É dever da Polícia Federal e do Ministério Público proteger o bom andamento da Operação Lava Jato
Certamente, há muita gente interessada em obstruir ou, ao menos, dificultar o trabalho da Operação Lava Jato. É dever da Polícia Federal e do Ministério Público proteger o bom andamento desse trabalho investigativo e persecutório, que já revelou tantos crimes cometidos por gente graúda da política e do mundo empresarial.
Nessa tarefa de proteção das investigações, um instrumento valioso é a previsão constante na Lei da Organização Criminosa (Lei 12.850/2013), que tipifica o crime de obstrução de Justiça, estabelecendo a pena de três a oito anos de reclusão, além de multa, para quem “impede ou, de qualquer forma, embaraça a investigação de infração penal que envolva organização criminosa”. Ao longo desses anos de Lava Jato, várias vezes foi necessário recorrer a esse artigo para assegurar o bom andamento da operação.
Nos últimos tempos, no entanto, tem havido certo abuso na interpretação do que vem a ser obstrução de Justiça. Caso recente ocorreu na petição da Procuradoria-Geral da República (PGR) endereçada ao plenário do Supremo Tribunal Federal (STF), na qual se volta a pedir a decretação da prisão preventiva do senador Aécio Neves (PSDB-MG).
A PGR afirma que o senador Aécio Neves articulava para pôr um “freio de arrumação na Polícia Federal” e, como uma das provas, cita conversa gravada entre o senador mineiro e o senador José Serra (PSDB-SP). No diálogo transcrito, os dois concordam a respeito da necessidade de um ministro da Justiça forte.
De acordo com o conteúdo revelado no documento da PGR, o senador José Serra pede para que o senador Aécio converse com o presidente Michel Temer sobre a necessidade de um ministro da Justiça forte. Serra diz explicitamente que o objetivo “não é fazer algo arbitrário”, mas simplesmente que “as coisas tenham um caminho de desenvolvimento”.
Para a Procuradoria, o áudio confirma a tese de que o senador Aécio Neves articulava para pôr limites à Lava Jato. Pode até ser que haja outras provas e que o STF venha a considerar que o senador Aécio Neves tenha obstruído a Justiça. No caso do diálogo referido, no entanto, é mais do que excessivamente subjetiva a interpretação de que os interlocutores conspiravam, ao demandar um ministro da Justiça forte, contra os trabalhos da Polícia Federal e do Ministério Público.
A prevalecer a interpretação da PGR sobre o que seja obstrução de justiça, teremos a criminalização – e consequente proscrição – de toda e qualquer conversa sobre política. Desde a época do mensalão e, muito especialmente, com o petrolão, o sr. Lula da Silva e a tigrada alegaram que o PT era vítima da criminalização da política. Na verdade, petistas foram condenados pela prática de crimes comuns, mas eles tentaram vender a ideia de que esses crimes faziam parte da política nacional e que seria uma injustiça condená-los por esses crimes tão habituais. Todo mundo fazia, era a desculpa inerente ao argumento petista. Algo parecido ocorre com os black blocs que depredam patrimônio público e privado durante manifestações. Quando são incriminados por suas ações, que estão claramente tipificadas no Código Penal, eles dizem que são vítimas de uma suposta criminalização dos movimentos sociais ou criminalização da manifestação. Como é evidente, o argumento não se sustenta. Tanto no caso dos petistas como no caso dos vândalos, quem criminaliza é a lei, que diz, por exemplo, que é crime depredar patrimônio público.
Mas, quando o Ministério Público diz que uma conversa entre senadores, em que se discute a necessidade de um ministro da Justiça forte – o que, até onde se sabe, é uma coisa boa para qualquer país –, prova a intenção de pôr um “freio de arrumação na Polícia Federal”, ocorre de fato uma indevida e perigosa criminalização da política. Não fossem os tempos atuais tão estranhos, haveria pronta reação da sociedade a tal abuso interpretativo da lei e dos fatos. Só falta que a lei penal, nas poucas vezes em que é efetivamente aplicada, seja utilizada para fins políticos. Seria burlar o País.
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