Vozes que negociavam e conspiravam agora incriminam e denunciam. Prevaleceu o “Amigos, amigos, negócios à parte”
Vários filósofos fizeram reflexões interessantes sobre a amizade. Aristóteles a definiu como “uma alma em dois corpos”. Platão explicou-a como “uma predisposição recíproca que torna dois seres igualmente ciosos da felicidade um do outro”. A minha frase predileta, no entanto, é de Montaigne, que, quando da morte do seu amigo La Boétie, escreveu: “Já me acostumara tão bem a ser sempre dois que me parece agora que não sou senão meio”.
A Operação Lava-Jato, porém, remete-nos ao que pensava Confúcio: “Para conhecermos os amigos, é necessário passar pelo sucesso e pela desgraça. No sucesso, verificamos a quantidade e, na desgraça, a qualidade”.
De fato, com os depoimentos prestados em cerca de 150 delações premiadas muitas amizades ruíram. Poucas sobreviveram quando a liberdade estava em jogo. Dos muitos bens acumulados pelos corruptos, a liberdade revelou-se o mais importante. As mesmas vozes que antes negociavam e conspiravam são agora as que incriminam e denunciam. Prevaleceu o dito popular: “Amigos, amigos, negócios à parte”.
Mais recentemente, o “cada um por si, Deus por todos” esquentou com a divulgação da “delação do fim do mundo”, de Marcelo Odebrecht e 76 funcionários da empreiteira, e com o depoimento de Renato Duque, ex-diretor da Petrobras.
Com o fogo subindo, as explicações extrapolaram as amizades e chegaram ao matrimônio. O ex-presidente Lula, pelo visto, não sabia o que se passava na Petrobras, no PT e, até, na sua própria casa. No seu depoimento ao juiz Sérgio Moro, Lula afirmou que a sua esposa já falecida Marisa Letícia era quem tinha interesse no tríplex. Aliás, a ex-primeira dama já tinha sido citada em outros depoimentos. O pecuarista e amigo da “família Lula”, José Carlos Bumlai, afirmou que foi a esposa do ex-presidente quem o procurou e pediu-lhe “ajuda” para comprar um terreno no qual seria instalado o Instituto Lula. O então diretor da Odebrecht, Alexandrino Alencar, por sua vez, contou ao Ministério Público Federal que foi também Marisa Letícia quem lhe pediu uma obra no sítio de Atibaia, no valor de R$ 1 milhão, durante uma festa de aniversário de Lula em 2010.
Considerando o espírito empreendedor da senhora Marisa Letícia, fico a imaginar se não teria sido melhor que Lula a indicasse como candidata a presidente da República, em vez de Dilma, que nos levou à maior crise econômica da história do país. À época, porém, Lula chegou a dizer: “Dilma tem a competência e a capacidade que o Brasil precisa pra fazer o país avançar”. Deu no que deu...
Voltando à Lava-Jato, a fase atual poderia ser chamada como a das “delações de exterminação do universo”, tendo em vista o que já disseram João Santana e sua mulher, e o que poderá contar Palocci. Se forem comprovadas as afirmações de Mônica Moura, Dilma teria cometido cinco crimes: violação de sigilo, obstrução de Justiça, corrupção e crimes de responsabilidade e contra a administração pública. Para quem se diz honesta, é de arrepiar os cabelos, os mesmos que, tratados pelo coiffeur Celso Kamura, custaram, de 2010 a 2014, cerca de R$ 40 mil à marqueteira.
Lula, que já é réu em cinco inquéritos, poderá responder a um sexto por obstruir a Justiça, após os depoimentos de Renato Duque e Léo Pinheiro, que o acusam por tê-los orientado a destruir documentos. Para complicar, segundo João Santana, Lula dava a “palavra final” sobre o caixa dois. Companheiros, criador e criatura parecem estar enrolados.
A mais aguardada delação, entretanto, é a de Palocci, que pode ser a gota d’água nesse drama. Fundador do Partido dos Trabalhadores, ex-prefeito de Ribeirão Preto, ex-ministro da Fazenda de Lula e da Casa Civil de Dilma, ex-conselheiro da Petrobras, coordenador geral da campanha da ex-presidente em 2010, Palocci conhece as entranhas eleitorais e dos últimos governos. Além disso, o “Italiano” poderá dar detalhes sobre a conta “Amigo”, codinome de Lula — segundo Marcelo Odebrecht —, a qual foi aberta em 2010 com R$ 40 milhões e era movimentada frequentemente por “Brani”, assessor de Palocci.
Enfim, nessa estrutura pútrida, fétida e promíscua, que envolve os caciques da maioria dos partidos políticos brasileiros, muitos dos corruptos não seguiram os conselhos do filósofo alemão Arthur Schopenhauer: “Não diga nada a um amigo que você esconderia de um inimigo”. Mas a amizade e o matrimônio continuarão a unir pessoas, na alegria e na tristeza, na saúde e na doença, por todos os momentos da vida, salvo se um dos parceiros correr o risco de ser preso...
