domingo, fevereiro 04, 2018

Por que Bolsonaro não vai para o segundo turno - ASCÂNIO SELEME

O GLOBO - 04/02
O candidato representa tudo o que a maioria dos seus seguidores odeia: a desordem, o desmando, a violência

O que querem aqueles brasileiros que apoiam Bolsonaro? Não é preciso fazer uma pesquisa para saber. Eles querem ordem e respeito às leis. Os homens e mulheres, muito mais homens, é verdade, que carregam nos ombros em aeroportos e shoppings aquele que chamam de “mito”, querem justiça. Que os corruptos, os ladrões, os assassinos sejam presos e permaneçam presos. Querem Segurança, Saúde e Educação. Como querem todos os demais.

Eles estão cansados da classe política e se embruteceram. Se de um modo geral os brasileiros não confiam nos políticos, estes que seguem Bolsonaro não conseguem vislumbrar alternativas. Os outros sabem que a saída é eleitoral. A eleição de 2018 será a mais importante do país desde a indireta de 15 de janeiro de 1985, que elegeu Tancredo Neves, empossou José Sarney e pôs fim à ditadura militar. Se errarmos em outubro, patinaremos pelos próximos 10, 15 anos.

A solução para a crise política, econômica e administrativa que o país enfrenta atende por alguns nomes, como democracia, eleição direta, respeito à vontade popular e às instituições, responsabilidade fiscal, tolerância e generosidade. Essa turma que apoia Bolsonaro acabará se dando conta de que ele é o oposto a isso tudo suficientemente cedo. Falta a ela um pouco de luz sobre o que o seu candidato representa. E essa luz já está sendo feita.

Bolsonaro é o contrário do que querem seus seguidores. Bolsonaro não irá para o segundo turno em outubro porque os seus eleitores vão minguar à medida que sua personalidade ficar mais evidente. Embora o brasileiro seja conservador, ele não é fascista. Ele não apoia injustiças. Ele não tolera a brutalidade e não aceita a tortura. Refiro-me ao brasileiro médio, não estou falando dos idiotas e dos boçais, que ficam com Bolsonaro, mas estes são minoria e não contam. Ou não elegem ninguém para cargo majoritário

Mas o brasileiro não é bonzinho. Ele pode ser tudo, até gentil, mas bonzinho ele não é. Ele gosta que as coisas sejam feitas como manda o figurino. E o figurino manda que as demandas sejam resolvidas de acordo com a lei e não ao seu arrepio. O brasileiro não admite que o mandem calar a boca. Detesta que humilhem a si ou a outro qualquer, sobretudo quando o outro é mais frágil.

O nosso compatriota gosta que seus direitos sejam respeitados. Aliás, o brasileiro adora direitos, bem mais do que deveres, e vai para rua defendê-los se for preciso. E o que Bolsonaro menos respeita é o direito do outro. Sobretudo o direito do outro se manifestar e se expressar. E se o outro for outra, aí sim que ele não respeita mesmo.

Se houve uma única unanimidade no Brasil desde o seu descobrimento, foi justamente contra a ditadura que Bolsonaro defende e representa. Esse homem que apoia a tortura e torturadores, como o coronel Brilhante Ulstra, está do outro lado da paz e da harmonia. Ditadura interrompe a ordem jurídica, política e social. Escolhe caminhos sem fazer consultas. Censura a Imprensa. Prende, tortura e mata adversários.

Sua única saída seria aplicar “o maior truque já realizado pelo diabo”, que, como explicou Mário Quintana, “foi convencer o mundo de que ele não existe”. Bolsonaro vai tentar mudar seu discurso daqui para frente, já está tentando. Ele terá de convencer o Brasil de que não é o rei do cala-a-boca, do quem-manda-aqui-sou-eu, do te-quebro-a-cara, do o-meu-pirão-primeiro. Mas não vai colar. Adeus, Bolsonaro!

NÚMEROS RUINS DA PREFEITURA

O ano passado, o primeiro da gestão de Marcelo Crivella, foi um desastre para as contas municipais. Estudo feito pelo Ministério Público do Rio sobre os relatórios fiscais do município revela o seguinte: 1) A dívida consolidada cresceu R$ 1 bi; 2) O resultado entre receitas e despesas teve déficit de R$ 816 milhões; 3) A arrecadação ficou 18% menor do que o orçado, mais ou menos R$ 4 bilhões abaixo do esperado; 4) A despesa de pessoal foi de R$ 10,3 bi, R$ 320 milhões a mais do que em 2016.

