O GLOBO - 19/05
A interpelação judicial que deputados de diversos partidos da nova base aliada governista — PP, PSDB, DEM, PPS e SD — encaminharam ao Supremo Tribunal Federal (STF), para que a presidente afastada Dilma Rousseff explique por que chama de golpe o processo de impeachment que sofre no Congresso, é um marco importante nessa luta política que está sendo travada pela correta narrativa do que ocorre neste momento no Brasil.
Aministra Rosa Weber deu prazo de dez dias para as explicações, mas a presidente afastada não precisa responder. O silêncio, ou a confirmação, servirá de base para uma ação em dois níveis: no criminal, um processo por difamação, e no cível, uma indenização por danos morais de valor incalculável, pois para os deputados a acusação é “algo de gravidade ímpar, sobretudo, ao se levar em consideração a recente História nacional e as possibilidades de ruptura que declarações desse jaez podem trazer à sociedade brasileira”.
Fizeram bem os deputados, e melhor ainda faria o governo se atentasse para o estrago institucional que tal campanha está causando ao país. O chanceler José Serra já iniciou um contra-ataque em nível internacional, respondendo aos governos bolivarianos, mas é preciso um trabalho oficial para repor a verdade.
Não há como impedir a irresponsabilidade de uma presidente afastada que não se importa de prejudicar a imagem do país no exterior, ao assumir o mesmo papel de militantes partidários, que pensam apenas em seus interesses pessoais na luta política que desencadeiam sem trégua.
Os petistas e assemelhados que espalham pelo mundo a narrativa do golpe — por enquanto preponderante — cumprem uma ação política utilizando-se da democracia para tentar desacreditá-la. Já uma presidente da República que age como militante demonstra que não tem a dimensão do cargo.
Será interessante acompanhar os acontecimentos para verificar que, no final, não prevalecerá essa história de um golpe cuja suposta vítima permanece morando num Palácio do governo, com todas as mordomias do cargo mantidas, até mesmo um avião oficial que, ainda veremos, a levará a vários cantos do país e até mesmo ao exterior para denunciar às nossas custas um golpe, que é acompanhado pelo Supremo nomeado em sua ampla maioria pelos governos petistas, e desencadeado por um Congresso que até pouco tempo fazia parte da base aliada governista.
É inacreditável que, neste primeiro momento, esteja ganhando foros de verdade uma versão estapafúrdia que não se sustenta nas evidências. Por isso, a ação dos deputados no STF tem a validade de tentar dar um freio a essa irresponsabilidade, chamando a atenção de Dilma de que suas palavras, por causarem danos à imagem do país, podem ser penalizadas na Justiça.
O que Dilma chama de “golpe” é, no máximo, uma divergência de opinião sobre o veredicto de um julgamento. Por enquanto, o tribunal político em que se transformou o Congresso a está considerando culpada, com base jurídica bastante sólida ao ver da maioria de seus membros.
O ex-advogado-geral da União José Eduardo Cardozo, que acabará sendo investigado por seu sucessor por ter extrapolado suas funções, discorda da decisão, o que está no seu direito, mas vai além e acusa os congressistas de golpistas.
Também ele é merecedor de processo, pois, sendo advogado da União, não poderia atacar outras instituições da República — como a Câmara e o Senado — na defesa da ocupante momentânea do Executivo.
Armadilha
O presidente em exercício, Michel Temer, não conseguiu sair da armadilha que seu passado político lhe armou, e teve que aceitar como seu líder na Câmara o deputado André Moura. Indicado por um grupo de mais de 300 deputados do chamado “centrão”, o deputado é acusado até mesmo de tentativa de assassinato. Pode ser tudo intriga da oposição, mas, enquanto o caso não se esclarece, seria melhor para o governo uma distância acauteladora de figuras como essa. Sua indicação é prova de que Temer não tem muita autonomia diante do baixo clero, controlado sob os panos por Eduardo Cunha. Haja pragmatismo.
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