FOLHA DE SP - 21/03
Mas nessa reunião seus membros foram mais além ao retirar do comunicado oficial a referência de que apenas quando a taxa de desemprego chegasse a 6,5% é que o órgão consideraria um aumento dos juros de intervenção nos mercados. De agora em diante essa decisão estará vinculada a uma avaliação meramente qualitativa da maioria dos membros do colegiado.
Com o objetivo de dar mais transparência à sua atuação, o Fed deixou vazar a informação de que alguns membros acreditam que as taxas de juros da instituição estarão próximas de 1% ao ano, ao final de 2015. Um número ainda muito baixo quando comparado ao padrão dos anos anteriores à crise de 2008.
Como fazem trimestralmente, os membros do Fed que participam do comitê de política monetária revelaram suas expectativas sobre o comportamento da economia nos próximos anos. A opinião média é que o crescimento da economia americana deve chegar a 3,2% em 2014, entre 2,5% e 3% em 2015 e entre 2,5% e 3,2% em 2016. São números próximos do chamado crescimento potencial, o que revela que, na visão do Fed, a crise dos últimos cinco anos ficou definitivamente para trás.
Mesmo nesse cenário de crescimento próximo de 3% ao ano, a taxa de desemprego em 2014 e 2015 deverá ficar acima do que é considerada como situação de pleno emprego nos EUA. Por isso a política monetária deve continuar expansionista, para desespero dos partidários da chamada regra de Taylor ou de outras receitas de bolo como essa. Em razão da folga no mercado de trabalho, a inflação deve continuar rodando abaixo do objetivo do banco central dos EUA, hoje de 2% ao ano.
Em 2014, os preços ao consumidor devem ficar abaixo dessa métrica de referência, que só seria atingida, de acordo com as expectativas do Fed, em 2016. O cenário que se pode extrair dos números divulgados é o de uma economia em franca recuperação, com juros e inflação ainda bem abaixo do padrão da primeira parte da década que vivemos. Em outras palavras, um cenário muito favorável para as economias da Europa e do mundo emergente, inclusive a brasileira.
Mas, mesmo assim, após a divulgação do comunicado oficial, os mercados ensaiaram uma piora nos seus segmentos de maior risco, seguindo com o andor de que a recuperação americana vai jogar o mundo exterior em uma crise de liquidez e de volatilidade. Entretanto essa atitude não deve prosperar pela simples razão de que os juros ainda ficarão baixos nos EUA por muito tempo e que a União Europeia vive sob a ameaça real de uma deflação.
Nos últimos 12 meses terminados em fevereiro, a taxa anual de inflação foi de apenas 0,8%, o que torna ainda penosos os projetos de ajuste fiscal nos países periféricos. Reforçando essa minha opinião estão eventos que ocorreram nos últimos dias. Cito ao leitor da Folha alguns que considero os mais importantes. Nesta semana, um banco grego --lembra-se deles?-- emitiu títulos no mercado privado com juros de pouco mais de 5% ao ano. Nesse mesmo período, a Irlanda também conseguiu romper a barreira do descrédito dos últimos anos e emitiu títulos de dez anos com taxas de 3,2% ao ano, o mesmo acontecendo com a problemática Itália.
Como explicar, com essas taxas tão baixas, mesmo em mercados de alto risco, a tese de que vão faltar recursos financeiros para o mundo emergente, principalmente para os países que operam hoje com taxas reais acima de 7% ao ano, como o Brasil? Não me parece crível que isso vá acontecer ainda em 2014.
Restam como consolo, para os defensores da crise no mundo emergente, os últimos dados econômicos na China. Nos primeiros dois meses do ano eles mostraram uma economia em desaceleração, em meio a uma intensa movimentação do governo em continuar suas várias batalhas contra os excessos na área do crédito e na transformação da economia via fortalecimento do consumo e moderação do investimento das empresas estatais. Vamos continuar observando a segunda maior economia do planeta nos próximos meses.
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