FOLHA DE SP - 14/10
O governo do Brasil ora é disputado a golpes de medidas judiciais e de chicanas variadas, tiros trocados na praça dos Três Poderes, em Brasília. Na trama paralela, o governo e, muito mais ainda, a oposição disputam o apoio do presidente da Câmara, o indizível Eduardo Cunha, por meio de chantagens e por motivos torpes, na verdade, por motivo algum que não seja a mesquinharia oportunista mais sórdida.
"Às favas, neste momento, todos os escrúpulos de consciência", disse um inominável na reunião do dia da sordidez extrema, terminal, em que se decretou o AI-5, em 1968, a ditadura dentro da ditadura. Claro, decerto, sim, nem de longe estamos perto de algo parecido, ok. Mas a frase veio a calhar, o que, de qualquer modo, não é bom sinal.
Isto posto, o que dizer até sobre as perspectivas mais imediatas do que se passa na economia brasileira? A cada dois dias, a nuvem radioativa da política muda. O dólar? A CPMF? O pacote fiscal? A Previdência? Hum.
Estamos à deriva. Como a biruta da política gira de modo tresloucado, pode até bem ser que pare numa direção menos pior (melhor não será). Mas estamos à deriva, sem saber o que será feito das implementação das medidas mais comezinhas ou, hoje até feito grandioso, da aprovação de um remendo que seja no Orçamento de 2016.
Por enquanto, para nem mencionar a ameaça de estagnação prolongada, voltamos a namorar um colapso.
De qualquer modo, estamos no caminho de empatar com a segunda pior recessão da história registrada do Brasil, o triênio de Collor. Pelas previsões de hoje, falta pouco.
Na noite desta terça-feira, 13 de outubro, quando era escrita esta coluna, mal se entendia ainda se o Supremo Tribunal Federal tinha provisoriamente limitado as atribuições do presidente da Câmara dos Deputados (devido às liminares que suspenderam o "rito", o roteiro de votação de um possível processo de impeachment da presidente da República).
Note-se de passagem, a respeito do presidente da Câmara dos Deputados, que, por muito, muito menos, dezenas de pessoas foram para a cadeia provisória ou para a penitenciária nesta década presidiária da governança do Brasil.
Em resumo, diante do quadro que se desenhava ontem, parece não haver perspectiva alguma de que em algum momento o Congresso vá aprovar nem ao menos os remendos mínimos. Ou seja, aprovar os reforços nos esparadrapos que seguram a sangria que vem desde o final de julho, quando o governo começou a confessar que não tinha controle sobre o deficit de suas contas neste ano, engrossada no final de agosto, quando o governo confessou sem mais que não tinha controle também sobre o rombo de 2016.
Setembro foi o resultado disso, o ensaio geral do colapso. Pelo jeito, agora talvez devamos nos preparar para pré-estréia de um desastre agudo.
Discussões sofisticadas sobre mudanças de regime de política econômica, de metas de inflação, de política cambial, tudo isso parece cada vez mais sofismático. No momento, nas horas que correm, não há governo para cuidar do essencial, nem sistema político que cuide ao menos de evitar acidentes graves.
Nenhum comentário:
Postar um comentário