SÃO PAULO - A confissão de Antonio Palocci acaba com Lula? Bem, acho que dá para dizer que ela não ajuda o ex-presidente, mas me parece precipitado afirmar que encerre a carreira política do líder petista, que já conseguiu livrar-se de situações que pareciam impossíveis.
O primeiro ponto a considerar é que a bomba lançada por Palocci ainda está no terreno das declarações. O que ele diz tem peso por vir de quem vem, mas não chega a ser um "batom na cueca" como o vídeo de Rocha Loures com a mala de dinheiro.
Mais importante, a narrativa que Lula vinha usando para explicar seu envolvimento na Lava Jato —"tudo não passa de perseguição política promovida pelas elites que não querem ver a vida dos pobres melhorar"— pode, sem grandes malabarismos, acomodar a transformação de Palocci: depois de sofrer meses de "tortura psicológica" ao ser mantido injustamente na cadeia, ele desabou e agora acusa o ex-presidente apenas para deixar o cárcere.
Isso basta para que os petistas convictos, determinados a absolver o ex-presidente de qualquer pecado, continuem a crer na inocência de seu líder. A ideologia não precisa de mais do que um fiapinho de verossimilhança para nele agarrar-se até o fim.
A questão é que nem todo o mundo é igualmente ideológico. O grau com que as pessoas se prendem ao discurso de partidos (e religiões) segue uma distribuição normal, sendo que só uma minoria se mostra invulnerável a evidências empíricas contrárias a suas inclinações.
A multiplicação dos delatores que entregam o ex-presidente e das situações que ele próprio não consegue explicar a contento, um processo que teve início em 2005, tende a tornar Lula cada vez mais dependente de uma militância ideológica —exatamente o contrário da guinada para o centro que o elegeu em 2003. Minha impressão é que ele vai se transformando numa espécie de Maluf da esquerda.
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