FOLHA DE SP - 10/02
A difícil mistura entre jovens e veteranos gera profecias do apocalipse no futebol brasileiro
O TÉCNICO da seleção é empossado e admite estar fora de seu tempo. "Estou desatualizado!" A frase não é de Felipão, mas de Telê Santana em seu retorno ao comando, em fevereiro de 1986.
Otávio Pinto Guimarães, recém-eleito presidente da CBF, não precisava argumentar a favor de Telê, aprovado pela opinião pública. Mas insistia: "Vamos precisar de Telê, porque nosso projeto depende do ânimo do nosso povo!"
Qualquer semelhança não é mera coincidência. A dupla Otávio Pinto Guimarães/Nabi Abi Chedid comandava a CBF. Marin e Del Nero já estavam por perto e rezavam pela cartilha do populismo.
Sempre que alguém deseja profetizar o apocalipse do futebol brasileiro fala sobre 1966, quando também havia uma difícil mistura entre garotos, como Tostão, e veteranos como Bellini. Pela similaridade, os profetas transitavam naquele tempo, antes da segunda Copa do México. Em 1986, o Brasil era campeão mundial sub-20, como hoje.
Tinha jovens promissores, como Muller, Silas, o zagueiro Júlio César e Romário, a quem Telê não chamou. Também tinha gênios consagrados e decadentes -ou machucados- como Sócrates, Falcão, Cerezo e Zico. Os jovens eram verdes, os velhos, carcomidos.
Não estamos nem estávamos às portas do fim. Há e havia problemas. Desde 2009, o Brasil perdeu de Holanda, Alemanha, Inglaterra, França, Argentina... Não há profecias, mas ponderações. Uma delas, sobre a mudança de estilo das seleções de Mano Menezes x Felipão.
Com Mano, as linhas estavam mais juntas, compactas, como se joga na Europa. Com Felipão, o time se espalha mais, Ronaldinho arrisca passes longos -e erra!
Estamos desatualizados.
Sim, estamos, como dizia Telê. Felipão tem raízes no futebol do interior gaúcho... bico pro mato!
Em setembro de 2001, o Brasil perdeu da Argentina de Marcelo Bielsa. A Argentina era moderna, o Brasil arcaico. Em 2002, a Argentina foi eliminada na primeira fase da Copa, o Brasil foi campeão.
Existe um problema maior do que a atualização tática da seleção: ter ou não ter craques.
Em 1986, Telê não se atualizou. Arriscou, tentativa e erro, até montar um time-Frankenstein, meio adolescente, meio caduco. "Ele terá de usar a base de 82, ou essa base modificada", disse o cronista gaúcho Ruy Carlos Ostermann sobre Telê à revista "Placar", março de 1986.
Telê mesclou e não foi suficiente.
Em 2002, o Brasil ganhou com o mais puro Felipão. Não era moderno. Era bom!
Daqui até a Copa, o Brasil não vai praticar o futebol mais atualizado. Não é algo que se peça a Felipão. Pede-se que o atraso tático seja menos importante do que a escolha dos jogadores. Que os jovens não sejam tão verdes, os velhos não estejam amarelados.
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