O ex-presidente Lula e o juiz Sergio Moro não estão em um duelo. Eles não são dois políticos em debate eleitoral. Um é o réu, o outro julgador. Um é o popular líder político, o outro é o magistrado que tem que analisar friamente os autos e as provas antes de condenar ou absolver. A quem interessa transformar uma vara em um ringue? Ao Lula evidentemente, por falta de argumentos.
O clima em Curitiba era ontem de enorme tensão. A imprensa internacional fez várias solicitações de credencial para a cobertura do evento. É o momento ideal, da perspectiva de Lula, para transformar a cadeira de réu em palanque.
Haverá outros encontros dos dois na 13ª Vara Federal de Curitiba porque há vários processos em andamento. O que acontece hoje é o depoimento do réu sobre o inquérito em que ele foi denunciado, junto com Leo Pinheiro, acusado de ter recebido vantagens da OAS de R$ 2.424.991 pelo tríplex no Guarujá, suas benfeitorias e alguns móveis. Durante o seu depoimento, Leo Pinheiro confirmou que o imóvel estava destinado e foi reformado para o ex-presidente.
Este é o primeiro processo e o mais estratégico do ponto de vista da linha de defesa de Lula, que tenta protelar ao máximo para que o calendário político possa atravessar o tempo da Justiça, e criar um grande conflito com o juiz. Essa ação é a que tem possibilidade de atrapalhar seus planos de voltar à presidência, porque está mais adiantada.
Quanto mais cedo sair a decisão de Moro, mais chance haverá de a segunda instância analisar a sentença. Se Lula for condenado em duas instâncias não poderá ser candidato, pela Lei da Ficha Limpa. Existe uma distorção no processo eleitoral brasileiro: um réu não pode ser presidente da República, mas pode concorrer ao cargo, a menos que tenha sido condenado em segunda instância.
No recebimento da denúncia em setembro do ano passado, o juiz Sergio Moro disse que há “razoáveis indícios de que o imóvel em questão teria sido destinado pela OAS para o ex-presidente”. Leo Pinheiro confessou no depoimento dele que o dinheiro foi descontado de uma propina devida por contrato na construção da Refinaria Abreu e Lima. Na denúncia também consta o custo de armazenamento dos bens de Lula pela OAS. A defesa argumentou que uma empresa pagar pela guarda dos bens de ex-presidentes é comum e já foi feito antes. O problema é explicar porque o contrato foi redigido de forma a esconder quem pagava o custo.
Haverá depois o processo que trata da cobertura que o ex- presidente Lula usa, ao lado da sua, e que está em nome de outra pessoa, mas provou-se, por rastreamento do dinheiro, que foi pago pela Odebrecht. Nesse processo está incluído também o caso do imóvel que seria comprado pela empreiteira para o Instituto Lula. Aliás, ontem o Instituto enfrentrou mais um revés e não foi de Curitiba. No caso do sítio de Atibaia a denúncia ainda não foi apresentada. Há também um processo de obstrução da Justiça correndo em Brasília, na 10ª Vara.
A luta de Lula é política porque este é o terreno no qual ele sabe brigar e tem alguma chance de virar o jogo em seu favor. Acumulam-se depoimentos, testemunhos e provas materiais de que ele recebeu vantagens pessoais extravagantes de empreiteiras que fizeram negócios com as estatais brasileiras, e que sob o seu governo a Petrobras foi saqueada. Não há mais como negar a corrupção durante seus mandatos. Ele só pode alegar que desconhecia.
A ideia da defesa de pedir para gravar tinha como objetivo transformar um processo criminal em campanha publicitária. Isso é totalmente estranho a um processo. Os advogados que estão dizendo que é prerrogativa da defesa sabem que a gravação não é para ser usada em suas peças processuais.
É natural que um político queira fazer campanha política, não é natural que a Justiça aceite ser usada para esse propósito, por isso a negativa a essa gravação era a melhor resposta. A mobilização dos seus militantes para Curitiba tem como objetivo, explícito, intimidar a Justiça. Eles podem querer salvar seu líder cada vez mais encrencado, mas a Justiça não pode se deixar intimidar. Lula é apenas um réu sendo ouvido no primeiro de vários processos.
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