceita pelo TRF-4, o juiz Sergio Moro argumentou expressamente, nos itens 877 e 888, que parte dos benefícios materiais foi disponibilizada em 2009, quando a OAS assumiu o empreendimento imobiliário, e parte em 2014, quando das reformas, e igualmente, quando em meados daquele ano, foi ultimada a definição de que o preço do imóvel e os custos das reformas seriam abatidos da conta-corrente geral da propina, segundo José Adelmário Pinheiro Filho, o Léo Pinheiro, presidente da empreiteira.
Foi, portanto, escreveu Moro, um crime de corrupção complexo e que envolveu a prática de diversos atos em momentos temporais distintos de outubro de 2009 a junho de 2014, aproximadamente. Nessa linha, o crime só teria se consumado em meados de 2014, e não há começo de prazo de prescrição antes da consumação do crime.
O relator no TRF-4, desembargador Gebran Neto, aumentou a pena de Lula pela “alta culpabilidade”, sendo 8 anos e 4 meses por corrupção passiva e 3 anos e 9 meses por lavagem de dinheiro, dois crimes distintos cujas penas são somadas por “concurso material” entre as condutas, sem contar para o cálculo da prescrição.
Baseando-se na tese de Moro, confirmada pelo TRF-4, mesmo que não houvesse aumento da pena, o crime de corrupção passiva não estaria prescrito. O de lavagem de dinheiro não entra na disputa judicial, pois, na interpretação do Supremo, trata-se um crime permanente, cuja execução se prolonga no tempo. Nos Tribunais Superiores há o entendimento de que a ocultação é um crime permanente.
O balanço das decisões do STJ divulgado recentemente mostra que os recursos que tiveram a defesa como parte solicitante, seja advogado ou defensoria pública, apresentaram resultados pouco animadores para os condenados: em 0,62%, absolvição; em 1,02%, substituição da pena restritiva de liberdade por pena restritiva de direitos; em 0,76%, prescrição; em 6,44%, diminuição da pena; em 2,32%, diminuição da pena de multa; em 4,57%, alteração de regime prisional.
Isso acontece porque tanto o STJ quanto o STF só podem analisar questões de direito e não de fato. O primeiro verifica se houve violação às leis federais, e o Supremo, violações à Constituição. Podem rever o mérito, mas raramente o fazem. Tendo sido mantida a condenação, e aumentada a pena, é difícil que o STJ admita uma prescrição que foi rejeitada pelas duas instâncias anteriores.
Se houvesse a hipótese de a pena ter sido aumentada no TRF-4 para impedir a prescrição do crime, estaria determinada uma ilegalidade, pois esta não é uma das razões para agravar a pena de um condenado. No julgamento do mensalão houve uma discussão sobre o tema entre os ministros Luís Roberto Barroso e o relator Joaquim Barbosa.
Barroso, que só participou do julgamento na fase dos embargos infringentes e ajudou com seu voto a absolver os réus, inclusive José Dirceu, da acusação de crime de quadrilha, insinuou que houve a exacerbação de certas penas para evitar a prescrição de crimes.
Surpreendentemente, foi interrompido por Joaquim Barbosa, que, como relator, era o responsável por sugerir as penas: “Foi feito para isso sim”, afirmou. O ministro Barroso tentou levar a decisão sobre formação de quadrilha para a prescrição da pena, sem que o mérito fosse julgado, mas acabou defendendo a absolvição de todos os condenados no caso de quadrilha, pois considerou inexistentes as características daquele crime.
A polêmica afirmação de Joaquim Barbosa não teve consequências, pois acabou prevalecendo a absolvição.
PS — Na coluna de domingo, me referi à súmula 291 do STF, quando se trata da súmula 691, que diz que “não compete ao Supremo Tribunal Federal conhecer de habeas corpus impetrado contra decisão do Relator que, em habeas corpus requerido a Tribunal Superior, indefere a liminar”. (Com a assessoria técnica do advogado criminalista João Bernardo Kappen)
Nenhum comentário:
Postar um comentário