O GLOBO - 01/07
Quem era criança em 1994 passou a adolescência sem conviver com uma inflação elevada e persistente. Naquele ano, o Plano Real, lançado no governo de Itamar Franco por uma equipe de economistas brilhantes liderada pelo então ministro da Fazenda Fernando Henrique, começou a debelar um processo endêmico de inflação e que acelerava para entrar em fase terminal, de destruição da moeda e mergulho do setor produtivo em cava recessão — em 1993, os preços, em média, haviam subido 2.500%. Chegava-se à hiperinflação.
Surgiu, devido ao Plano Real, uma primeira geração que cresceria na estabilidade monetária, sem se preocupar com taxas de rendimento de caderneta de poupança, sem conhecer “correção monetária", etc. Mais do que um plano de reforma econômica, o Real foi um projeto exitoso de mudança cultural, de conversão da estabilidade econômica em patrimônio da sociedade. Vinte anos depois de lançamento do plano, o Brasil se encontra num momento de inflação elevada e também persistente — ronda o limite superior ( 6,5%) da meta de 4,5% e, mais grave do que isso, é uma inflação subestimada, porque os chamados “preços públicos”, de tarifas e combustíveis, estão contidos artificialmente. A inflação efetiva estaria acima dos 7%/8%. A preocupação aumenta se considerarmos que o Brasil está na contramão de um mundo ainda em deflação. Mas ninguém espera que volte o passado da inflação sem controle. Não apenas há a rejeição política à elevação desvairada dos preços, mas reformas feitas na esteira do Plano Real dotaram o país de um outro ambiente institucional, em que é mais fácil atuar contra fontes de alimentação da alta de preços. É preciso, porém, decisão política para enfrentar a inflação.
A instituição da Lei de Responsabilidade Fiscal, em 2000, no segundo governo de FH, tem, apesar dos percalços, servido de antídoto contra a atávica tendência do político brasileiro de considerar o Tesouro fonte inesgotável de recursos. E o desregramento nos gastos foi indiscutível fator de aceleração da inflação. Outro avanço ocorreu na atuação do Banco Central, dotado de todas as condições de administrar a política de juros para defender o poder aquisitivo da moeda. Se tem maior ou menor margem de manobra, depende do Planalto.
Se nada indica que haja mais um ciclo de superinflação à espreita, também é verdade que a estabilização da economia ainda é uma tarefa incompleta. Foi um erro do PT não realizar reformas complementares às feitas pelos tucanos na esteira do Real: a trabalhista e a tributária, por exemplo. É certo que a política e a ideologia foram empecilho a isso, embora Lula houvesse se valido da política econômica tucana para salvar seu primeiro governo de grave crise econômica.
Haja o que houver em outubro, o inquilino do Planalto a partir de 1º de janeiro deveria retomar a rota das reformas. Para que de fato a estabilização decorrente do Real se perenize.
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