PREVIDÊNCIA MUNICIPAL

O mesmo estudo revela que o resultado do regime previdenciário municipal foi deficitário em R$ 340 milhões no ano passado. Uma projeção atuarial apresenta déficit de R$ 100 bilhões na Previdência do Rio até 2092. Já passou da hora de se fazer alguma coisa.

CONTA OUTRA

Tem alguma coisa errada na Secretaria de Administração Penitenciária do Rio. Em 2017, 71,2% dos seus empenhos foram feitos sem licitação. A Seap alegou emergência para não fazer pregões mesmo em contratos cujos valores exigiam a medida. Outros 22,8% foram na rubrica Termo de Ajuste de Contas, que são empenhos sem cobertura contratual. Vai ver que é por isso que os presídios do Rio são tão bacanas.

BOA PROMESSA

Em solenidade com o ministro de Ciência e Tecnologia, Gilberto Kassab, o governador Luiz Fernando Pezão garantiu na última semana que vai voltar a investir na Fundação de Amparo à Pesquisa do Rio (Faperj) e nas universidades estaduais. O governador conta com a retomada no crescimento da arrecadação e aponta no rumo certo, priorizar e apoiar a educação, a ciência e a pesquisa. Resta saber se conseguirá cumprir o prometido.

REI ARTHUR

Aparentemente, o foragido da Justiça Arthur Soares está colaborando com procuradores americanos nas investigações sobre compra de votos e lavagem de dinheiro em grandes eventos esportivos, como Copa do Mundo e Olimpíadas. Esta é a única explicação por ele ainda não ter sido repatriado, já que todo mundo sabe que vive nos EUA. Novas intimações foram expedidas esta semana em Nova York para tomada de depoimentos.

TECNOLOGIA BURRA

Para recuperar um cliente perdido, o telemarketing do Citibank liga para ele três, quatro, cinco vezes por dia, começando às 8h30m. O sujeito reclama que aquilo é assédio, e o banco diz que sua Tecnologia vai fazer um bloqueio digital. Agora, o telefone toca três, quatro, cinco vezes por dia, o sujeito atende, a pessoa do Citi se apresenta e quando vai dizer a que veio, a linha cai. Alguém conhece tecnologia mais burra?

DE OLHO NA TV

O marqueteiro João Santana, condenado a sete anos e meio de prisão, mas em casa por ter feito delação na Lava-Jato, quer comprar uma TV na Bahia. Está negociando com a TV Aratu, repetidora do SBT, e com a Band local. Enquanto isso, escreve um romance. Tem tanta coisa íntima na história que o livro poderia ser catalogado como “ficção autobiográfica”.

QUERIDO EMBAIXADOR

Será hoje, no auditório da Florida Atlantic University, a première do filme “Querido embaixador”, que conta a história de Luiz Martins de Souza Dantas, embaixador do Brasil na França na II Guerra Mundial. Conhecido como o “justo entre os justos”, Dantas concedeu centenas de vistos a judeus e a outros foragidos do nazismo durante a ocupação. O filme estreia no Brasil em julho.

WOODY ALLEN

“Tiros na Broadway”, “Desconstruindo Harry”, “Celebridades”, “Ponto final”, “Vicky Barcelona”, “Meia-noite em Paris”, “Blue jasmine”, “Café Society”, “Roda gigante”. Estes são alguns dos 27 filmes que Woody Allen fez desde 1992, ano em que se separou de Mia Farrow e foi viver com a enteada dela, Soon Yi. Imagine só.

PRAIA SUJA

A nota mais comentada desta coluna na semana passada foi a das praias sujas. Leitores escreveram para culpar o carioca mal-educado que não recolhe seu lixo e deixa a praia imunda quando sai. Os leitores têm razão. O usuário é mesmo o responsável pela sujeira das praias, e de todos os logradouros públicos do Rio. E a Comlurb é responsável pela sua limpeza. Um dos dois não está funcionando.

ALGEMAS

Na quarta-feira, a polícia desbaratou uma quadrilha que desviava remédios de hospitais. Um homem, membro do grupo criminoso, foi filmado e fotografado sendo levado para o camburão. Estava algemado. Não li, não vi nem ouvi qualquer reação indignada contra a humilhação imposta ao pobre ladrão. Nem da mãe dele.

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