Enquanto brasileiros sentem efeitos da inflação elevada, alto funcionário da Fazenda sugere que se procurem produtos mais baratos
As tentativas de integrantes do governo federal de disfarçar os maus resultados da política econômica tornaram-se mais do que infrutíferas. São agora contraproducentes ou mesmo alarmantes, pois sugerem uma atitude situada entre o alheamento da realidade e a obstinação no erro.
A mais recente demonstração desse comportamento foi dada na entrevista em que o secretário de Política Econômica, Márcio Holland, comentava os dados a respeito dos preços de setembro.
Diante do fato de que a inflação de novo superou o teto da meta, esse alto funcionário do Ministério da Fazenda observou que o preço de alguns alimentos aumentou mais que o de outros. A informação é corriqueira, mas fugiu ao convencional sua recomendação de que os brasileiros passassem a adquirir substitutos mais em conta.
A sugestão, entre cômica e constrangedora, resultou da desastrada tentativa de dissimular os efeitos da carestia com um fato econômico conhecido: os consumidores trocam produtos temporariamente mais caros por similares (carne de boi por frango, por exemplo).
Em uma nota em que procuraria atenuar as consequências de sua declaração, o secretário Holland afirmou que tratava apenas desse "efeito substituição".
Quando existe essa troca por produtos mais baratos, pode ocorrer inclusive uma medida superestimada da inflação "real", pois o bem de preço mais alto deixa, por um tempo, de fazer parte da cesta de consumo habitual. Dado o problema inflacionário brasileiro, a observação é pormenor técnico.
O IPCA, índice de preços que baliza o regime de metas, flutua em torno de 6% desde 2010; em termos anuais, atingiu 6,75% em setembro. Trata-se do mesmo nível dos "núcleos de inflação", medidas que desconsideram preços discrepantes ou sujeitos a choques.
A alta dos valores é disseminada, se medida pela proporção de produtos que se tornam mais caros mês a mês. Esse "índice de difusão" voltou a subir, para 61% dos subitens da cesta de consumo avaliada pelo IBGE. A média dos economistas ouvidos pelo Banco Central projeta inflação de 6,3% para este ano. Ou seja, a carestia é persistente e abrangente.
Mascarar tal problema produz apenas mais descrédito na administração do país. Reduz a confiança de consumidores e empresários.
Não encará-lo de modo devido e decisivo induz os agentes econômicos a esperar outras, e talvez maiores, rodadas de altas de preços, com o que a inflação se torna mais resistente. Assim, aumenta o custo de reduzi-la. O remédio se torna mais amargo, não importa o quanto se doure a pílula.
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