As investigações em curso envolvendo o BNDES tentam achar evidências de irregularidades nos empréstimos e investimentos do banco. Muitos esperam encontrar provas de que figuras de peso no cenário político tenham intermediado transações em prol de certas empresas e países. Mas esse movimento acaba deixando de lado um debate mais profundo: o banco tem sido efetivo na sua missão primordial de desenvolver o País?
Uma simples inspeção dos dados agregados mostra que, enquanto o crédito do BNDES saltou de 5% para 11,5% do PIB de 2000 para cá, a taxa de investimento na economia pouco mudou do patamar de 16%. Diversos estudos, incluindo de técnicos do próprio banco, mostram que em anos recentes o crédito do BNDES teve efeito limitado, se não nulo, sobre a produtividade e o investimento das firmas.
Para ser justo ao governo, algumas medidas na direção correta já foram implementadas. A Fazenda já sinalizou uma redução nas transferências do Tesouro para o banco. Novas linhas de crédito para infraestrutura passaram também a limitar o uso de taxas subsidiadas e a estimular a adoção de instrumentos privados de empréstimo. Após o STF derrubar o sigilo dos empréstimos, o BNDES começou a divulgar informações um pouco mais detalhadas sobre os contratos. Mas ainda é preciso ir muito além.
A primeira importante medida é condicionar os empréstimos – e, especialmente, os subsídios – ao potencial impacto dos projetos. Como agente público, as alocações do banco devem trazer ganhos de produtividade e melhorias socioambientais além do que o mercado privado estaria disposto a fazer. Embora o BNDES tenha recentemente sinalizado interesse em investir em fundos conciliando retorno e impacto social, o banco como um todo, nas suas diversas atividades, deveria ser um investidor de impacto por excelência. Repasses deveriam ser condicionados a metas claras de impacto, e a sua continuidade condicionada a uma avaliação posterior atestando se o tomador alcançou ou não essas metas.
A segunda grande medida deve ser a mudança gradual do foco do banco de emprestador para garantidor. Várias instituições de desenvolvimento no mundo saíram do negócio de empréstimo direto. Em vez de emprestar, elas cobrem parte do risco de crédito do empreendedor, que então pode se financiar mais facilmente com outros bancos. Além de evitar uma estrutura pesada de repasses, a atuação como garantidor permite complementar, em vez de substituir, o mercado financeiro privado. Apesar de o BNDES já ter um fundo nessa linha para empresas de menor porte, o volume ainda é baixo. E, no caso de empréstimos mais complexos, é o próprio banco que coloca exigências tão estritas que acabam inibindo a participação de novas empresas. Especificamente em projetos de infraestrutura, o banco deveria atuar como facilitador de garantias em fase pré-operacional, isso é, antes de o projeto estar de pé e com receitas.
O negócio de investimentos, via BNDESPAR, também deve ser reinventado. Num estudo com Claudia Bruschi, analisamos a carteira de ações do BNDESPAR de dezembro de 2013 a junho de 2015. Nesse período, o mercado como um todo recuou 12,9%, segundo o Ibovespa. Mas o valor da carteira do banco despencou ainda mais: 16,6%. Num momento de crise fiscal, permanecer com investimentos de retorno negativo é mais que desperdício de recursos. Além disso, a carteira é concentrada em grandes empresas, muitas delas estatais. O BNDESPAR deveria progressivamente reduzir o tamanho da sua carteira e reciclar seus investimentos em prol de empreendimentos de maior impacto e real necessidade de capital. Deveria, ainda, estabelecer claros critérios de saída dos investimentos, evitando perpetuá-los em firmas que poderiam andar com as próprias pernas.
Um BNDES reinventado nessas três principais direções, com mais foco e critério, mostraria que é possível fazer muito mais com menos.
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