FOLHA DE SP - 16/12
Caso Dilma Rousseff seja deposta, seu ministro da Fazenda, Joaquim Levy, estará fora do governo, claro. Caso Dilma Rousseff permaneça, Levy estará dentro do nada.
O ministro estreou no cargo com um plano ambicioso de "reformas". Foi lascado mês a mês, até restar agora o toco no qual discute décimos de um superavit primário em que ninguém acredita, de uma política econômica que não existe, política na qual jamais acreditou essa presidente.
Levy terá existência decorativa a não ser que uma sobrevivente Dilma Rousseff na prática renuncie em seu nome, lhe dê "carta branca" e, de quebra, quase tão inviável, sobrevenha um acordo político a fim de dar sustentação ao governo dessa presidente na prática exilada.
A composição dessas duas probabilidades mínimas resulta em nanoprobabilidades: não vai acontecer. Caso permaneça no cargo, Levy terá sorte se puder tocar uma política econômica "feijão com arroz", muito insuficiente, dado o tamanho do nosso desastre osso duro de roer, que pede muita carne e tutano.
O diagnóstico, de resto, vale também para um governo que venha a suceder o de Dilma Rousseff, em caso de deposição.
Lembre-se de Itamar Franco. Assumiu sob um pacto precário, que não passava do começo da dispersão do desfile que depôs Fernando Collor. Entre sua posse provisória em outubro de 1992 e maio de 1993, Itamar teve três ministros da Fazenda. Cada um durou dois meses e meio.
Todos assumiram com diagnósticos corretos e razoáveis do que fazer da economia ("ajuste fiscal", bidu, "reformas", juros altos, abertura etc.). Além de rolos circunstanciais ou anedóticos, foram triturados e caíram porque não tinham crédito, representatividade ou projeto de longo prazo crível e politicamente articulado. A economia reencaminhava-se para a hiperinflação. O país debatia, bidu, a revisão da Constituição de 1988, marcada para 1993. Dizia-se então, mais ou menos como agora, que o governo do Brasil era economicamente inviável com a "Constituição Cidadã".
Em medida importante, Itamar renunciou ao governo da economia quando deu carta branca a Fernando Henrique Cardoso, que nomeou ministro da Fazenda em maio de 1993, uma espécie de rendição incondicional, dada a ruína crescente.
FHC não foi apenas capaz de rapidamente arranjar apoios, da elite mundial aos poderes brasileiros. Arrumou uma equipe de economistas respeitáveis, em parte mais sabida porque curtida nos fracassos dos planos anti-inflacionários dos anos 1980. Mais importante, FHC articulou, como diz hoje, um novo "bloco de poder", do que fala com conhecimento prático de causa. Encarnava a reforma da ordem econômica da Constituição de 1988 e parecia um candidato confiável e capaz de derrotar Lula da Silva, então o terror de muitas elites.
O "Plano FHC", como um dia se apelidou o Real, era muito mais que um plano de combate à inflação. Em 1998, FHC diria o seguinte, com a modéstia e ironia habituais, mas certeiro: "Quem acredita em economista? Eu sou sociólogo, por isso que o plano deu certo".
Note-se, ao pé da página: a queda de Levy pode dar em coisa ainda pior, mas sua permanência nas atuais condições tende a fazer menos e menos diferença.
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