Gil Castello Branco é economista e fundador da organização não governamental Associação Contas Abertas
Vários filósofos fizeram reflexões interessantes sobre a amizade. Aristóteles a definiu como “uma alma em dois corpos”. Platão explicou-a como “uma predisposição recíproca que torna dois seres igualmente ciosos da felicidade um do outro”. A minha frase predileta, no entanto, é de Montaigne, que, quando da morte do seu amigo La Boétie, escreveu: “Já me acostumara tão bem a ser sempre dois que me parece agora que não sou senão meio”.
A Operação Lava-Jato, porém, remete-nos ao que pensava Confúcio: “Para conhecermos os amigos, é necessário passar pelo sucesso e pela desgraça. No sucesso, verificamos a quantidade e, na desgraça, a qualidade”.
De fato, com os depoimentos prestados em cerca de 150 delações premiadas muitas amizades ruíram. Poucas sobreviveram quando a liberdade estava em jogo. Dos muitos bens acumulados pelos corruptos, a liberdade revelou-se o mais importante. As mesmas vozes que antes negociavam e conspiravam são agora as que incriminam e denunciam. Prevaleceu o dito popular: “Amigos, amigos, negócios à parte”.
Mais recentemente, o “cada um por si, Deus por todos” esquentou com a divulgação da “delação do fim do mundo”, de Marcelo Odebrecht e 76 funcionários da empreiteira, e com o depoimento de Renato Duque, ex-diretor da Petrobras.
Com o fogo subindo, as explicações extrapolaram as amizades e chegaram ao matrimônio. O ex-presidente Lula, pelo visto, não sabia o que se passava na Petrobras, no PT e, até, na sua própria casa. No seu depoimento ao juiz Sérgio Moro, Lula afirmou que a sua esposa já falecida Marisa Letícia era quem tinha interesse no tríplex. Aliás, a ex-primeira dama já tinha sido citada em outros depoimentos. O pecuarista e amigo da “família Lula”, José Carlos Bumlai, afirmou que foi a esposa do ex-presidente quem o procurou e pediu-lhe “ajuda” para comprar um terreno no qual seria instalado o Instituto Lula. O então diretor da Odebrecht, Alexandrino Alencar, por sua vez, contou ao Ministério Público Federal que foi também Marisa Letícia quem lhe pediu uma obra no sítio de Atibaia, no valor de R$ 1 milhão, durante uma festa de aniversário de Lula em 2010.
Considerando o espírito empreendedor da senhora Marisa Letícia, fico a imaginar se não teria sido melhor que Lula a indicasse como candidata a presidente da República, em vez de Dilma, que nos levou à maior crise econômica da história do país. À época, porém, Lula chegou a dizer: “Dilma tem a competência e a capacidade que o Brasil precisa pra fazer o país avançar”. Deu no que deu...
Voltando à Lava-Jato, a fase atual poderia ser chamada como a das “delações de exterminação do universo”, tendo em vista o que já disseram João Santana e sua mulher, e o que poderá contar Palocci. Se forem comprovadas as afirmações de Mônica Moura, Dilma teria cometido cinco crimes: violação de sigilo, obstrução de Justiça, corrupção e crimes de responsabilidade e contra a administração pública. Para quem se diz honesta, é de arrepiar os cabelos, os mesmos que, tratados pelo coiffeur Celso Kamura, custaram, de 2010 a 2014, cerca de R$ 40 mil à marqueteira.
Lula, que já é réu em cinco inquéritos, poderá responder a um sexto por obstruir a Justiça, após os depoimentos de Renato Duque e Léo Pinheiro, que o acusam por tê-los orientado a destruir documentos. Para complicar, segundo João Santana, Lula dava a “palavra final” sobre o caixa dois. Companheiros, criador e criatura parecem estar enrolados.
A mais aguardada delação, entretanto, é a de Palocci, que pode ser a gota d’água nesse drama. Fundador do Partido dos Trabalhadores, ex-prefeito de Ribeirão Preto, ex-ministro da Fazenda de Lula e da Casa Civil de Dilma, ex-conselheiro da Petrobras, coordenador geral da campanha da ex-presidente em 2010, Palocci conhece as entranhas eleitorais e dos últimos governos. Além disso, o “Italiano” poderá dar detalhes sobre a conta “Amigo”, codinome de Lula — segundo Marcelo Odebrecht —, a qual foi aberta em 2010 com R$ 40 milhões e era movimentada frequentemente por “Brani”, assessor de Palocci.
Enfim, nessa estrutura pútrida, fétida e promíscua, que envolve os caciques da maioria dos partidos políticos brasileiros, muitos dos corruptos não seguiram os conselhos do filósofo alemão Arthur Schopenhauer: “Não diga nada a um amigo que você esconderia de um inimigo”. Mas a amizade e o matrimônio continuarão a unir pessoas, na alegria e na tristeza, na saúde e na doença, por todos os momentos da vida, salvo se um dos parceiros correr o risco de ser preso...
Gil Castello Branco é economista e fundador da organização não governamental Associação Contas Abertas
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